O crime que deu titulo ao livro…
O pescador pedalava lentamente sua bicicleta pela trilha batida que saía na estrada, quando sentiu necessidade de fazer xixi. Passara as primeiras horas da manhã dando banho na minhoca na beira do rio e mal pescara meia dúzia de mandis. Na verdade, ele sabia que seria assim. As águas do Rio Lambari estavam muito sujas para pescar alguma coisa além de mandi. Só foi para a beira do rio por dois motivos: para manter o hábito… e para ficar longe da mulher! Encostou a velha bicicleta roxa com cesto na traseira e as varas de pesca amarradas ao quadro, em um arbusto na beira da trilha, entrou no mato e foi logo abrindo a braguilha.
Enquanto a bexiga lentamente esvaziava, deixando aquela sensação de alívio, deixou os olhos divagarem para o interior da mata. Observou os galhos, os cipós, um pássaro marrom de calda longa… – dizem que é alma-de-gato! De repente seus olhos pararam em um vulto pendurado num galho. Antes mesmo de fechar a braguilha inclinou o corpo tentando ver melhor o vulto. Sentiu um calafrio. Deu dois passos à direita, levantou um galho que dificultava a visão e… Arregalou bem os olhos!
Era mesmo uma pessoa!
A cena era macabra!
O corpo rijo pendurado na forquilha da árvore, com os pés a menos de um metro do chão, parecia balançar suavemente, não tanto pela brisa suave que penetrava através da folhagem, mas pela nuvem de mosquitos que se deliciava com o corpo em putrefação.
Martim Pescador, 55 anos, já vira pessoas mortas, inclusive por causas externas, mas a visão o deixou impressionado. Ainda com os pés fincados no chão, percorreu os arredores num raio de cento e oitenta graus procurando alguém com os olhos. Não viu ninguém e o silêncio confirmou: estavam sozinhos! Deu alguns passos à frente e foi circulando o palco, até ficar de frente para o pendurado…
– “Meu Deus! É o Jacinto…
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Um corpo inerte e sem vida pendurado na ponta de uma corda, no galho de uma árvore no meio do mato, acima de um banquinho jogado de lado, certamente encerra a história do enforcado! Mas pode começar uma intrigante história de mistério, de amor, de paixão, de dinheiro… – ou falta dele!
O que, aos olhos dos familiares, dos amigos, dos curiosos e até da polícia – aquela que se limita a cumprir o ‘horário de expediente’ – parece um típico suicídio, para um policial de verdade, aquele que ama o que faz e busca esclarecer os fatos e colocá-los na mesa do Homem da Capa Preta, pode ser um crime! Um crime covarde, tramado e executado pelo vizinho do lado, por um desconhecido ou até pelo amigo de baladas!
No controverso título “quem matou o suicida”, mais importante do que saber quem é o assassino, é perceber a fragilidade da investigação policial que, por isso mesmo, na maioria das vezes deixa o assassino impune. O tino policial, a argúcia do velho detetive e o desfecho da história de “Quem matou o suicida”, no entanto, ‘pagam o ingresso’!
“Quem matou o suicida” é apenas uma das histórias deste livro, que desnuda o heroísmo do policial, que o exibe como um mortal comum, sujeito a erros, medos, deslizes profissionais e… traições. “O último dia do policial”; “Por que os cães não atacavam Fernando da Gata?”; “O batateiro do bigode falho”; “Os fantasmas do velho hotel da Silvestre Ferraz”. Histórias macabras como “O esquartejador de Silvianópolis”; “O assassinato de Silvio Santos”; “Larissa de Extrema”; “Larissa de Pouso Alegre” são uma amostra disso.
E tem muito mais.
Além dos casos policiais, vivenciados ou investigados pelo autor, o livro traz histórias de vida tais como: “Maria, 90 anos de solidão”, “Guermina e o Catre”, “O menino que dormia sobre as caixas de maçã”…
É impossível não se emocionar com o drama vivido por “Paulinho & Mariana, os pais do nóia JC”. Ou não ligar o sinal de alerta com a precocidade com que os adolescentes iniciam nas drogas, e seus riscos, em: “Tragicomédia no Hospital Frei Caetano”.
Traz também histórias hilárias como “A múmia de Bueno Brandão e os Três ossos pequenos”; “O louco e a cascavel” …
O bucolismo, o saudosismo e a transformação sociocultural de Pouso Alegre no último meio século pode se ‘pegar com a mão’ nas histórias “Ribeirões da minha infância”; “A lenda do Zorro da Zona Boêmia”; “O mistério do Corpo Seco” – que misteriosamente ‘sumiu’ do primeiro livro do autor – e; “Anos 70, a década de ouro da humanidade”.
Enfim, uma obra para matar a saudade dos tempos idos, desnudar a alma do ser humano, e constatar que ainda existem profissionais que amam o que fazem – profissionais capazes de levar uma “Mensagem à Garcia” -, mas estão cada vez mais escassos!
Tudo isso narrado com bom humor e de um jeito gostoso de ler, por alguém que viveu a vida toda em contato com as pessoas, nas ruas, há décadas contando casos policiais na imprensa de Pouso Alegre.
Boa leitura!
Airton Chips
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