Quem foi ele?
Quando viveu?
Porque se tornou o terror da criançada?
Afinal, ele foi vilão?
…Ou herói?
A historia de um dos mais famosos personagens de Pouso Alegre no século passado…
Aqui no blog! Em dezembro…
Eram exatamente treze horas da tarde ensolarada e quente de novembro como hoje. Os setenta e dois soldados da Bateria Comando estavam simetricamente enfileirados por colunas sob a cobertura ao lado da Bateria, quando o grandalhão oficial Vargas, recentemente promovido a Capitão recebeu o comando do cabo-de-dia. Após dar a ordem costumeira.
-Descaaaaasarrrrrr…
Passou a fazer uma chamada aleatória;
– Três vinte e quatro …
– Rabelo – Respondeu com voz grave o refratário de 22 anos, de Machado.
– Três trinta…
– Héééélio – respondeu o mecânico de Santa Rita esticando o ‘e´’.
-Tres zero quatro …
– Máts – respondi apimentado o ‘a’ e engolindo o ‘o’.
– Três quarenta e nove …
– Evaniuuuuudo – respondeu o soldado Evanildo, prolongando o som do ‘u’, em tom grave. Quem apenas ouvisse a voz, acharia que era um homenzarrão de 1,87mts, quase do tamnho do ‘Vargão”. Era um baixinho marrudo que fazia flexão com um braço só mas não media mais do que 1,68mts. Foi campeão do Pentatlo militar naquele ano, mas foi reprovado no PELOPES, por falta de altura. Eu por que era muito franzino…
O comandante deu três passos lentos na direção do soldado, parou na frente dele, de braços cruzados nas cotas e repetiu, como se estivesse do outro do prédio;
– Soldado 349?…
Evanildo desfez a posiçao de sentido, afastou as mãos das coxas, afastou a perna direita Continuar a ler
MENINOS QUE VI CRESCER
Eram pouco mais de nove da manha quando embicamos a brasilinha verde na Cônego Vicente, entre a casa do Piula e a revendedora Somive, para cruzar a avenida Brasil. De repente avistamos do outro da lado da linha férrea nosso querido Paulinho montando uma bicicleta velha. Querido sim. Queríamos pega-lo para esclarecer o sumiço de um fusca, que segundo nossas investigações, ele havia desmanchado na garagem de sua casa na Manoel Matias no bairro Primavera. Há dias estávamos nos seus calcanhares, mas ele não punha sua cara redonda e muito menos seu corpo atarracado e rechonchudo para fora do portão. Nossas suspeitas deviam ser mesmo fundadas porque ao nos ver parados do outro lado da linha, Continuar a ler
MENINOS QUE VI CRESCER
Andando hoje pela manhã no charmoso calçadão do Leblon, Ipanena e Arpoador, lembrei – vejam só? – do Cirilo Bola Sete!!! Há dois anos, quando eu o entrevistei debaixo da conteira, defronte sua casa no velho Aterrado, ele contou que desfilou belo e faceiro por aqui…
O leitor que entrar no Aterrado, virar para ir ao Sesi e logo em seguida virar a esquerda, caminhar cerca de 150 metros em frente vai chegar a uma tripla encruzilhada. À da esquerda vai para o rancho da família do Marcilio Alves, a do centro leva à casa do desportista João Cavalo, a da direita leva a esquina fatídica, onde no dia 27 de novembro de 83 os irmãos Reanir de Lima mataram o detetive Marcos “Cabeçada” Alves da Silva com seu próprio revolver, após surpreende-lo de trás de uma cerca de taquara. Na encruzilhada da direita tem uma casa de blocos sem pintura, atrás de duas frondosas Conteiras ou Santa Bárbara. Uma cerca de alambrado mantêm fechada uma granja de patos, marrecos e galinhas mestiças. A casa antiga era mais aconchegante ou glamourosa. Tinha alpendre de frente para a encruzilhada, e durante toda sua existência teve duas cores: ora verde oliva, ora amarelo mostarda. A casa atual tem outra arquitetura, outra cor – blocos sem reboco – é cercada de alambrado, mas ocupa o mesmo espaço. Agora é preciso sentar-se no banco de concreto debaixo das conteiras do lado de fora do alambrado para observar o intenso movimento do trecho que se afunila na rua Cordeiro Olimpio. Foi ali que Cirilo nasceu e viveu quase metade de sua vida. A outra metade viveu nas cadeias e penitenciarias de Minas e de São Paulo ou nas ‘quebradas’, fugindo dos homens da lei.
Conheci o pai muito antes de conhecer o filho delinqüente. Luiz Pereira, o Bola Sete era um mulato claro de 1,68, ligeiramente obeso, pele lisa, rosto e quase todo o resto arredondado. Tinha prosa boa e sorriso fácil. Trabalhava de passador na alfaiataria do Keide na Dr. Lisboa, ao lado da joalheria do Piula, três pontos comerciais acima da sorveteria do Tião Bananeira. O apelido Bola Sete eu não sei de onde veio. Certamente se deve à predileção pela bola sete do bilhar que jogava muito bem no Bar Recreio. O fato é que o passador gorduchinho alegre e simpático, em 1976,77 já esboçava os primeiros sorrisos amargos. É que seu filhote Cirilo começava ensaiar os primeiros passos no crime, dando trombadas em garotos ou tomando na cara dura seus bonés ou objetos que eles levavam nas mãos. Bem mais tarde, já na década de 80, quando conheci o trombadinha, pude constatar que Bola Sete morria de vergonha toda vez que ficava sabendo de mais um delito cometido pelo filho. E já não eram mais trombadas. Aos dezessete anos Cirilo tinha quase o mesmo porte físico de hoje, porém muito mais ágil e forte. Furtos sorrateiros e roubos nas quebradas, atrás de uma faca tipo peixeira – naquele tempo não existia essa boiolagem de roubar com faca de cozinha, usava-se a famosa ‘lapiana’ numero nove tipo peixeira que impunha respeito – ou um revolverzinho 22 ou garruchinha velha de dois canos. Pistolas automáticas, Magnum 357 ou mesmo Taurus trezoitão só nas capitais paulista e carioca ou então se conseguisse arrombar a B.Pacheco e Cia.
Apesar de ter passado praticamente toda sua vida útil, de maneira inútil, por conta da justiça ou tentando fugir dela – só atrás das grades foram 19 anos – podemos dizer que Cirilo “se deu bem”. Sua algibeira nunca viu mais do que quatro ou cinco notas de 50, juntas, mas conseguiu sobreviver na prisão, pagar seu debito com a sociedade e hoje está limpo. Será…?
Tendo trabalhado fora de Pouso Alegre alguns anos e Cirilo pago cadeia em outras paragens, perdi de vista parte de suas façanhas e foi o próprio que as contou sentado no banco de concreto debaixo das Conteiras na encruzilhada da Cordeiro Olimpio, defronte sua casa no velho Aterrado. Mas voltemos aos anos 80, quando a nova safra de detetives chegou a Pouso Alegre. Adair, Pingüim, Barbosinha, Valim, Dorigatti, que ‘eram da terra’ e Romeuzinho, Luiz Neves, Munhoz, Paixão, Beijinho, Lobão, depois Pradinho, Tiãosinho, Batista, Faria, que fincaram raízes na terra do Mandu e outros que deixando marcas ou não foram embora. Não são apenas nomes, são policiais que destacaram Pouso Alegre no mapa do combate à criminalidade, desvendando crimes e prendendo meliantes destas e de outras plagas que aqui aportavam.
Até o final daquela década o “modus operandi” da policia civil era bem diferente. A policia conhecia todos os meliantes da cidade e sabia o que cada um andava aprontando. Meliante fichado na policia circulando nas madrugadas desertas…
Para continuar a ler essa historia, adquira o livro “Meninos que vi crescer”.
No final de março de 2006 a Delegacia de Policia da rua Quintino Bocaiúva recebeu um novo policial. O moço, novo na cidade, porem velho de carreira, chegou taciturno, mão no bolso, pouca prosa. Estivera um ano aposentado e fora chamado de volta na pior época do ano… no final de dezembro. Apesar disso, retomara o ritmo e empolgaçao com a função policial. Mas isso fora em Pouso Alegre, cidade que o viu crescer! Agora estava, numa cidade estranha, à qual não nutria nenhuma simpatia, podendo aposentar a qualquer momento. Seria difícil descruzar os braços e voltar a trabalhar…
A criminalidade em Santa Rita do Sapucaí naquele ano, como em muitos outros, estava em alta. Trafico de drogas, pequenos furtos, roubos a estabelecimentos comerciais engrossavam diariamente a estatística criminal do município. Homicídios já haviam ocorridos três e outros sete aconteceriam até o fim do ano. Era impossível ao experiente, comedido e altruísta policial assistir passivamente a tudo isso, recebendo um salário, ainda que modesto, sem nada fazer. Aos poucos foi descruzando os braços, arregaçando as mangas…
Certa manha ao sair rápido com os colegas para um operação de rotina, quase esbarrou numa bela e esbelta jovem com seu inseparável salto alto, no balcão do serviço de transito. Nem a notou. Não havia motivos. Ela também, não, mas como conhecia todos por ali, mais tarde perguntou ao delegado, seu amigo, quem era o ‘forasteiro’ que parecia arrastar os companheiros para o trabalho.
– … Veio de Pouso Alegre. Fim de carreira. Não é flor que se cheire! – Respondeu sem esticar conversa, o veterano delegado. E ficariam nisso se a aposentadoria tivesse saído nos próximos meses.
Ao voltar de férias regulamentares, em agosto, o novo delegado da Comarca nomeou o ‘detetive fim de carreira’, seu Inspetor, principalmente com atribuições de administrar o Hotel Recanto das Margaridas, onde os pouco mais de 50 presos brincavam de cumprir pena. Na ocasião, cumprir pena na cadeia de Santa Rita era uma gostosa diversão. O preso podia entrar e sair do “presídio modelo do sul de minas” a hora que quisesse. Bastava fazer um tatu na parede da cela, galgar o muro externo e ir embora. Alguns saiam pela porta da frente, iam dormir em casa, às vezes fazer um assaltozinho básico e de manhazinha voltavam para a cela. Fabio Junior, o Pinta, costumava fugir e ficar dois ou tres dias mocosado nos muquifos do bairro Recanto das Margaridas. Quando a saudade dos amigos do cárcere batia, ele voltava, subia no muro e passava horas sentado lá em cima, conversando com os colegas. Era preciso acabar com esta farra! Era preciso, como já dissera no dia 26 de novembro de 2004, um certo delegado regional, “dar um pouco de dignidade à policia civil” naquela cadeia.
Se faltava dignidade à policia, administradora do presídio, se faltava pulso, seriedade e até honestidade, faltava também tratamento digno aos presos. Tais como atendimento medico, dentário, alimentação decente por sinal muito bem paga pelo Estado. Em poucos meses a rotina da cadeia mudou, a criminalidade na cidade baixou, dos outros sete homicídios ocorridos no município, seis foram completamente elucidados. O reflexo veio no ano seguinte… A criminalidade caiu em quase 80%.
Entre as medidas adotadas no Hotel Recanto das Margaridas, duas foram fundamentais: firmesa no relacionamento com os presos e atendimento básico de saude. A primeira não era problema, bastava querer. A segunda era mais difícil. Ninguém quer trabalhar num presídio, ninguém quer ter contato com presos. Inicialmente a secretaria municipal de saúde disponibilizou uma equipe medica para atender uma vez por mês no presídio modelo do sul de minas. Era pouco e no terceiro mês o medico desistiu. Restava tentar um medico com perfil de “saúde publica” que se dispusesse a fazer um trabalho voluntario.
Foi aí que o detetive forasteiro entrou na vida da bela e esbelta jovem e seu inseparável salto alto… Ela era medica. A jovem atendeu o pedido como se tivesse tendo o privilegio de fazer um trabalho voluntario. Com seu largo e cativante sorriso, a jovem medica recém formada, passou a atender vez por semana na cadeia. Toda quarta feira de manhã, enquanto descansava do plantão no Pronto Atendimento Municipal, ‘carregava pedra’… Subia para o Hotel Recanto das Margaridas, onde além do trabalho medico, fazia também importante trabalho social e psicologico.
O relacionamento do detetive forasteiro com a medica, durante vários meses, era meramente profissional. Se restringia a escolta e segurança durante o atendimento no presídio. Ao voltar das férias em fevereiro, ela não estava mais lá. Havia se mudado para Varginha e, pior, ela é que precisava de tratamento medico. Estava internada com uma seria crise de Lúpus. A amizade do detetive forasteiro com a medica do salto alto começou estreitar aí, com a preocupação dele de que ela ficasse bem e pudesse voltar a atender no presídio. Alguns meses depois ela voltou à rotina.
Apesar da aproximação causada pela doença e pelo objetivo comum, que era melhorar a qualidade de vida dos hospedes do hotel Recanto das Margaridas, o relacionamento continuou cordial e profissional, embora mais estreito. Além do que, o forasteiro também tinha seus fantasmas… Embora casado há longos anos e os filhos formados, prestes a aposentar, psicologicamente não estava bem. Alguma coisa o frustava e incomodava. Não sabia o quê! A única certeza que tinha é que quando aposentasse, iria mudar radicalmente de vida… de cidade, de estado, talvez até de país!
Sem perceber, o andar da carruagem, o resultado do competente trabalho policial, a amizade com a jovem medica, aos poucos estavam afastando a ansiedade da iminente aposentadoria. A idéia de largar tudo e partir em busca do desconhecido, já não era tão contundente. Já não pensava mais em Mato Grosso, Rondônia, Amapá… Um belo dia, ao terminar o atendimento dos presos na cadeia, um fato inusitado aconteceu … O detetive forasteiro exibiu a canela com um ferimento e pediu medicamento para cicatrizá-lo. Ao examiná-lo a medica, na carceragem, na presença dos demais policiais, deu o diagnostico e o prognostico:
– Isso é coisa atoa, vai cicatrizar naturalmente… Mas se você fosse solteiro, eu cuidaria do seu dodói…!
Susto, surpresa, brincadeira entre amigos, constrangimento, rubor…! Quando percebeu já havia falado. Gargalhada geral, gerando descontraídas brincadeiras.
Brincadeira involuntária que gerou uma coceirinha no ego, tanto dele quanto dela. A partir daquela manhã, nunca mais seriam os mesmos. Nunca mais se veriam apenas como colegas de trabalho. Agora tinham mais assuntos do que asma, micose, depressão e ziquizira de cadeia para discutir. Sem querer, sem se dar conta, estava nascendo um romance… Antes mesmo de se tocarem, precisavam de definições, tomar decisões…
Foi no mês de julho que decidiram seguir o mesmo caminho. O detetive forasteiro, aquele que “não é flor que se cheire”, já não era mais forasteito. Foi morar na delegacia. No mês seguinte era um novo casal. Alem da grande diferença cronológica de idade e de um casamento também encerrado, tinham algo mais em comum; espírito jovem e muita vontade de recomeçar, de reconstruir, de ser útil…
Não foi fácil. Ambos tinham gênios muitos forte. Ele muita experiência para oferecer, ela muita impetuosidade para impor. Ele muita saúde, ela pouca… Logo no primeiro mes de relacionamento o convívio foi posto à prova. Vinte e quatro dias num quarto de hospital em Varginha e mais uma semana na UTI em São Paulo. Depois disso mais duas curtas separações.
Em 2009 uma mais longa. Desta vez, dois meses distantes, com muitos diálogos inflamados até que veio o silencio. Não mais se falaram. Precisavam de silencio e solidão para reflexão, para a purificação, para a espiritualização, para talvez… se reencontrarem.
Uma neblinada madrugada de junho – onze da manhã de um gelado domingo de junho, para um solteiro cinqüentão, era madrugada – o telefone tocou;
– Oiiii… Já amanheceu por aí?
Bem, amanheceu meio minuto antes, quando o telefone zuniu debaixo do travesseiro, mas pela extensão do sorriso do outro lado da linha, o ex-detetive forasteiro preferiu sorrir amarelo e dizer que já estava de pé a muito tempo.
– Estamos indo à Pouso Alegre almoçar no “Tomodati”… Quer comer suchi com a gente?
Depois de empanturrar de churrasco até as quatro da manhã, peixe cru com arroz e ‘caipisaquê’ de kiwi com bastante gelo era uma boa opção – pensou o detetive – Além do que, não se viam há mais de 60 dias! Duas horas depois estavam almoçando no Shoping Minas Sul em Poços de Caldas. A noite já haviam reatado o romance. O casamento formal aconteceu numa segunda feira 13, ás 13 horas, em Santa Rita. Trinta e cinco dias depois voltaram a Poços para a Lua de Mel.
Depois de diplomar-se em “Impactos da violência na Saúde” pela Fiocruz e pos-graduar-se em Saúde da Família, pela UFMG, a ex-medica voluntaria do presídio, que nasceu as 13 horas do dia 13 no quarto 13, atualmente exerce suas funções no PSF de Pouso Alegre e é medica perita da Seplag-MG. Participa também de grupos de trabalhos voluntarios no combate às drogas. Seu Lúpus ainda insiste em alterar seu humor. Nada no entanto, que uma boa dose de amor não possa aliviar.
O ex-detetive forasteiro pendurou suas chuteiras, mas encontrou no jornalismo uma maneira de continuar a combater o crime, mostrando a cara dos meliantes e as conseqüências da caminhada criminosa.
Esta é a nossa historia….
E viverão felizes para sempre…
Quem disse que 13 é numero de azar…???
Meninos Que Vi Crescer
Tarzan deu a volta por cima
Conheço Jose Luiz desde a mais tenra infância. Ele costumava lançar-me olhares languidos, de esgueio quando me via na sua casa procurando seu irmão que vivia às turras com a justiça. O irmão espigadinho, era useiro e vezeiro na pratica de pequenos furtos para comprar maconha. Nunca soube o que aquele olhar serio e ressabiado protegido pelas sobrancelhas queriam dizer. Medo? Respeito? Raiva? Revolta? Teria ali alguma promessa de vingança no futuro? Promessa de se tornar também um policial combatente do crime? Ou se tornar um bandido mais esperto que seu irmão e não se deixar prender? Talvez um pouco de cada sentimento. Pela maneira como Jose Luiz me olha, depois que cresceu, acho que aqueles olhares de soslaio eram de admiração. Embora o irmão – que há anos não vejo e nem tenho noticias – vivesse às margens da lei, Jose Luiz não se deixou influenciar pelos –maus – exemplos do irmão mais velho. Apenas uma vez sentou-se no banco dos réus… e foi em defesa da honra.
No final da ensolarada manhã do dia 14 de junho de 2004, subia eu a Adalberto Ferraz na companhia da amiga Thalita, colocando as fofocas de “Santana do Sapucaí” em dia, quando avistamos um tumulto na esquina da Duque de Caxias. Apertamos o passo para curiosar e quem sabe registrar um furo de reportagem para o FOLHA, o jornal mais lido da época, apesar de continuar no vermelho. Pelo caminho soubemos, através de transeuntes, que havia ocorrido um tiroteio na esquina do mercado. Antes da esquina abordamos, pela janela da ambulância dos Bombeiros, o cidadão Salvador Antonio dos Reis, com um tiro na perna. Na esquina da Jose Macedo, em meio à aglomeração de curiosos, dois novatos policiais militares tentavam dominar o ‘chapa’ H. H. dos Santos que esperneava e escorregava mais que quiabo na tigela. Dominamos o bagre ensaboado e já na viatura policial, na iminência de ser conduzido para a Delegacia de Policia, muito a contragosto ele respondeu entredentes, minha pergunta:
– O cara que atirou é irmão do pintor, ali… – disse-me apontando com o boné para um sujeitinho franzino, barba por fazer, com a roupa manchada de tinta, escondido debaixo de um surrado boné também sujo, no meio da multidão. Orientei os policiais que tirassem o chapa do meio do furduncio, para dispersar a multidão e me aproximei do pintor que eu conhecia mais que nota de 1 real.
– E aí “Pracinha”, que rolo é esse…?
– Foi o Zé Luiz, o Tarzan… é rolo de mulher. Meu irmão queria acertar o negão que está saindo com a mulher dele. Acertou o Salvador que não tem nada com a estória…
– E onde está ele agora?
– Sei não Chips… É capaiz que ele foi atrás da mulher dele!
Não. Não fora. Jose Luiz, o Tarzan, 36 anos na época, deixou o local do frustrado crime, pegou o primeiro cipó que viu balançando e foi direto para a casa do causídico Firmo da Motta Paes. Foi na casa, que funcionava também como escritório de advocacia, que ele foi preso em flagrante por tentativa de homicídio e lesão corporal, algumas horas mais tarde.
A estória era essa mesmo. Tarzan descobrira que ‘Jane’ estava se encontrando atrás da moita com o macaco, digo, com o chapa H.H. e resolvera cortar o mal pela raiz! Como nunca usara uma arma de fogo, errou o alvo e conseguiu apenas chamuscar Antonio Salvador, que estava de bobeira abraçando uma loira gelada no Bar da Maria. na esquina do Mercado.
Como excelente criminalista que era, o firme advogado Firmo da Motta Paes – fomos ‘inimigos passivos’ por 20 anos. Fizemos as pazes em junho de 2004 quando ele abriu-me os arquivos da Camara Municipal que presidia, para mostrar-me alguns documentos que me interessavam. Ele morreu no dia 06 de outubro, depois de perder a única eleição de sua vida. Saudades do velho e astuto ‘inimigo’ advogado e político… – conseguiu descaracterizar a tentativa de homicídio para lesões corporais. Tarzan voltou para a selva alguns meses depois. Antes, porém, nos encontramos no velho Hotel da Silvestre Ferraz.
Tarzan não ficou magoado por eu tê-lo mandado para a jaula. Só não gostou da manchete no “FOLHA” do dia 18 de junho; “ Tarzan tenta matar ‘‘‘‘‘Ricardão’’’’’’ e acerta Salvador”…
Com o passar do tempo Tarzan compreendeu que o titulo e o bojo da matéria não tinham nada de ofensivo à sua reputação. Pelo contrario, mostrava que ele fora o traído pela companheira. Que ele tivera a honra ultrajada e tentara limpá-la à bala. Que sorte a dele que sua pontaria é ruim…!!!
Encontrei Tarzan outro dia justamente defronte a delegacia regional, comendo pastei de farinha de milho com molho de pimenta comari, na baraquinha da Dete… Cumprimentou-se com tamanha efusão que parecia que sempre fomos estreitos amigos. Naturalmente falamos do episodio do dia 14 de junho. Quase me agradeceu pelo que aconteceu com ele na época e pelo que eu escrevi na coluna Direto da Policia… Contou-me que o “aluguel” dos colegas do apartamento 07 do velho hotel da Silvestre Ferraz, por causa da manchete no jornal, serviu para abrir-lhe definitivamente os olhos.
– … Larguei dela, Chips. Ela não merecia… Casei de novo, tenho filhos, estou trabalhando registrado e estou muito feliz com minha família. Aquilo que me aconteceu serviu para eu dar valor às pessoas certas… Cadeia – olhou para o velho prédio fantasma atrás de nós, cheio de determinação – nunca mais!!
– Vejo que você deu a volta por cima, está alegre, vistoso, de bem com a vida! Posso contar sua historia na coluna “Meninos que vi crescer”, qualquer hora dessas?
– Só…!!!
É comum o cidadão que tropeça na lei, conhece o lado sombrio da cadeia e retoma a liberdade, sorrir fingido e dizer que mudou, que está ‘diboinha’…
Esta poderia ser apenas mais uma dessas historias. Poderia. Mas não é o caso de Jose Luiz, o Tarzan. Seus olhos, seu sorriso, sua conversa franca e alegre demonstram que ele está muito mais livre, leve, solto e feliz do que antes do dia em que puxou o gatilho de um revolver numa das esquinas mais movimentadas de Pouso Alegre.
Sorte que naquela ensolarada manhã de segunda feira, entre mortos e feridos, todos se salvaram… Inclusive o próprio Tarzan!
O relacionamento humano encerra mistérios muitas vezes incompreensíveis. Podemos encontrar em nosso caminho, em nosso dia-a-dia, por anos a fio, pessoas profícuas com as quais mal trocamos um bom dia, quiçá sabemos seu nome, o que faz e muito menos a data do seu aniversario. Outras vezes conhecemos pessoas que nada somam de pratico ou material em nosso cotidiano, mas que pela simples maneira espontânea de ser, sem que percebamos, passam a fazer parte de nossas vidas. São como “… os lírios do campo…”, sem nenhuma relação de parentesco, de trabalho ou afinidade, mas sentimos bem e nos alegramos com sua presença. Talvez seja pelo fato de elas não nos pedirem nada em troca de sua presença, de sua alegria e espontaneidade – e de pequenos favores – que as torna tão especiais. Achamos que elas são carentes e dependentes, mas na verdade nós é que dependemos delas para desfazer nossas tensões cotidianas e acabamos usando-as para troças e brincadeiras, as quais elas assimilam e retribuem de bom grado, sem maldade.
Carlos Augusto da Costa, o Scooby é uma destas figuras que costumamos rotular de folclóricas, portadoras desta despretensiosa magia que relaxa, colore e alegra nossa vida.
Conheci Scooby na oficina do Teobaldo – pai – na rua do Rosário no final da década de 80. Ele era ainda adolescente mas tinha o mesmo porte físico e jeitão de intelectual misterioso de hoje. Até a voz grave. Só o cabelo mudou de cor e a barba apareceu. Já era alvo de brincadeiras das quais ingenuamente participava serio ou sorrindo se fosse o caso.
Na delegacia de Policia, onde costuma passar horas a fio, não tem quem não conheça Scooby e não tenha uma palavra afetuosa e correspondida. Ele chega de mansinho e espera por alguns segundos o cumprimento. Se o ignoram, ele puxa prosa:
– Oi Batista, tudo bom?
Só para no corredor, na porta ou entra nos gabinetes e estica prosa, se lhe dão atenção. Senão segue em frente… Responde sempre de acordo com a pergunta.
– Tá de plantão hoje, Scooby?
– Tô, vou até amanha cedo…
– Tá de folga hoje, Scooby?
– Tô, saí hoje de manha…
– Ué, Scooby, não tenho te visto! Por onde tem andado?
– Eu tô de férias. O doutor João, o regional, me deu férias até o fim do mês…
Muitas vezes encorajado por colegas, em situações que não oferecem nenhum risco naturalmente, Scooby age como se policial fosse e suas ordens são regiamente acatadas por delinqüentes que não ousam desobedecê-lo. Até mesmo a linguagem, inadequada na verdade, usada por alguns policiais em certos momentos de stress, Scooby repete como se fosse um dos mais temidos policiais e impõe seu pseudo respeito.
– Scooby, dá uma dura naquele folgado lá no fim do corredor!!!
Ele vai até lá, para na frente, faz cara feia – e precisa ? – e sai com esta;
– Escuta aqui seu folgado! Fica quieto aí senão vai ser pior, heim… Vou mandar os tiras te quebrar no pau e te fechar no corró…
… E o sujeito que não conhece Scooby, pensando que se trata de um policial veterano, baixa a cabeça e fica pianinho…
Esta singela homenagem ao amigo Scooby, publiquei no falecido FOLHA em 2004, quando ele completou 34 anos. Na ocasião Seus “colegas de trabalho” fizeram uma vaquinha e lhe deram um belo presente de aniversario. Porém, não tão belo quanto o que Scooby nos dá com sua presença. Desde então, sempre que encontro Scooby – e basta ir à delegacia ou em qualquer lugar da cidade, pois Scooby é onipresente !! – ele fala da matéria;
– Hei Chips, ta chegando meu aniversario de novo. Vai ter festa!! Eu vou sair no jornal?
Vai, vai sim Scooby, você já está no jornal e agora também no Blog do Airton Chips.
Scooby nosso ‘lírio do campo’, completa nesta segunda, 16, mais um ano de simplicidade e alegria. Se haverá festa não sei, mas presente haverá ao menos um:… ele!
Deus te abençoe e te conserve, Carlos Augusto “Scooby” da Costa…!!!
Scooby chegou logo cedo à delegacia nesta segunda, para receber os abraços dos ‘colegas’. O primeiro foi o delegado regional Flavio Tadeu Destro. Em seguida teve bolo de aniversario com recheio de ameixa e guaraná. O aniversariante era só prosa… Fez até discurso!!!
Parabens, Scooby.
Estava eu na acanhada salinha do CPD tentando fazer mágica com dinheiro e matemática – R$ 900 reais para pagar diárias de viagem para 15 detetives e delegados – quando o vi pela primeira vez. Na verdade ouvi sua voz. Eram quatro da tarde de uma fresca quinta feira de abril. Com a delegacia quase vazia, a melodia doce de “pense em mim, ligue pra mim…” invadiu os corredores chegando até o cubículo onde eu trabalhava. Não era Leandro & Leonardo… Era um moleque pardo, franzino, calça e camiseta surrada e manchadas de graxa, chinelos havaianas sujos, andando ligeiramente torto. Trazia nas costas presa ao ombro uma caixa de engraxate. Foi cantando e foi entrando. Quando viu minha cabeça de curioso na porta-janela no final do corredor, o cantor – até que era afinado – se ‘exibiu’ para lá.
– Vai graxa aí, doutor? – perguntou ele, parando de cantar.
Nas semanas seguintes ele visitou-me varias vezes no CPD. Em quase todas levou uma moeda e deixou meus sapatos limpos e brilhantes. O próximo cliente foi o Inspetor Ângelo. Este sentava-se nos velhos bancos compridos de madeira na recepção da velha delegacia, acendia um Hollywood filtro amarelo e durante meia hora contava ‘causos’ para as pessoas que inevitavelmente sentavam-se à sua volta… enquanto Claudinei passava graxa e dublava baixinho Leandro & Leonardo. Se Chips e o inspetor Ângelo engraxavam com o cantor, qualquer um poderia fazê-lo. Rapidamente sua clientela aumentou. Agora alguns detetives que usavam sapatos e alguns delegados mais liberais também engraxavam com ele. Claudinei cantor não era um espião, mas bem poderia sê-lo. Jamais intervia nas conversas à sua volta, mas enquanto passava graxa e lustrava sem pressa os pisantes, embora cantarolasse baixinho, estava atento a tudo que ouvia.
Seu ultimo freguês foi a delegada Maria Inês Xavier. O bate-escova e bate-flanela foi no seu gabinete, na primeira sala à esquerda. Findo o serviço, enquanto Inês vasculhava a carteira em busca da costumeira moeda, Cantor exibia seu dom, parodiando uma das românticas da famosa dupla recém desfeita pela morte prematura do mais velho… “…chuva no Aterrado, vento no São João…”
– Toma, Claldinei… Você tem troco para dez? – Disse a delegada estendendo uma ‘ararinha vermelha’.
– Ih, doutora. Não tenho, não…
– Tudo bem. Vá trocar e me traga o troco – Disse a delegada se debruçando numa pilha de TCOs de crimes contra a mulher.
Este foi o ultimo dia que “Claudinei Cantor” ou “Engraxate Cantor” entrou na delegacia alegremente cantando, com sua caixinha de madeira pendurada no ombro. Nossos sapatos nunca mais receberam seus cuidados. Nossos ouvidos nunca mais ouviram sua aguda cantilena. A nota de dez era mágica… desapareceu e com ela desapareceu também o extrovertido engraxate-cantor.
Eu estava sentado numa poltrona velha atrás do balcão na recepção assistindo meu programa favorito; um telejornal, no inicio da noite, quando ouvi o ranger de freios da viatura da policia militar parando na porta da DP. Continuei onde estava. Quando ouvi o som abafado de alguém sendo meio que jogado no banco de madeira no saguão, levantei meio corpo para ver a cara do conduzido. Adivinha quem era? Isso mesmo… meu velho amigo engraxate-cantor. No lugar da velha caixinha de maneira com graxa, tinta, flanela e escova trazia um par de pulseiras de prata… Usava uma bermuda escura e camiseta sujas e rasgadas. Descalço, tinha terra e fuligem de crack dos pés à cabeça. Emergira de sob a ponte do velho Mandu e fora pego na praça Senador Eduardo Amaral tentando tomar na ‘tora’ o celular de uma estudante. Não pude conter a exclamação em tom de galhofa;
– Você sumiu Cantor!!! Olha a situação que estão meus sapatos… há mais de dois meses sem graxa. Trouxe o troco da delegada Inês???
Claudinei, o engraxate-cantor tinha ainda dezessete anos. Não chegou a ficar preso. Sua pena maior pela tentativa ‘paia’ de roubo foi a tortura de sermões inúteis que ouviu antes de voltar para casa, para o crack, para o crime… So deixava a droga quando era pego num flagrante de furto pé-de-couve e ia morar no velho hotel da Silvestre Ferraz, pois logo completou dezoito anos e deixou de ser ‘dimenor’.
Chegava sempre sujo, mal vestido, mal alimentado, magrelo e molambento. Em pouco mais de uma semana ganhava cor, peso e aparência até melhor que quando engraxava sapatos. Ganhava roupas usadas e como seus crimes eram sempre pequenos, ficava pouco tempo preso. Saia sempre alegre, boa prosa jurando de pés juntos… “Drogas nunca mais”.
O cantor, que embora ainda cantasse, perdera um pouco da afinação, talvez pelo uso intenso da pedra bege fedorenta. Mudou de profissão, mas permaneceu no ramo. Não era mais engraxate de sapatos. Agora era engraxate de portas de aço, de lojas. Nesta atividade ‘especializada’ ganhava mais do que moedas e podia continuar freqüentando os mesmos lugares de antes no centro da cidade, conversando com as pessoas como antes, falando de suas vida, se intrometendo na dos outros, pedindo ‘força’. Passava na rua Silvestre Ferraz mas não entrava na delegacia. Lá as portas eram de madeira…
A atividade de engraxador de portas de aço era mais rendosa e quase sem concorrência, mas, embora existam muitas, quase nenhum lojista liga para isso. As vezes passam anos sem lubrificar as canaletas. A escassez de clientela levou Engraxate-cantor a procurar um fonte extra de rendas. Enquanto assoviava uma cançãozinha romântica e passava graxa nas canaletas, Claudinei passava também a mão leve nalguma peça ‘distraída’ na loja. Não tardou as queixas de pequenos furtos afloraram na DP. O suspeito numero um era…? O engraxate-cantor!
Certa manha de 2004 Teobaldo passava sozinho pela Duque de Caxias quando avistou Claudinei na rua. Parou o Uno e convidou o mocinho para dar um passeio.
– Porque, Teobaldo? Eu to ‘diboa’… Não fiz nada.
– É só para um reconhecimento… Você não vai ficar preso.
De fato não ficaria, pois não existia mandado contra o dublê de Leonardo, mas foi necessário descer do Uno, pegá-lo pelo braço e colocá-lo sentado no banco da frente. Ao parar no transito na esquina da Vieira de Carvalho, Cantor aproveitou a parada, saltou do veiculo e correu na direção contraria ao transito, deixando o policial só com o cabo do guarda chuva na mão…
Frustrado mas não alienado Teobaldo seguiu para a Delegacia mas não chegou lá. Virou na João Basílio e rumou para o Aterrado. Parou o uno entre outros perto da oficina do Pompeu, antes da ponte e ficou na espreita. Não tardou Claudinei Cantor passou por ali pedalando uma bicicleta velha. Na abordagem o policial vacilou e Engraxate-Cantor conseguiu vazar. Entrou pela Diquinha, de repente abandonou a bicicleta e entrou no Rio com água pelas canelas. Sem querer entrar na água poluída do velho Mandu, Teobaldo tentou parlamentar, mas não conseguia convencer o fujão a aceitar seu convite para o passeio. Quando ameaçou entrar na água, Claudinei atravessou o rio. Ele deu a volta pela ponte e Claudinei voltou para a margem direita. Teobaldo voltou, Claudinei tornou a atravessar rio e sentou-se seguro na margem esquerda. No mato sem cachorro, o policial tinha ainda um trunfo: a bicicleta que Engraxate-Cantor havia abandonado na beira do rio. Fez chantagem. Ameaçou levar a bicicleta para a delegacia se ele não se entregasse. A esta altura o espetáculo já havia atraído dezenas de pessoas no beiral da ponte. Cada um com sua torcida. Só faltaram as apostas para ver quem se daria melhor;
– Aposto que o Cantor vai fugir…
– Ah, o Teobaldo não vai deixar barato…
Esta historia lembra “Peixinho e…Eu”, publicada em 2010.
Em meio ao enfadonho diálogo “vem comigo que eu não vou te prender”, “não vou porque eu não fiz nada”, Teobaldo se lembrou que tinha no bolso um aparelho celular – Eureka – Pegou a bicicleta de estimação do engraxa-te, simulou colocá-la na traseira do uno e pediu apoio ao primeiro colega que conseguiu contatar. Continuou dialogando com o engraxate, que a esta hora já se sentia o ultimo biscoito do pacote, sentado tranquilamente na beira do mal-cheiroso rio. Só faltou deitar ou então cantar e bater palminhas; “ Você não me pega, você não me peeeegaaa”. De repente surgiu do outro lado do rio a figura atarracada do detetive Ozanam. Ele foi se aproximando de mansinho e quando chegou a poucos metros do engraxate, diante dos olhares em suspense da platéia em cima da ponte, deu-se o luxo de encenar os passos de um desenho animado em posição de ataque, com os braços levantados, até chegar por trás e abraçar o recalcitrante fujão. Neste momento partiu da ponte um sonoro Uhhhhh seguido de calorosos aplausos pelo desfecho da operação e sucesso da encenação. Como prometido pelo policial, Claudinei Cantor foi apenas ouvido em inquérito policial do qual era suspeito e liberado.
Algumas semanas depois o engraxate-cantor protagonizou mais uma cena engraçada com o mesmo detetive Teobaldo. Inicio de rebeliões e motins faziam parte do dia-a-dia do velho hotel da Silvestre Ferraz. Tudo começava com a famosa “greve de fome”. Para começar a greve não era preciso motivo. Bastava um dos hospedes mais ‘graduados’, enfadado jogar a marmita no corredor e dizer um impropério qualquer, todos os demais recusavam o alimento. Até porque nao fazia diferença comer ou não o ‘bandeco’ fornecido pelo Estado. Toda cela tinha fogareiro de ‘rabo quente’, panelas e mantimentos. Dava para se assar até bolo … As marmitas intocadas recusadas pelos presos eram doadas ao Asilo Betania da Providencia e às vezes distribuídas em via publica, no velho Aterrado. Bastava parar a viatura no meio da rua Oscar Dantas, Sapucaí, João Sabino… ironicamente ruas que mais ‘forneciam’ hospedes para o velho hotel e começar a distribuição. Em poucos minutos dezenas de “quentinhas” esquentavam o estomago de pessoas carentes, alguns parentes dos próprios presos. Foi numa destas ocasiões que o detetive deu risadas. Ele voltava da Sapucaí com umas três marmitas que sobrara e resolveu entrar pela Carmelino Massafera, quando avistou o engraxate-cantor. Businou e acenou para ele para oferecer uma marmita. Claudinei, que certamente tinha ‘culpa no cartorio’ saiu em desabalada carreira e entrou em casa, se justificando com o velho chavão:
– Que isso, Teobaldo, eu não fiz nada não!!! Eu tô de diboa…”
– Calma, garoto… Só quero lhe dar uma marmita que sobrou da greve…!
Naquela noite a mãe e os irmãos do engraxate-cantor jantaram arroz com feijão, almôndega e mandioquinha salsa… E puderam comprovar que a comida da cadeia não era tão ruim assim.
Alguns meses mais tarde – sem teatro – enroscou-se até o pescoço nas malhas da lei e foi morar no velho Hotel da Silvestre Ferraz. Ele era bom de lábia com qualquer um, mas não tinha muito jeito com mulheres. Sem conseguir levar uma paixão platônica para a cama, resolveu levá-la para o mato mesmo… Tomou 7 anos de cana. Cumpriu parte no velho Hotel da S.Ferraz no regime fechado e foi morar na APAC, no regime semi-aberto.
A vida mansa e regrada, com alimentação balanceada na APAC, trabalhando terceirizado para a Tigre, o dia todo sentado na sombra, fez bem ao engraxate. Cantor clareou a pele, recuperou a serenidade da tez, engordou. Engordou até demais. Ganhou uma respeitável barriga. Parecia um Pachá. A ultima vez que o vi na Apac, em 2010, ele disse-me que estava namorando firme e quando saísse da Apac iria se casar… e me convidou para padrinho.
Todo meliante quando está atrás das grades é quase santo. O único pecado que comete lá – que ele não acha que é pecado – é que ele é inocente, não fez nada de errado…. fizeram com ele. No mais, está ‘diboinha’, mudou de vida…
– Parei, Chips. Parei com esta vida errada. Louvado seja Deus. Cristo me mostrou o caminho. Quando sair daqui vou arrumar um emprego… Você podia dar uma ‘força’…
São todo sorriso, gentileza e amenidades. Se deixar eles tem assunto na porta da grade o dia inteiro. Fora da cadeia o meliante é outra pessoa. Quando te encontram na rua – a maioria – olham de longe, com arrogância, cheios de direitos, principalmente se estiverem ‘devendo’ alguma coisa.
Foi assim que encontrei o engraxate-cantor próximo à Delegacia ano passado. Ainda estava gordo e corado. Estávamos no mesmo passeio, não teve como desviar. Cumprimentamo-nos e falei que iria contar sua historia no jornal.
– Não, Chips, tá louco. Eu to ‘diboa’…
Não esticou conversa, não falou de Cristo, não falou de trabalho, não falou de casamento. Tinha pressa em se afastar…
Semana passada cruzei com ele numa rua do meu bairro. Ainda estava dignamente vestido, mas não tão gordo e vistoso como antes. Bastante arredio, apenas cumprimentou-me do outro lado da rua, olhando de esgueio sem parar.
Acho que o engraxate-cantor está devendo alguma coisa…
A rua Monte Sião, no Bairro São João, assemelha-se a uma haste de garfo. Partindo da rua Caldas, começa logo atrás do antigo Sanatório e vai fazendo uma curva até morrer numa rua que sobe defronte a P.R.E. No tempo em que se amarrava cachorro com lingüiça, no entanto, ela morria num capão de mato e pasto numa grota acima da garagem da Gardênia. Eram poucas e simples as casinhas cercadas de taquaras na ruela esburacada. Lá no final, separada das demais por alguns lotes vagos, pendurada num barranco, cercada de bananeiras, limoeiros e abacateiros ficava a choupana rudimentar do Tiziu. Morava com os pais, Dito Preto, um negro alto, soturno, quase curvado, de andar cabisbaixo e assustador pois só de perto se percebia que ele estava olhando pra gente e dona Elza, também negra obesa e alegre que a qualquer coisa respondia: “graças a Deus, né ‘fio’…”.
Apesar do porte avantajado dos pais, Tiziu era miúdo, franzino, Tigüera. Eu ainda era um entregador de gás da loja do Zézinho Gouveia, não havia sequer entrado numa delegacia de policia, mas já ouvia algumas estripulias do Tiziu. Trombava freqüentemente com ele ali pela Remonta ou Jardim Amazonas. Eu na bicicleta da loja, ele sempre a pé. Nunca nos falamos, até porque o negrinho mirrado sempre fora de pouca prosa. Nossos diálogos, sempre curtíssimos aconteceram a partir dos anos 80 na delegacia de policia ou nas quebradas da noite quando conseguíamos pegá-lo com a mão na massa ou se preparando para dar o bote. Tiziu era tão discreto que era possível passar por ele na rua encostado a um poste ou uma arvore e não vê-lo. Mas ele, como um perfeito somongó, estava sempre atento à sua volta. Percebia a aproximação da policia de longe e com um bonezinho com a aba rente aos olhos se misturava aos transeuntes, às charretes, bicicletas, às arvores aos postes e passava batido. Tem muito meliante que quando está ‘limpo’ faz questão de aparecer, cumprimenta a policia, acena, se abre igual pára-quedas. O Piabinha de Santa Rita, os Coelhos Ly e Ley do Aterrado são assim. Aguinaldinho e Manoelzinho também eram… Tiziu, mesmo que não tivesse culpa no cartório, ao cruzar com a policia lançava um olhar languido e misterioso de esgueio sob o boné, donde se dava para ver o branco dos seus olhos, mas não abria a boca.
O pretinho mirrado que deve ter ganhado o apelido de “tiziu” devido sua semelhança com o diminuto e barulhento passarinho preto, parecia no comportamento muito mais o astuto e arredio “somongó”. Andava de vez em quando com o vizinho Luiz Macaco, da Travessa Juiz de Fora – este eu nunca soube que fim levou – mas praticava seus pequenos furtos e queimava a erva maldita sempre sozinho.
Tiziu foi bandido num tempo em que era difícil ser bandido e fácil ‘pagar’ cadeia. Na sua adolescência e juventude o termo “marginal” caia como uma luva nos meliantes que como ele optaram por andar na contra-mão da lei. Eram todos conhecidos da policia e discriminados pela sociedade. Furtos de quintal, furtos de residência, furtos de lojas, furtos diurnos ou noturnos … cada um tinha sua marca registrada. Ainda que não houvesse testemunha ocular do crime, era relativamente fácil chegar ao meliante através do ‘modus operandi’, da pratica delituosa. Como antes da Constituição de 88 podia-se prender para ‘averiguação’ bastava então arrancar a confissão do sujeito e trancafiá-lo no xadrez. Aí vinha a parte mais fácil da vida de bandido… O condenado não tinha vinculo com os demais companheiros de ‘caminhada’. Bastava esperar pacientemente atrás das grades o tempo passar ou, no caso dos mais apressados, fazer um ‘tatu’ no chão ou no teto ou serrar dois ou três palitos da grade, dobrar a serra do cajuru e voltar para a rua, para fazer o quem bem entendesse da vida, sem ter que dar satisfação a ninguém.
Com a avassaladora expansão das drogas nas duas ultimas décadas e o surgimento da “globalização” a vida de preso mudou da água para o vinho. Hoje quase não existem mais meliantes solitários com o perfil do Tiziu. Eles estão de uma maneira ou outra interligados pelas drogas e pelos ‘compromissos’ da lei do cárcere. Constrangimento de dormir na praia, lavar o boi, dividir o ‘marroco’ e ou ‘bandeco’ é o menor dos delitos. Da exploração sexual e da extorsão ninguém escapa. Só para ilustrar: da ultima vez que o estelionatário e traficante Vicentinho se hospedou no Velho Hotel da Silvestre Ferraz, há seis anos, dona T. sua mãe, era a primeira a chegar para a visita toda quarta feira. Vinha de taxi. Trazia com ela quatro fardos de mantimentos; arroz, feijão, farinha para bolo, cigarro, chocolate, biscoito – dava um trabalhão revistar aquilo tudo – enfim tudo que uma boa despensa não dispensa, suficiente para abastecer uma grande ‘familia’ durante uma semana… E Vicentinho tinha até um pajem particular para empurrar sua cadeira de rodas nos banhos de sol…
Hoje ninguém sai da cadeia sem pagar pedágio. Quem sai de albergue, quem vai fugir ou trabalhar nas obras de ressocializaçao fora da cela ou do prédio é obrigado a levar celular, drogas e ‘kits fuga’ para dentro da cadeia. Estuprador já não morre mais nos presídios… são muito mais úteis vivos, para satisfação da libidinagem e extorsão. Os casos recentes da dupla “Bruno & Osmar”, que estava trabalhando no interior do 20BPM e tentou levar 400 gramas de drogas para o Hotel do Juquinha, na viatura policial; a do Anderson Ratão, que engoliu a droga na fábrica de blocos e passou dois dias à base de purgante para expelir a erva e da egressa Michele, que pagou com a vida a ousadia de colocar cocaína na vagina para levar para o presídio, são exemplos de meliantes que são obrigados pela “lei do cárcere’ a servir de ‘mula’ … ou amanhecer pendurado na ventana, em forma de ‘cotonete’…
Em “As aventuras e desventuras de Cirilo Bola Sete – Meninos que vi crescer”, publicado no ano passado, Cirilo, que passou quase trinta anos na prisão entre uma fuga e outra, um dos poucos que viveram esta transição e conseguiu sobreviver, conta com amargura como é difícil sair do cruel sistema criado pelos próprios presos nos últimos anos.
O arredio e misterioso Tiziu que jamais deu um sorriso, nem amarelo, foi contemporâneo de caminhada de Cirilo, mas não teve o mesmo jogo de cintura, a mesma sorte… Acostumado à caminhada solitária ele se rebelou contra o sistema que batia às portas do Velho Hotel da Silvestre Ferraz nos primeiros anos da década de 90. Aos 34 anos, naquele inicio de década, amanheceu tão duro quanto fora sua vida de marginal, pendurado numa grade da janela. Não viveu para ver a mãe matar o pai com golpes de machado e se hospedar também no velho Hotel da Silvestre Ferraz e nem viu o irmão Bruno, aos 14 anos, matar um amiguinho de 13 numa brincadeira de ‘Roleta Russa’, num matinho no final da Rua Monte Sião, em 2002.
Tiziu era dos bons tempos em que era fácil ‘pagar’ cadeia. Ele não se adaptou aos novos – e cruéis – tempos… Pagou com a vida!
Meninos que vi crescer
Conheço J.P. desde que ele nasceu há vinte seis anos. Moreninho, miúdo, calado, educado… Apesar da vida humilde, nunca lhe faltou o conforto material básico e a presença dos pais, embora ambos trabalhem. J.P. cresceu sadio fisicamente e sem nenhum distúrbio psicológico ou psíquico. Não havia aparentemente nenhum motivo para que ele não fosse feliz e bem sucedido como pessoa ou em qualquer empreitada da vida. Foi pra escola como toda criança na sua idade, no bairro São João, onde nasceu e cresceu, porém não chegou às portas da universidade. Ia todos os dias para a escola, mas nem sempre para a sala de aula. As vezes era retido pelos poucos amigos nas imediações. Notas vermelhas no boletim escolar e repetições de ano letivo, seriam o menor dos seus problemas. Mesmo com pouco estudo ele poderia ser um honrado industriário, comerciário ou motoboy depois que se aposentasse como o pai. O que ele não podia era experimentar a erva maldita sentado na calçada debaixo de uma arvore perto da escola. Isso sim mudaria toda sua vida e a dos seus pais. Foi difícil para o sisudo e correto J.M., acostumado a pegar no batente desde tenra idade, abstêmio de qualquer tipo de droga, ver o filho usando maconha. Mais difícil ainda constatar que seu único filho homem não podia sair na rua, pois estava ameaçado de morte por traficantes credores.
Os pais desfiaram a tradicional ladainha de conselhos, buscaram ajuda espiritual, mudaram até de religião, internaram em clinicas, fizeram o que todo pai faria para tirar o filho da droga. Tudo em vão.
Certa vez receberam um telefonema da delegacia de policia de Casa Branca-SP. J.P. havia sido detido na rua, sem lenço, sem documentos, sem rumo e sem um níquel no bolso. Sujo, com fome e maltrapilho, na companhia de um colega de infortúnio. Ele havia sido internado em Jaguariúna, há 150 quilômetros dali, uma semana antes. Fugira da clinica com o colega do triste fado, dois dias depois do internamento.
Nem isso, no entanto, sepultou o desejo de J.P. de fumar a ‘erva santa’. Na mesma velocidade em que ele se acostumava com a vida periclitante de usuário inadimplente, seu organismo também se acostumava com o THC da erva. Um, dois, três baseados já não eram suficientes para trazer a sensação de alegria e paz do inicio. Era preciso uma droga mais forte… e também mais cara. O crack estava do tamanho que J.P. queria e agora podia comprar com seu salário de motoboy. Ao menos não precisava visitar a carteira da mãe ou do pai ou roubar na rua para sustentar o falso prazer. O que não sabia, ou talvez soubesse, mas não resistia, é que a pedra bege fedorenta é muito mais avassaladora, não tem limite de degradação e joga qualquer cristão na sarjeta em pouquíssimo tempo. Aí veio a seqüência de tratamento, se alternando com as recaídas, com os novos empregos, com os empregos perdidos…
Numa destas recaídas, vendo que o filho entregaria a própria motocicleta comprada à prestação em troca de meia dúzia de pedras, tomou-lhe as chaves e vendeu-a. Apesar de insistir em enfiar a bela, saudável e tranqüila vida pelo ralo, os anjos nunca abandonaram J.P.. Depois de cada tratamento para desintoxicação ele consegue novo emprego. A maior prova de que os anjos vivem dando pernadas nos capetas que atormentam o jovem J.P., aconteceu há dois anos. Ele voltava para casa na hora do almoço pilotando sua motoca, quando um motorista mamado bateu em outro e na fuga bateu em sua moto e o lançou no espaço. O menino que vi nascer e crescer sofreu entre outros abalos, traumatismo craniano. Após cirurgia, foram meses de tratamento e recuperação… E J.P. voltou para a vida, para a motoca, para o trabalho e… para o nefasto crack.
Estava trabalhando como motoboy para uma empresa quando a fissura bateu à porta. Saiu para trabalhar na moto da firma e só voltou no outro dia… à pé. A moto ficara com o fornecedor da droga, como garantia da divida. Desandara de vez. Duas semanas mergulhado na nóia, trancado em casa como um prisioneiro ou na rua como um mulambo. Mais um emprego perdido, mais uma internação. Enquanto isso pai e mãe definhando, se escondendo dos vizinhos, mergulhados na vergonha e na angustia, acendendo velas e pedindo aos santos para salvar o filho do vicio tirano…
Mais alguns meses e J.P. volta para casa para recomeçar. Outra vez limpo. Até quando?
Sóbrio J.P. é uma pessoa arredia, porém afetuosa, amável, educada, gentil… Conseguiu novo emprego numa concessionária de motos da Vicente Simões. Trabalhou trinta dias, até que a ‘coceirinha’ começou. Desceu ao velho Aterrado. Bateu em varias portas, mas a secura estava nos bolsos. Já cansado e fissurado, parou numa boca perto da Rua Nova. Toparia qualquer coisa. O traficante também. Afinal J.P. estava montado numa motoca que valia pelo menos quatro mil. E liberou a pedra para o garoto mesmo sem dinheiro. Liberou também para outros nóias que estavam por ali, por conta dele. Passou a noite viajando no rabo do cometa. O menino que vi crescer chegou em casa somente na manha seguinte. Mais uma vez à pé. A moto ficara em poder do traficante na boca de fumo do ‘Texas’. Lá ficaram também a saúde, o emprego, a dignidade e até as roupas de J.P. Ele voltou para casa com uns farrapos que lhe deram em troca das suas. O pai mais uma vez teve que assumir o destempero do filho de 26 anos. Procurou a empresa, narrou a conjuntura, e pediram apoio à policia civil. No final da tarde de quinta feira um garoto resmungão perto da ‘boca’ da Rua Nova, disse que sabia onde estava a moto e iria buscá-la. Vinte minutos depois encostou a motocicleta numa esquina perto do muquifo onde J.P. passara a noite queimando pedra e saiu correndo. Antes, no entanto, resmungou que ‘cobrariam’ os 290 reais queimados nas ‘marikas’.
Aquela quinta feira fora agitada na Delegacia. Além das diligencias de reconstituição do assassinado do vigilante, fora encontrado o cadáver do operário Runens Vilela no bairro Faisqueira. Os policiais estavam todos empenhados enquanto J.P. aguardava na DP para sentar ao piano. Não estava preso, mas tinha alguma historia para ‘publicar’. Não teve paciência e nem coragem. Dobrou a serra do cajuru sem enriquecer o dossiê dos seus algozes. Mas a batata está assando pra eles…
J.M. o pai que há anos vive o drama de ver o jovem filho dependente químico, entre as drogas, clinicas, novos empregos e os traficantes, com os cabelos branqueando a destempo, à revelia da genética ou da idade, se pergunta; “Onde foi que eu errei”?
E você meu estimado leitor? Onde acha que J.M. e M.I. que deram cama, comida, roupa lavada, convivência harmônica e cabresto curto erraram na criação do filho?
Do ponto de vista espiritual, Brian Weiss diria que J.P. teve pelo menos uma vida anterior onde cometeu erros e portanto terá que carregar o fardo da droga durante esta vida e voltar na próxima para se redimir. Do ponto de vista psicológico, embora seja psiquiatra, Augusto Cury dirá implicitamente em uma dúzia de ‘best selers’ de auto-ajuda sua autoria que casa, comida e roupa lavada não são suficientes para criar filhos saudáveis.
Eu diria que talvez tenha faltado jogar bola no apertado quintal, na sala de visita, andar de bicicleta na rua, nadar juntos no ribeirão, dar comida para os passarinhos, tratar do cão de estimação, sentar para ouvir historias do vovô, contar historias do gatinho malvado, vestir a camisa do pai e arrastar pelo chão, levantar de madrugada para ver o sol nascer, deitar no quintal para ver a lua e contar estrelas e coisas assim… sem receita, que faz um pai ser muito mais do que um provedor. J.P. e tantos jovens que experimentam drogas, talvez não tenha o pai como herói… precisam buscar um na rua… E não faltam traficantes de braços abertos para acolhê-los.
“Abrace seu filho… Não deixe que as drogas o abracem!!!