MENINOS QUE VI CRESCER
Andando hoje pela manhã no charmoso calçadão do Leblon, Ipanena e Arpoador, lembrei – vejam só? – do Cirilo Bola Sete!!! Há dois anos, quando eu o entrevistei debaixo da conteira, defronte sua casa no velho Aterrado, ele contou que desfilou belo e faceiro por aqui…
O leitor que entrar no Aterrado, virar para ir ao Sesi e logo em seguida virar a esquerda, caminhar cerca de 150 metros em frente vai chegar a uma tripla encruzilhada. À da esquerda vai para o rancho da família do Marcilio Alves, a do centro leva à casa do desportista João Cavalo, a da direita leva a esquina fatídica, onde no dia 27 de novembro de 83 os irmãos Reanir de Lima mataram o detetive Marcos “Cabeçada” Alves da Silva com seu próprio revolver, após surpreende-lo de trás de uma cerca de taquara. Na encruzilhada da direita tem uma casa de blocos sem pintura, atrás de duas frondosas Conteiras ou Santa Bárbara. Uma cerca de alambrado mantêm fechada uma granja de patos, marrecos e galinhas mestiças. A casa antiga era mais aconchegante ou glamourosa. Tinha alpendre de frente para a encruzilhada, e durante toda sua existência teve duas cores: ora verde oliva, ora amarelo mostarda. A casa atual tem outra arquitetura, outra cor – blocos sem reboco – é cercada de alambrado, mas ocupa o mesmo espaço. Agora é preciso sentar-se no banco de concreto debaixo das conteiras do lado de fora do alambrado para observar o intenso movimento do trecho que se afunila na rua Cordeiro Olimpio. Foi ali que Cirilo nasceu e viveu quase metade de sua vida. A outra metade viveu nas cadeias e penitenciarias de Minas e de São Paulo ou nas ‘quebradas’, fugindo dos homens da lei.
Conheci o pai muito antes de conhecer o filho delinqüente. Luiz Pereira, o Bola Sete era um mulato claro de 1,68, ligeiramente obeso, pele lisa, rosto e quase todo o resto arredondado. Tinha prosa boa e sorriso fácil. Trabalhava de passador na alfaiataria do Keide na Dr. Lisboa, ao lado da joalheria do Piula, três pontos comerciais acima da sorveteria do Tião Bananeira. O apelido Bola Sete eu não sei de onde veio. Certamente se deve à predileção pela bola sete do bilhar que jogava muito bem no Bar Recreio. O fato é que o passador gorduchinho alegre e simpático, em 1976,77 já esboçava os primeiros sorrisos amargos. É que seu filhote Cirilo começava ensaiar os primeiros passos no crime, dando trombadas em garotos ou tomando na cara dura seus bonés ou objetos que eles levavam nas mãos. Bem mais tarde, já na década de 80, quando conheci o trombadinha, pude constatar que Bola Sete morria de vergonha toda vez que ficava sabendo de mais um delito cometido pelo filho. E já não eram mais trombadas. Aos dezessete anos Cirilo tinha quase o mesmo porte físico de hoje, porém muito mais ágil e forte. Furtos sorrateiros e roubos nas quebradas, atrás de uma faca tipo peixeira – naquele tempo não existia essa boiolagem de roubar com faca de cozinha, usava-se a famosa ‘lapiana’ numero nove tipo peixeira que impunha respeito – ou um revolverzinho 22 ou garruchinha velha de dois canos. Pistolas automáticas, Magnum 357 ou mesmo Taurus trezoitão só nas capitais paulista e carioca ou então se conseguisse arrombar a B.Pacheco e Cia.
Apesar de ter passado praticamente toda sua vida útil, de maneira inútil, por conta da justiça ou tentando fugir dela – só atrás das grades foram 19 anos – podemos dizer que Cirilo “se deu bem”. Sua algibeira nunca viu mais do que quatro ou cinco notas de 50, juntas, mas conseguiu sobreviver na prisão, pagar seu debito com a sociedade e hoje está limpo. Será…?
Tendo trabalhado fora de Pouso Alegre alguns anos e Cirilo pago cadeia em outras paragens, perdi de vista parte de suas façanhas e foi o próprio que as contou sentado no banco de concreto debaixo das Conteiras na encruzilhada da Cordeiro Olimpio, defronte sua casa no velho Aterrado. Mas voltemos aos anos 80, quando a nova safra de detetives chegou a Pouso Alegre. Adair, Pingüim, Barbosinha, Valim, Dorigatti, que ‘eram da terra’ e Romeuzinho, Luiz Neves, Munhoz, Paixão, Beijinho, Lobão, depois Pradinho, Tiãosinho, Batista, Faria, que fincaram raízes na terra do Mandu e outros que deixando marcas ou não foram embora. Não são apenas nomes, são policiais que destacaram Pouso Alegre no mapa do combate à criminalidade, desvendando crimes e prendendo meliantes destas e de outras plagas que aqui aportavam.
Até o final daquela década o “modus operandi” da policia civil era bem diferente. A policia conhecia todos os meliantes da cidade e sabia o que cada um andava aprontando. Meliante fichado na policia circulando nas madrugadas desertas…
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