Chico Luca & Mariana

Mudanças…

O peculiar carinho de Mariana aquela noite não passara despercebido à Chico Luca. Desde que passara defronte a janela em que ela amamentava a ‘gorduchinha preta’ – era assim que eles chamavam Maria Sione logo que ela começou engordar com o leite materno – ele sentira alguma coisa em seu olhar. Era um olhar mais manso, mais terno, mais meigo. Ao sentar-se para pitar na escada da porta ela viera sentar-se ao seu lado, sem fazer os relatos espinhosos do dia como sempre fazia. Ao contrário, só conversaram coisas amenas!

Essa paz despertara nele o desejo de um jantar especial… regado à cangibrina! Talvez para comemorar alguma coisa que ele, também, não sabia o quê.

Lembrou-se das últimas horas que passou no mandiocal no Sapé…

Lembrou-se da cascavel com a linguinha fina na frente da fuça triangular procurando o alvo para dar o bote. É verdade que ele sentiu um certo pavor, correu um grande risco, mas, certamente já se vira em situações semelhantes outras vezes e não sentira nada diferente.

Não, não havia acontecido nada de novo, de diferente, naquele dia. Mas, sim, ele se sentia mais alegre do que de hábito, mais leve, mais…mais, mais próximo da sua negrinha!

Estendeu o braço comprido por sobre o ombro de Mariana e a puxou para seu peito…

Ela se aninhou, se derretendo…

Ficou por uns instantes assim mergulhada no peito do marido até que levantou lentamente a cabeça e procurou seus lábios…

Beijaram-se com doçura.

Passos lentos e suaves no piso de madeira da sala interromperam o momento de ternura.

Mariana afastou um pouco do peito do marido, olhou pra ele. Olhou para a lua que subia lentamente no céu, agora bem acima do bambueiro. Procurou palavras que expressassem o que estavam sentindo. Desnecessário, pensou. Tornou a olhar para o céu de prata e finalmente falou:

– Vamos sentir saudades daqui!

Chico Luca puxou uma longa tragada do cigarro, soltou a fumaça pra cima e falou em tom resignado:

– Sim. Mas é preciso…

A lua cheia estava se aproximando do beiral do telhado. O frescor da noite, o silencio, aqueles momentos de ternura… Tudo convidavam para um contato mais caliente. Chico Luca e Mariana voltaram a se beijar.

– Sobrou um restinho da cangibrina? – perguntou ele com um sorriso malicioso nas bochechas.

– Você está querendo fazer arte, hein! – falou Mariana, fingindo rubor, se levantando.

Um minuto depois voltou com a garrafa que ainda continha alguns dedos de cachaça e a entregou ao marido. Chico Luca tirou a rolha e ofereceu à esposa. Mariana devolveu o olhar de malícia e tomou um generoso gole. Chico Luca tomou o restante… Foram abraçados para o quarto. Aquela noite fizeram amor como nunca antes na vida. Amor cúmplice. Amor terno. Amor meigo. Amor despertado… amor de marido & mulher que se amam!

 

*** Se você quer continuar essa viagem pela bela historia de vida de “Chico Luca & Mariana”, embarque no romance… ( ops! Esse não tem título definitivo e ainda nem foi publicado, rsrsrsrs…)

Jeff… O Homem do Chapéu Furado

“… qualquer frequentador do “Cine Gloria” ou do “Cine Eldorado” em Pouso Alegre nas décadas de 70 e 80, dirão que o mais marcante foi Clint Eastwood!

O cavaleiro solitário – encarnado pelo ‘quase lendário’ Clint Eastwood – é, de longe, o mais longevo caubói da história do Velho Oeste”.

CAPÍTULO X

Jeff estava no estábulo ‘conversando’ com seu cavalo no final da tarde quando Stam chegou.

– Seu “primo” está vingado Tigre, com Juros como eu prometi. Ontem mandei uns dez lacaios para o inferno – dizia o delegado ao seu baio, enquanto lhe passava o escovão.

– Olá jovem. Cuidando do seu melhor amigo, não é?

– Olá doutor. Tem razão. Depois do colt o cavalo é o melhor amigo do homem, nestas terras violentas onde a civilização ainda não chegou.

– Você fala como um sábio rapaz. Isso me faz lembrar o velho xerife Rock Hobson. Ele costumava dizer: “A vida é como um jardim florido, todas as flores nascem com igual beleza, mas há sempre as que murcham antes das outras e enfeiam o jardim e as outras flores”. Ele dizia também: “Cuide bem do seu cavalo pois ele é o único amigo que você tem. As pessoas que o rodeiam como amigo, procuram apenas uma oportunidade para lhe cravar um punhal pelas costas ou meter-lhe uma bala de fuzil”.  Tinha razão o sábio Hobson.

– Já o ouvi falar desse homem como um herói. Você o conheceu bem? – indagou Jeff.

– Oh, muito. Fomos amigos por muitos anos. Amigos de compartilhar segredos. Ele era um homem formidável, muito honesto em suas atitudes. Em todo esse tempo ele cometeu apenas um só deslize… que ele mesmo me contou.

– É mesmo? Que deslize?

– Bem… aqui em Carsom City ninguém sabe disso… – parou de falar o médico.

– Diga Stam…

– Não sei se devo contar ….

– Ora doutor, eu não vou denegrir a imagem do finado.

– Rock era um rapaz muito simpático e atraente quando mais jovem…

– E aí ‘?’

– Bem, ele teve um caso fora do casamento… com a mulher de um rico banqueiro… – contou Stam a conta-gotas.

– Isso trouxe alguma consequência. O marido dela ficou sabendo e eles duelaram?…

– Não, não… O marido chifrudo nunca soube. Nem a filha…

– Filha? Ele teve uma filha com a mulher do banqueiro?

– Sim… a família mudou-se para Carson City mas o segredo sempre esteve debaixo de sete chaves.

– Que idade tem hoje a menina bastarda?

– Não é mais uma menina… É uma moça. Uma linda moça!…

– Espere! Você está dizendo que a filha de Rock é a … Doris?!

– Isso mesmo. – confirmou o médico, olhando por baixo dos olhos para o rosto de Jeff.

Essa revelação foi um choque inesperado para o jovem delegado. “Aquele pedaço de víbora então é minha irmã”? – pensou ele.

– O que foi rapaz? até parece que viu um fantasma. Está certo que foi uma fraqueza de Rock mas não é preciso ficar pálido por isso, afinal todo homem dá seus pulinhos.

– Não foi nada. Continue sua narração… Doris sabe quem  é seu verdadeiro pai?

– Não, sua mãe morreu quando ela ainda era criança. O banqueiro nunca soube. Rock naturalmente também se calou.

– E quanto a Doris? Como ela é? Sempre foi mesquinha desde pequena? – Interessou-se Jeff.

– Não. Até algum tempo era uma garota formidável. Mas depois com a influência do ‘pai’, foi se modificando. Hoje faz todas as vontades do pai. Mas é uma boa moça.

– Quer dizer que faz o que ele quer?

– Exatamente, tanto que ela vai se casar com o paspalho do Richard porque Charles o impôs.

– Preciso impedir isso, ela é min… – calou-se.

– Você ia dizer minha!…

– Sim, minha obrigação impedir que uma moça direita se case com um cafajeste como aquele almofadinha sem escrúpulos – emendou Jeff.

 

No dia seguinte.

“Toc, toc,toc” foi o som ouvido’ por Doris Heb vindo da porta de sua residência no andar superior do banco. Ao abrir maquinalmente a porta teve uma surpresa.

– Você?!

– Olá Cascavel. – disse Jeff provocante, tentando encontrar um assunto para abordar a jovem.

– O que quer aqui? Meu pai está lá embaixo…

– Muito melhor, pois eu preciso falar é com você.

Doris, lembrando do último episódio em que tentou matar o auxiliar de xerife atraindo-o a uma emboscada, e que, apesar disso, ele nada fizera contra ela, pensou que tinha um débito com ele. Por isso, mesmo contra a vontade, deixou-o entrar.

Jeff adquiriu uma atitude mais séria do que de costume e bastante embaraçado entrou no assunto que o trouxera ali.

– Bem, eu estou preocupado com você.

Doris se retraiu com a afirmação, mas nada disse. Jeff foi direto ao assunto.

– Você sabe quem é seu pai?

– Pergunta muito idiota não acha?

– Falo do verdadeiro pai.

– Que conversa é essa… Charles não é meu pai? – perguntou.

– Não. Você se lembra de Rock Hobson?

– Sim. Um bom sujeito que foi assassinado pelas costas tempos atrás e ninguém fez nada para punir o assassino. – Disse Doris com certa ponta de despeito pela função de Jeff.

– Eu estou aqui para isso e estou muito próximo de realizar meu objetivo. Mas o mais importante é o que você precisa saber…. Rock Hobson… era seu pai.

– O que disse?!!

Jeff lhe contou o que sabia.

-Não posso acreditar! – falou Doris esfregando as mãos para conter o nervosismo.

– É a verdade… E tem mais algo que você precisa saber. O velho Rock era… – hesitou Jeff.

– ‘Era’?….

– Rock Hobson era meu pai – completou Jeff.

Doris levou instintivamente as mãos à boca tentando esconder sua estupefação.

– Quer dizer que… nós somos irmãos

– Sim… Meio irmãos.

– É tudo muito absurdo. Há quanto tempo você sabe disso?

– Até ontem eu ignorava. Foi o doutor Stam quem me contou. É difícil acreditar, não é?

– Jamais imaginaria tal coisa.

– Tem mais coisa que precisa saber, Doris. Você sabe quem são os responsáveis pelos assaltos a bancos, diligências, caravanas, roubos de gado e todo crime que assola a região?

– Não tenho a menor ideia.

– É o pessoal do Rancho Barra Y, George, Brad, Richard e seus capangas. Não diga que não sabia disso.

– Não! Não sabia. Vou muito pouco à fazenda. Eles são muito amáveis comigo. Nunca desconfiei de nada.

– Então você não sabe por que o banco de seu pai nunca foi assaltado? É porque Charles é uma peça muito importante no jogo de George e Brad. É ele quem dá as informações quando entra algo de valor no condado.

– Você quer dizer que Charles é um cúmplice dos bandidos? E como você sabe tudo isso?

– Ora, basta ser um pouco inteligente e ter um pouco de sorte. Além do mais eu sou um agente da lei. Investigar é meu ‘mitier’! Me diga, agora, depois de tudo que sabe, você ainda pretende se casar com o almofadinha?

– Eu não sei o que dizer… O que você acha que devo fazer?

– Aja como se não soubesse de nada, por enquanto… Eles já sabem o que nós sabemos sobre eles. Amanhã teremos ‘fogos de artifício’ na cidade. Torça para que tudo acabe favorável à lei… Que a justiça seja feita. Se sobreviver eu a levarei daqui.

Jeff despediu-se deixando Doris mergulhada em um turbilhão de pensamentos. Quando ia saindo do prédio topou com Charles que vinha subindo a escada. O banqueiro instintivamente estendeu-lhe a mão dizendo:

– Olá rapaz, a que devo a honra de receber a visita do bravo delegado? Vamos entrar. O almoço já deve estar pronto.

– Obrigado sr. Heb, fica para outro dia. Morrison me espera na delegacia. Até logo.

– Até logo delegado – respondeu o banqueiro, intrigado com a visita.

Jeff ganhou a rua e se dirigiu para a Delegacia sem notar a presença de um homem no telhado do prédio defronte o banco. O mesmo que estivera ali observando desde que ele entrara na residência do banqueiro. O homem habilmente deixou o telhado descendo pelos fundos, montou em seu cavalo e saiu sorrateiramente da cidade. Enquanto isso…

– O que o delegado queria, filha?

Doris hesitou. Um tanto porque não tinha uma resposta pronta e outro tanto pelo significado da palavra “filha”. A hesitação lhe ofereceu uma boa resposta.

– Ele veio procurar Stam. Parece que ele contundiu o ombro ontem e lhe disseram que talvez o doutor estivesse aqui.

– Hum… – resmungou Charles, pensando em coisas mais urgentes.

 

Mais tarde, não muito distante da cidade.

No curral havia mais de quarenta homens. Entre eles George, Brad e Richard. O clima era tenso e belicoso.

– Já é a segunda vez que esses malditos xerifes vão direto ao esconderijo – esbravejou Brad. Impossível que seja por mero acaso. Tem que ter um traidor! Seja ele quem for, vai pagar com a vida.

– Você tinha razão Brad… Charles e a filha são os traidores! – Disse o pistoleiro que estivera observando os movimentos de Jeff mais cedo.

– Conte o que sabe Stanley.

– Eu fiz como você mandou. Me alojei no terraço do prédio em frente o banco e fiquei observando. No final da manhã o auxiliar de Morrison foi até a casa do banqueiro. Foi atendido por Doris, entrou, conversaram uma meia hora… Quando ia saindo topou com Charles que subia para almoçar. Cumprimentaram no pé da escada, trocaram algumas palavras amistosas e o delegado seguiu para a Delegacia. – Narrou o espião.

– Está vendo George? Não se pode confiar em ninguém. Hoje a noite arrasaremos Carson City. Vamos liquidar os dois xerifes, o banqueiro e a filha.

– Espere – interrompeu Richard – Se liquidarmos os xerifes não haverá necessidade de acabar com os Heb.

– Talvez você tenha razão. Após tirar os empecilhos do caminho prosseguiremos com nosso passa tempo e precisaremos de um bom informante.

– Não sei não… Traidor uma vez, sempre traidor. Além do mais já perdemos muitos homens por causa dessa traição. É melhor dar cabo deles também. – Cortou George.

– Vamos primeiro cuidar dos homens da lei, depois a gente cuida dos Heb. –  arguiu Richard, pensando na jovem Doris, com quem pretendia se casar.

– Então já sabem: hoje no escurecer vamos varrer Carson City, a começar pelos dois xerifes. E não se esquecem que James e Pat são amigos deles, portanto merecem um pouco de “atenção”! Quem abater Jeff poderá ficar com o saloon como prêmio.

– Aí caramba, poderei beber “tequila” à vontade. – Disse cinicamente Sancho, o que mais tinha sede em Jeff.

 

*** A aventura de Jeff, o homem do chapéu furado em Carson City – penúltimo capítulo -, continua na próxima quinta-feira, 10.

BORA VIAJAR!

     Assim começou o mais sublime romance policial vivenciado no alto da serra da Mantiqueira.

Ao término do jantar, Juliano, como de hábito juntou as sobras dos pratos, pegou os ossinhos da costelinha de porco e foi levar lá fora para a cadela da irmã.

– Ué! A Lobinha não está aqui na varanda… – disse o garoto intrigado.

– Cadê minha cadelinha? – perguntou Paloma enquanto retirava a mesa.

– Faz mais de meia hora que estou ouvindo latidos constantes vindo da direção da estrada… deve ser ela – respondeu Júlio.

– Escutem… parece ser mesmo os latidos da Lobinha – emendou Valentina.

Todos saíram à varanda para ouvir melhor.

– É ela mesmo… Os latidos parecem que vem da curva do pinheiro – disse Paloma.

– Você disse que faz mais de meia hora que ela está latindo, querido?

– Do quarto eu não distinguia se os latidos eram dela… mas faz bem tempo.

– Será que ela está ferida? – indagou Juliano.

– Não filho. Não são latidos de dor… Ela deve estar acuando algum bicho, um ouriço, um gambá, talvez…

– Eu vou chamá-la… – disse Paloma saindo em direção à estrada.

– Cuidado filha… Pode ser um lobo, uma jaguatirica… – advertiu Valentina, mas Paloma não ouviu! Já estava chegando ao portão da pousada, seguida do irmão aos gritos “Lobinha, Lobinha, Lobinha”. Os latidos cessaram. No minuto seguinte a bela e esguia cadela dourada passou por uma brecha do portão de madeira e adentrou a alameda da pousada, arfante, abanando o rabo, feliz por terem se lembrado dela. Fez festa para a jovem dona, pulou no garoto que batia palmas e chegou correndo à varanda onde Júlio, apoiado na esposa esperava pelos filhos. Apesar do cansaço, e de estar de volta ao seu habitat, Lobinha não parou um instante. Correu inquieta ao redor dos donos, voltou a latir, deu meia volta e seguiu rumo ao portão de onde viera.

– Ei, espera, onde você vai garota? Venha jantar… – disse Paloma tentando segurar a cadela cor de arrozal maduro. Mas ela não parou. Enfiou-se novamente no vão da porteira e voltou latindo morro acima em direção à curva do pinheiro.

– E agora? O que deu nela? – quis saber Paloma, preocupada com o comportamento da cadela.

– O que quer que seja que ela encontrou ainda está lá. Se fosse um animal acuado, teria ido embora quando ela parou de latir e se afastou… estranho – conjecturou Júlio.

– Eu vou lá ver o que é… Juliano, pega a lanterna! – disse Paloma, pegando ela mesma um cajado de aroeira que ‘morava’ atrás da porta, na recepção.

– Cuidado filha, não se aproxime muito. Pode ser perigoso… – alertou Valentina apreensiva, ajudando o marido a se acomodar numa poltrona na varanda para ir atrás dos filhos.

Antes de chegar ao portão que beirava a estrada, ouviu os gritos da filha voltando ao seu encontro:

– Mãe, pai… tem um homem caído ali. Ele parece ferido, não se mexe! Acho que está morto…”

 

*** Se você quer continuar essa viagem pela bela e romântica Serra da Mantiqueira, embarque no livro “Uma viagem que não chegou ao fim”!

Jeff … O Homem do Chapéu Furado

Escrevi “Jeff, o homem do chapéu furado”, em um caderninho espiral no mês de julho de 1977, durante meus turnos de sentinela nas guaritas do 14º GAC, quando servia o exército naquele ano.

Boa viagem à década de 1870!

                                                           CAPÍTULO IX

                                                         “EMBOSCADA”

O sol se erguia causticante nas ruas empurrando os transeuntes para a sombra morna das varandas e casas de madeira de Carson City. Algumas pessoas em seus afazeres atravessavam a rua rapidamente, para se proteger do calor. De repente, na entrada da cidade, surgiu a diligência em disparada, puxada por quatro cavalos molhados de suor e foi parar defronte a delegacia. Ainda da boleia, tentando conter os cavalos açoitados, o cocheiro disparou o alarido de notícias ruins, comuns naquelas paragens.

– Ouaaaa… ouaaa… Hei xerife, me ajude. Assaltaram a diligência outra vez… mataram…

– Calma rapaz! – Disse Morrison saindo à rua – uma coisa de cada vez.

– No canyon… – disse ofegante o cocheiro segurando o ombro esquerdo ferido, enquanto os passageiros desembarcavam. – No canyon do Coiote… eles surgiram pela frente e nos obrigaram a parar. Eram uns dez ou mais… Não tivemos chance. Mataram o guarda e um dos passageiros e me acertaram no ombro – concluiu o cocheiro ainda ofegante.

– Alguém aí chame o médico! Afinal o que os assaltantes queriam? – Perguntou Morrison.

– A mala postal estava recheada. Parece que havia uma grande soma nela. Limparam também os passageiros… foi quando um deles reagiu e foi baleado.

– Viu que direção tomaram?

– Contornaram o canyon do coiote e entraram na pradaria à oeste.

O assalto havia ocorrido a poucas milhas da cidade. Se agisse rápido talvez fosse possível pegar os rastros dos assaltantes, concluiu o xerife, e deu ordens:

– Jeff, encarregue alguém de levar a diligência adiante… Eu vou recrutar homens para uma patrulha. Encontre-me aqui em dez minutos.

Pouco depois nove homens armados de rifles e pistolas partiram de Carson City. Morrison, os chefiava. Após cavalgarem cerca de meia hora chegaram ao local do assalto.

– Dois de vocês… deem uma sepultura digna a esses dois coitados, o resto venha comigo. Vamos achar a pista desses abutres e segui-los.

– Hei Morrison, aqui estão os rastros… bem visíveis – disse o auxiliar Jeff.

– Vamos em frente.

Um pouco adiante.

– Está percebendo onde essa pista nos leva xerife?

– Sim Jeff, para a pedreira. Serão os mesmos que prendemos da outra vez?

– Obviamente. Podem estar nos esperando…

– Preparem as armas e estejam atentos. Poderemos ser alvejados a qualquer momento.

Os patrulheiros penetraram cautelosamente por entre a pedreira, esconderijo perfeito para bandos de fora da lei.

– Parece estar deserto. – Sussurrou Morrison.

– Não se deixe enganar xerife, silencio é prenuncio de barulho – filosofou Jeff.

– Vamos desmontar.

De repente uma voz cortou o silencio…

– Continuem com as mãos sobre a cela, afastem em pouco mais dos cavalos.

Os defensores da lei, antes de qualquer reação, deram uma olhada discreta em volta e compreenderam que era necessário ser obedientes. Formando um círculo em volta deles havia mais de vinte homens armados até os dentes.

– Como é, não dizem nada? Enrolaram a língua? Será que é a emoção de rever Sancho Perez. Estavam com saudades de Sancho e suas piadas? – Provocou o mexicano sarcástico apertando o gatilho do rifle na direção dos patrulheiros, sem olhar o alvo. O pobre homem tombou com um gemido seco, sem vida.

Um brilho de ódio passou pelos olhos de Jeff num apelo mudo, diante de tal covardia. Sancho, que fizera de propósito, o percebeu.

– Ora, vejam quem está aqui, o forasteiro sem nome! Como vai rapaz? Sempre andando para trás, hein? Soube que é ajudante de xerife… um sujeito com sua habilidade se trabalhasse para Sancho teria posto mais elevado que o de engraxate de botas. Mas você é um idiota…. Bem, vamos ao que interessa. Ultimamente vocês têm atrapalhado nossos negócios, e os chefes não admitem ninguém em seus caminhos, muito menos palhaços. Portanto vamos fazer um favorzinho aos chefes, mandando vocês para o inferno, e aproveitar para saldar minha dívida com você, não é mesmo muchacho? Lembra daquela noite no saloon? Você destroçou meu revólver roubado, que era lembrança de um tenente que eu matei afogado numa cocheira de Laredo. Aquele tiro me deixou vários dias sem poder utilizar a mão direita. É hora de acertar nossas contas. Glem, Clint, Joe, deem-lhe o tratamento massagem. – disse com sarcasmo o mexicano bigodudo com o ‘sombrero’ caído nas costas.

A tal “massagem’ feita pelos três brutamontes era semelhante a ser atropelado por uma manada de búfalos em disparada. Se fosse uma luta em que se pudesse defender e contra-atacar, Jeff não teria dificuldade para pô-los a nocaute, pois eles só tinham músculos e não sabiam usar a cabeça. Mas Jeff não tinha essa alternativa. Mais de uma dúzia de rifles apontados para ele e seus companheiros desarmados o impedia de qualquer atitude de defesa. Só restava apanhar como um cão. No entanto, em meio aos socos dos brutamontes e a fala sarcástica de Sancho, Jeff calado pensava numa saída. Antes de perder os sentidos uma ideia surgiu na sua mente.

– Entortem o seu nariz – dizia o sádico mexicano se divertindo com a dor do inimigo e as gargalhadas dos seus homens. Mostrem a ele o que acontece a quem atravessa o caminho de Sancho Pérez.

A cada golpe recebido Jeff procurava esbarrar em seus companheiros, fazendo-os se afastarem entre si, se aproximando dos três bandidos que estavam a sua retaguarda. Os três sujeitos como todos os outros, faziam parte de uma quadrilha preparada para enfrentar quem quer que atravessasse seu caminho, por isso além de um colt traziam também uma Winchester. A princípio Morrison, que assistia penalizado o deprimente espetáculo sem poder fazer nada, não havia entendido as intenções de Jeff. Um golpe em pleno queixo atirou o delegado ao chão. Ao se levantar ele lançou um olhar a Morrison indicando os três homens atrás. O velho xerife deu uma olhada discreta, mas ficou na mesma, tornou a olhar novamente e finalmente entendeu, reparando que os três bandidos mantinham seus reluzentes rifles apontados para o chão, distraídos, se deliciando com a surra que os companheiros impingiam ao valente agente da lei. Para dar tempo a Morrison, Jeff, de vez em quando reagia a algum golpe enfurecendo ainda mais os agressores. Ao receber um soco no estômago, Jeff curvou-se mais do que o necessário e outro agressor lhe mandou um violento pontapé no traseiro, atirando-o de encontro a seu comparsa. Sentindo ser o momento oportuno, Jeff, num gesto inesperado arrancou o revólver do coldre de Glen a sua frente, gritando:

– Agora Morrison….

Num gesto rápido o xerife e os quatro patrulheiros desarmaram os três sujeitos mais próximos e abriram fogo contra eles. O velho e famoso fator surpresa entrou em cena mais uma vez. Os pistoleiros estavam agrupados, formando um círculo em volta da ‘arena’, distraídos, sem jamais esperar tal reação. Os homens da lei’ atiraram impiedosamente para salvar a pele. Com a agilidade que a situação exigia, Jeff rolou no chão pedregoso na direção dos seus amigos fazendo fogo a sua volta até que o colt que ele havia ‘tomado emprestado’ do brutamontes fez ‘clic’… Mas Morrison não era xerife nos cinquenta e tantos anos por acaso, e já pensara nesse detalhe.

– Tome Jeff – disse ele – atirando-lhe uma Winchester de um dos bandidos mortos. Jeff, de um salto pôs-se de pé e continuou atirando com o rifle. Sancho, sem ser percebido, aproveitando a confusão, esgueirou-se furtivamente por trás de umas rochas e fugiu.

O tiroteio cerrado durou pouco tempo, pois aconteceu em campo aberto. Ao cabo de pouco mais de um minuto o cenário se inverteu:

– Não atirem, nós nos rendemos – gritou um dos bandidos jogando a arma no chão.

– Levantem as mãos seus coiotes – ordenou Jeff.

– Muito bem rapaz! Você atuou muito bem – elogiou Morrison.

– Eu não estaria vivo se estivesse sozinho. Bem… vejamos se a caçada, e algumas costelas quebradas, compensou – emendou o delegado. Um, dois, mais dois e mais um. Cinco vivos…

– … E uns quinze no inferno – completou um dos componentes da patrulha.

– É, desta vez os abutres farão um belo banquete – concluiu Jeff.

– Hei… eu não estou vendo o mexicano bigodudo gozador. O cretino só tem coragem atrás de um colt. Quando se viu na frente de um tratou de dar o fora. Realmente muito covarde – comentou o xerife.

– Deixe- o para mim. Eu estou lhe devendo uma “massagem” – disse Jeff de frente para os bandidos capturados. Neste momento percebeu quando um deles olhou com interesse às suas costas. Com a rapidez de um relâmpago Jeff se abaixou gritando por uma arma, pois ainda não havia recarregado as suas.

– Cuidado atrás…

Novamente o chapéu do agente da lei foi arrancado da sua cabeça por um projétil a procura do alvo principal. Morrison e os patrulheiros ainda conservavam as armas engatilhadas e ao se darem conta do que se passava abriram fogo contra o bandido que tentara chegar sorrateiramente pela retaguarda. Após se contorcer por alguns segundos o atirador traiçoeiro tombou sem vida. Aproveitando a pequena confusão, os bandidos, mesmo desarmados se atiraram sobre os homens da lei. A luta, no entanto, durou pouco. Minutos depois os que não estavam mortos estavam dominados.

– A festa acabou – disse Jeff – Bil, busque os cavalos enquanto amarramos esses coiotes.

– Bela caçada hein rapazes… Mas o malote da correspondência com o dinheiro não está aqui – disse Morrison vasculhando o esconderijo improvisado entre as rochas.

– Deve estar com os mandantes do roubo.

– Eles vieram direto para cá…

– Nem todos. Um deles deve ter seguido por outra trilha. Você sabe qual…

– Tem razão. Estive pensando … nossa cadeia não segurará esses coiotes, principalmente agora que seus mandantes estão quase a descoberto. Eles tentarão resgatar os comparsas -falou preocupado o xerife.

– Tenho uma ideia. Como está claro que os responsáveis por tudo isso são os sócios do Rancho Barra Y, George e Brad, e como você me disse, eles tem, ou melhor, tinham mais de quarenta homens, agora devem ter pouco mais de vinte…

– Ahn… Até aí não vi nada de novo.

– Eles atacarão todos de uma vez… Vamos lhes preparar uma surpresa.

– Não conte com os cidadãos de Carson…

– Não estou contando. Vamos embora… no caminho vou expor meu plano.

 

*** A aventura de Jeff, o homem do chapéu furado em Carson City, continua na próxima segunda-feira, 07.

 

Bora Viajar!

“Nas páginas dos livros passeamos, conhecemos lugares, pessoas, vidas, histórias…

Nas páginas dos livros sorrimos, emocionamos… às vezes choramos!

Nas páginas dos livros descobrimos, identificamos, formamos opiniões, valorizamos, respeitamos, amamos…

Nas páginas dos livros nos divertimos, relaxamos, espairecemos…

Nas páginas dos livros ficamos mais ricos… de cultura, de conhecimentos!

Airton Chips”

Gregório estava perdido nos papeis da empresa no seu escritório quando o celular vibrou sobre a mesa. ‘Desconhecido’, leu ele na tela colorida, antes de tocar no aparelho. Mas resolveu atender assim mesmo. Quem sabe esquecia um pouco as contas. Tocou na tela e levou o aparelho à orelha.

– Cê tá maluco, mano!  Que doidera é essa de confessar o sinistro?… – disse a atabalhoada e abafada voz do outro lado da linha.

– Quem está falando?

– É o Pafúncio, cara! Chegou uma ‘pipa’ aqui pra mim que você vai abrir o suicidamento pros tiras! Cê tá louco? Isso dá cana pra cacete!!!

– Ô,ô,ô… que ‘pipa’, que ‘abrir’, que ‘suicidamento’? Não estou entendendo!

– Escuta aqui, vacilão… eu tô preso em Jabuti. Caí numa parada aí fazendo uma mula, assinei um BO ferrado! Pior, eu estava de saidinha de uma cana de 33! Agora sou reincidente. De repente chegou uma fita aqui pra mim que os ‘zomi’ descobriu tudo… Foram lá na cidade vizinha; foram no buteco que a gente apagou o cara; acharam o chumbinho no estômago do mané; te enquadraram e você abriu o bico, seu talarico! – falou a voz agressiva no aparelho.

Gregório se levantou rapidamente e trancou a porta do escritório. Não podia correr o risco de alguém ouvir aquela conversa. Estava apavorado. Suava frio. Voltou a sentar-se atrás da mesa, mas não conseguiu ficar sentado. O que estava acontecendo? Que conversa era aquela? Quem descobriu o quê? Já fazia um mês que Jacinto havia sido enterrado e com ele todo o macabro segredo. Desde o sepultamento ninguém mais tocou no assunto da morte dele. Aliás, suicídio era tabu na cidade… Ninguém ousava comentar! Ele nem se lembrava mais de Pafúncio. Espere! – pensou – como ele conseguiu meu celular? Tentou se acalmar… E acalmar seu interlocutor.

– Não entendi… Se você está preso, como você está me ligando?

– Deixa de ser mané! Celular na cadeia é mais fácil do que nota de dez! Mas afinal, o que está acontecendo nesta biboca de cidade? Como acharam o rastro…

– Eu não sei. Estou tão surpreso quanto você. Não ouvi nem o mais leve rumor a respeito… Fui à missa de sétimo dia com minha tia. Ninguém tocou no assunto. Como você achou meu celular? Eu joguei o velho no rio naquela noite!…

– O número do novo estava na pipa que trouxe a caguetagem. Resolve essa parada aí, mano. Não tô a fim de passar trinta anos vendo o sol nascer quadrado aqui, não…

 

*** Se você quer continuar essa viagem, navegue pelo livro “Quem Matou o Suicida!”

Bora Viajar!

“Nas páginas dos livros passeamos, conhecemos lugares, pessoas, vidas, histórias…

Nas páginas dos livros sorrimos, emocionamos… às vezes choramos!

Nas páginas dos livros descobrimos, identificamos, formamos opiniões, valorizamos, respeitamos, amamos…

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Nas páginas dos livros ficamos mais ricos… de cultura, de conhecimentos!

Airton Chips”

“Virei-me no vão da porta da inspetoria e dei de cara com o molecão gorducho e cabeludo olhando pra mim. “Pomarola”, que alguns anos mais tarde também se tornaria Detetive, meio sem jeito falou:

– Policial, saiu um cara correndo algemado ali no beco da delegacia…

Não fiz nenhuma pergunta! Nem precisava… Entendi de imediato que Peixinho havia fugido. Virei nos cascos e saí no encalço do fujão com toda velocidade que podia. Ao sair na porta da delegacia os olhares dos curiosos me mostravam a direção a seguir. Desci a Herculano Cobra, virei a João Basílio, cruzei a Mal. Deodoro e quando cheguei à linha férrea que margeava a avenida Brasil tive que ser novamente guiado por um transeunte. Antes que eu perguntasse, ele respondeu esticando o braço para a Rua Antônio Vasconcelos.

– Foi pra lá…!

Desci dos trilhos e continuei em frente com meu velho HO enferrujado na mão, sem avistar Peixinho, seguindo apenas o olhar dos curiosos – afinal, não é todo dia que um sujeito passa na frente da nossa casa com um par de pulseiras de prata nos braços correndo como se fosse tirar o pai da forca!

A rua acabou, um terreno baldio surgiu à minha frente e logo em seguida a Perimetral, em obras. Mais Alguns metros cheguei à foz do maior esgoto da cidade, conhecido pelo apelido irônico e nojento de “Pão de Açúcar”, no Rio Mandu. As águas da enchente haviam baixado, mas tinham deixado as margens do rio mais lisas do que bagre ensaboado. Era preciso diminuir a velocidade e redobrar os cuidados para se manter em pé. Finalmente, desde a delegacia, avistei meu peixe trotando lentamente na lama fina na margem do rio em direção à ponte do velho Aterrado. Corri pela duna que margeava o rio, menos barrenta, e quando desci das dunas para agarrar o fujão, ele assustou-se com o barulho da capituva e virou-se para mim. Ao ver o cano do velho trabuco a um metro do seu nariz, sem pestanejar e sem pensar nas consequências, o meliante algemado pulou no rio que ainda exibia um resto de enchente. Tive que parar um segundo para pensar.

– “E agora? Se pulo na água com a arma na mão, não conseguirei nadar… e talvez tenha que usá-la! Se pulo sem ela, talvez não dê conta do meu prisioneiro! Se não pulo, ele atravessa o rio e vai embora levando minha pulseira de prata… me deixando com cara de tacho! Que fazer”?

 

*** Se você quer continuar essa viagem, navegue pelo livro “Meninos que vi crescer!”

Jeff… O Homem do Chapéu Furado

                                                                                   CAPÍTULO VIII

 

                                                                                        O DUELO

 

A noite no saloon ainda estava morna, com tendência a esquentar. A cada momento entrava mais um frequentador ou forasteiro. O xerife e seu delegado estavam encostados no balcão conversando com Pat quando o pistoleiro da noite anterior chegou. O bezerrão dirigiu-se lentamente ao balcão e repetiu o pedido da noite passada. Ao ser atendido virou-se de frente para os frequentadores e passou a observar o movimento, como se estivesse procurando alguém. Nesse ínterim uma mesa desocupou próximo ao balcão e Morrison convidou Jeff a sentar e começaram um jogo de cartas. O pistoleiro de preto então aproximou-se, puxou uma cadeira, tirou um maço de dólares da algibeira, colocou sobre a mesa e antes que dissesse alguma coisa Morrison o antecipou.

– Estamos só matando o tempo. Não jogamos soma tão alta.

– Estão com medo? Ou sem dinheiro…

Ninguém respondeu.

– Eu aposto dez contra um. – Provocou o estranho.

Jeff recolheu as cartas, embaralhou, levou a mão ao bolso do colete, retirou um belo relógio de ouro e o depositou sobre a mesa.

– Estamos iguais – Disse laconicamente. Distribuiu as cartas e passaram a jogar em silencio.

O pistoleiro de trajes negros trocou uma só carta, ‘filou’ lentamente sem mexer os músculos do rosto, e tão lentamente quanto filou exibiu uma a uma as cartas sobre a mesa. Um ‘as’, uma dama, outro ‘as, outra dama… À essa altura já havia três ‘sapos’ em volta da mesa. Todos esticaram os olhos na expectativa de que a quinta carta repetisse um ‘as’ ou uma dama para completar o sexto maior jogo do pôquer. O pistoleiro, num último gesto de suspense deixou cair lentamente a derradeira carta de costas sobre a mesa. Foi um dos ‘sapos’, curioso e com medo, quem virou a carta: era uma dama. Full-hand! Imediatamente o pistoleiro esticou o braço para puxar o prêmio. Jeff deteve seu movimento com um aceno e mostrou suas cartas enfileiradas à sua frente. O próprio pistoleiro franzindo a testa, virou uma a uma, também lentamente. Oito de ouro, nove de ouro valete de ouro, ‘as’ de ouro e, finalmente, depois de perscrutar o entorno da mesa, virou a quinta carta… um rei de ouro!

– Flesch! – disse o jogador. Voce tem sorte no jogo rapaz. É a primeira vez que Bob Mat encontra um adversário à altura. A propósito, qual é o seu nome?

– Jeff… Rogers.

– Hummm…

Desta vez foi Bob quem deu as cartas.

– Eu desisto – balbuciou o xerife, mostrando uma trinca.

– Meu jogo também não vale. Apenas uma sequência mínima – disse Jeff sem confiança no jogo.

Bob não disse nada. Apenas colocou no monte um par de damas e tratou de trançar o baralho. Desta vez um leve sorriso sarcástico aflorou seus lábios sem, contudo, clarear seu semblante carregado e impassível. Após distribuir as cartas e fazer seu jogo trocando duas cartas, filou lentamente cada uma e deitou o jogo na mesa dizendo:

– Parece que minha sorte está voltando… Flesch de paus!

Jeff olhou para o jogo do adversário sobre a mesa, soltou um bocejo e baixou suas cartas à sua frente… Quadra de Rei!

Bob não pode disfarçar seu espanto. Foi como se tivesse tomado um choque elétrico. Mas continuou sem dizer palavra. A partir daí Jeff não perdeu uma mão. Puxou todas as paradas, pequenas ou grandes. Logo o pacote de dólares de Bob estava no seu bolso. Uma hora depois, já sem um tostão furado, o pistoleiro de trajes negros surpreendeu os dois homens da lei e os espectadores que haviam sido atraídos para a mesa com uma proposta descabida.

– Vamos jogar minha vida contra a sua. Quem perder… – interrompeu a frase no meio abrindo os braços como quem diz: ‘perde a vida para o outro’!

Jeff nada respondeu. Continuou dando cartas como se a aposta fosse cinco dólares.

Enquanto o jogo seguia tenso no saloon entre o pistoleiro e o delegado, vultos sombrios se esgueiravam na escuridão nos fundos da delegacia.

– Smith, cuide do carcereiro! Hill, traga os cavalos…

Segundos depois.

– Hei… que está acontecendo? É você Morriso… humpf…

O carcereiro não completou a pergunta. O punhal frio de Smith o calou para sempre. Ao mesmo tempo do lado de fora:

– Hei Tom, amarre as cordas nas barras, vamos arrancá-la!

Nesse ínterim, no saloon, a partida de vida e morte estava no auge da excitação para os espectadores. Bob Matt, tenso, colocou as cartas na mesa. Era um grande jogo. Quase impossível perder. Acreditando na vitória ele saboreou cada lance. Colocou as cartas viradas no centro da mesa e foi virando uma a uma em sequência… Oito, nove, dez, valete. Tudo de espada. Parou. Fez suspense. Qualquer carta do mesmo naipe seria um Flesch. Se fosse um ‘sete’ ou uma dama seria o jogo seria ainda maior, um Street Flesch… Nem quadra ganharia do seu jogo! Lentamente virou a última carta… Dama de espada! Street Flesch! Ele havia trocado duas cartas e dentre elas não vira nenhum ‘as’. Suspeitava que o adversário, que também havia pedido duas cartas, estava com quadra de ‘as’, que seria insuficiente para derrotá-lo. Só havia dois jogos para ganhar do seu. Já pensava em como iria desfrutar da vitória. Jeff também fez cena. Colocou as cartas de bruços na frente do jogo do pistoleiro bebedor de leite e foi virando uma a uma. Começou pela dama de paus. E foi descendo. Valete, dez, nove… todas do mesmo naipe. A ultima carta poderia ser um oito de paus… e empatar! Ou um Rei de paus… e vencer a parada! Mais alguns curiosos rodearam a mesa. Jeff então virou a carta… Rei de paus!

– Vá jogar pôquer assim lá nos fundos da minha casa!  Exclamou um gorducho segurando uma gigantesca caneca de cerveja.

– Está bem. Você ganhou. Agora estamos quites. – Balbuciou Bob Matt.

– Quites!? – perguntou Jeff.

– Sim. Na hora do tiroteio na rua, mais cedo, se eu não tivesse atirado naquele barbudo, você não estaria jogando aqui agora.

– Ok. É razoável…

– Há um detalhe. Em todo o oeste, jamais alguém venceu Bob Matt no pôquer e continuou em condições de contar a outros a façanha…

– Hummm … – fez Jeff, juntando a bufunfa e guardando na algibeira interna do colete.

– Espero você amanhã, sozinho, na rua principal, ao por do sol… para decidirmos quem é o melhor… no colt! – falou Bob Matt se levantando.

– É uma questão apenas de ser o melhor ou tem algo mais? – perguntou Jeff,

– “Algo mais”… – foi a resposta pausada do pistoleiro de trajes negros, deixando o saloon.

– Carson City está importante. Dois astros do baralho e do colt resolveram fazer seu show aqui. Será um espetáculo e tanto! – comentou um dos ‘sapos’ do jogo.

– Hei barman, me vê um whisky. Hum, Morrison, não está ouvindo algo estranho para os lados da delegacia? – perguntou Jeff, correndo para a saída do saloon.

Nesse instante os últimos bandidos acabavam de montar em seus cavalos atrás da cadeia.

– Vamos logo seus molengas! O xerife vem aí. Atirem e tratem de dar no pé – disse o líder do bando que resgatou o preso.

Mais um tiroteio teve início naquele dia na história da pequenina Carson City.

– Derrubei mais um… e vai mais um para o inferno. Acabou minha munição xerife. – Informou Jeff.

– A minha também… e eles já estão fora do nosso alcance. Não adianta persegui-los. Os cavalos estão na cocheira – ponderou Morrison.

– Bolas! Só acertei quatro deles com 12 balas…

– “Só”! Você diz. Eu com seis tiros acertei apenas um!

– Movimentado o dia hoje, hein? Uma dúzia de cadáveres. Assim vamos acabar com a população do condado…

– Ontem seis e amanhã mais alguns. – Completou Morrison – quem passará apertado será o Jasper da funerária…

– … e também o coveiro! – Completou Jeff.

No dia seguinte, ao por do sol, a rua principal de Carson City ganhou um movimento além da rotina. A notícia do duelo entre o pistoleiro de trajes negros e o jovem delegado Jeff correu de boca em boca e atraiu quase todos os moradores do local. Duelos entre pistoleiros nas pequenas cidades do oeste eram comuns. Entretanto, aquele envolvia um forasteiro misterioso e um defensor da lei local, e por um motivo totalmente descabido. Jeff, embora não conhecesse as reais intenções do desafiante, sabia que não teria paz se recusasse o desafio. Embora não fugisse de confusão, ele se envolvia para restabelecer a justiça e por isso mesmo inspirava confiança na população. Ainda assim o duelo teve um grande movimento de apostas.

– Dez dólares em Bob Matt – dizia um.

– Aposto meu cavalo ferrado das quatro patas em Jeff… e dou alguns segundos de ‘lambuja’ – topou outro.

– Cinquenta pesos no delegado – desafiou o bigodudo dono da mercearia no fim da rua.

– Trinta dólares em Jeff – desafiou outro.

– Eu como meu chapéu ensopado sem farinha se Jeff vencer o pistoleiro – falou outro.

Stam o médico, um velhinho de cabelos brancos cobrindo as orelhas e calvo no cocuruto, também queria apostar.

– Aposto todas minhas economias no jovem xerife. Ele lembra o velho Hobson. De frente ninguém conseguirá abatê-lo. Hei você aí… – disse ele se dirigindo a um jovem barbudo e sem bigodes de chapéu coco – … em quem você aposta?

– Em ninguém doutor. Estou mais liso que sua careca. Mas como meu chapéu se o xerife sobreviver.

– Decidido hein, rapaz? Vá preparando o sal e a pimenta, pois você vai comê-lo. Caso contrário eu lhe darei 50 dólares.

A hora fatídica se aproximava. O sol dolente, como que querendo prorrogar o embate, ou preservar uma vida humana, descia lentamente no horizonte. Os dois homens tomaram seus lugares, cerca de quarenta metros um do outro. Jeff estava de frente para os raios vermelhos do sol que se deitava no final da pradaria, o que lhe turvava um pouco a visão, mas ele não se incomodava. Não estava acostumado a duelos, no entanto, confiava em sua própria agilidade e sabia que tinha que sobreviver a qualquer custo. Repentinamente um forte vendaval irrompeu nas ruas de Carson City levantando poeira e fazendo muita gente segurar os chapéus. Era um aviso de que a morte viera buscar um dos dois. Jeff e Bob permaneceram imóveis, atentos. Lentamente seus dedos desceram e desabotoaram os coldres. Os olhos de um fixados nos olhos e nos dedos do outro e vice versa. De repente, sem que as pessoas que também estavam atentas pudessem distinguir os movimentos de um e de outro, soaram dois disparos, que mais pareceram tiros de canhão. O vento, tão bruscamente quanto surgira, se foi, como se fosse a morte que após fazer sua vitima, vai embora deixando no chão um corpo sem vida, com um buraco na testa, o revolver com uma cápsula deflagrada caído do lado. Assim estava Bob Matt, o pistoleiro de trajes negros, bebedor de leite… jogador – quase – imbatível de pôquer… que não conhecia derrota. Na verdade, morrer baleado de frente, por outro homem mais rápido do que ele, sempre fora seu objetivo.

Jeff recolocou lentamente o colt no coldre, inclinou-se, apanhou seu chapéu no chão, sacudiu a poeira e constatou: havia mais um furo na copa do chapéu! Com o dedo no pequeno orifício feito à bala, se dirigiu à delegacia comentando:

– O sujeito que inventou a copa do chapéu tão alta merece um prêmio!

As pessoas que assistiram a tudo aquilo. Agora silenciosamente pagavam suas apostas.

Jeff tinha um senso cômico bem limitado. Nunca ria dos seus gracejos ou de outras piadas. Porém, a cena que presenciou à caminho da delegacia o fez dar uma boa gargalhada. Na frente do velho medico estava o turco barbudo sem bigode mascando seu velho e encardido chapéu de couro enquanto o velhinho calvo grisalho dizia:

– Quer mais pimenta? Ou um pouquinho de sal? Comida sem sal enfraquece…

 

 

*** A aventura de Jeff, o homem do chapéu furado em Carson City, continua na próxima quinta-feira, 03.

 

 

Jeff… O Homem do Chapéu Furado

     Essa história de Caubói foi escrita na década de 1970, no auge da exibição de filmes do gênero nos cinemas de Pouso Alegre.

    Escrevi “Jeff, o homem do chapéu furado”, em um caderninho espiral no mês de julho de 77, durante meus turnos de sentinela nas guaritas do 14º GAC, quando servia o exército naquele ano. A intenção era publicar em “bolsilivro”, outra febre nas bancas de jornais e revistas naquela década.

    Agora os apaixonados por histórias de Caubói, caso queiram, poderão ler gratuitamente a história do forasteiro. “Jeff, o homem do chapéu furado” será publicada em onze capítulos, no blog e na minha página no face.

    Boa viagem à década de 1870!

                                                                      CAPÍTULO VII

 

O saloon como sempre estava movimentado. Gente que entrava, que saía, bailarinas tentando ganhar a vida, bêbados, jogadores… A um certo momento a portinhola de vaivém rangeu e parou. Muitos dos que estavam ali olharam na direção da entrada e viram entre a portinhola um sujeito alto, trajado inteiramente de preto, chapéu ornando baixado sob o rosto. Depois de chamar a atenção para sua figura o forasteiro caminhou lentamente para o balcão.

– Leite – disse com voz seca e grave.

– Leite!!! – exclamou o barman.

O sujeito não disse nada. Apenas fixou o olhar no rapaz fazendo-o entender que era aquilo mesmo que ele tinha ouvido.

– Ok, aqui está.

O forasteiro pegou o copo, virou-o de um só gole, fez sinal ao barman para colocar mais. Após ser novamente servido, apanhou o copo, virou de costas para o balcão e começou a ingerir lentamente o líquido branco.

– Chiii… sinto cheiro de barulho! –  Comentou um dos presentes.

Depois de se satisfazer da bebida o sujeito se dirigiu a uma mesa onde havia quatro jogadores e sem dizer uma palavra puxou a cadeira de um deles para trás, arremessando seu ocupante de costas ao chão. Soltando uma praga qualquer, o jogador mal se pôs de pé levou a mão ao coldre e sacou sua arma. Sacou, mas não chegou a apertar o gatilho. Num movimento quase imperceptível aos olhos o pistoleiro de negro sacou seu colt e o fulminou com dois balaços no peito. Lentamente e ainda sem dizer uma palavra o sujeito apanhou a cadeira no chão, sentou-se à mesa, tirou da algibeira um charuto, encostou no cano do revólver, apertou o gatilho e acendeu o charuto no cano do colt. Em seguida colocou a arma sobre a mesa  e falou:

– Meu colt entra na parada valendo trinta dólares!

Ninguém retrucou.

Sob o olhar apreensivo dos demais jogadores, o sujeito juntou metodicamente as cartas, embaralhou com a perícia de um profissional e as distribuiu aos quatro. Todos os olhares se voltaram para a mesa do forasteiro. Silencio total. O ‘mão’ abriu o jogo:

– Trinca de reis… – disse ele mostrando as cartas na mesa.

– Dois pares – disse o segundo.

– Sequência até valete… – disse o terceiro estendendo o braço para recolher o montante da aposta. Com um gesto curto o pistoleiro deixou cair lentamente suas cartas sobre a mão deste, que as olhou estupefato!

– Quadra de damas!!!

– Parece que meu colt não gosta de estranhos – falou o sujeito com sarcasmo, recolhendo o revólver e o punhado de dólares amassados.

A partir de então o jogo continuou sem sobressaltos. O forasteiro pediu mais um copo de leite e continuou jogando. A cada rodada esticava o braço e recolhia um punhado de cédulas e moedas. Em cerca de meia hora de pôquer já estava com as algibeiras abarrotadas. As vitórias seguidas do pistoleiro voltaram a atrair a atenção dos presentes. Na mesa em questão os parceiros estavam tensos. Um deles não tinha mais o que apostar. Em dado momento o forasteiro de preto falou em tom sarcástico:

– Desculpe senhores. Minha mãe me ensinou que nunca se deve encher muitos os bolsos… e os meus já estão abarrotados. Além do mais, percebo que estão ficando lisos… Até a próxima. – Disse e se levantou lentamente para ir ao balcão.

– Espere… Você não pode se levantar agora! O jogo ainda não acabou!

– Vendam seus pertences e voltem aqui amanhã que eu lhes darei a forra! – Retrucou dando-lhes as costas.

– Trapaceiro de uma figa! – exclamou um dos perdedores, ao mesmo tempo que se levantavam sacando suas armas.

Num gesto ligeiro o pistoleiro virou-se para os três, já de arma em punho e abriu fogo contra o trio alvejando-os no peito. Nenhum deles chegou a puxar o gatilho. Na mesa ao lado havia dois sujeitos que estiveram o tempo todo observando os movimentos do pistoleiro e sacaram também as armas. Um deles conseguiu arrancar o chapéu da cabeça do bebedor de leite, mas foi liquidado por um projétil certeiro. O sujeito de preto pressionou o gatilho novamente, mas só ouviu o clic do cão… estava sem munição. Atirou-se imediatamente ao chão no justo instante que uma bala passou zunindo ao seu ouvido indo estilhaçar uma garrafa sobre uma mesa ao lado. Ainda no chão o pistoleiro arremessou um reluzente punhal que foi se cravar no peito do atirador, fazendo a próxima bala do seu revolver se perder no teto do saloon.

– É uma pena! Amanhã terei que procurar outros patos para depenar – disse o pistoleiro atirando algumas moedas sobre o balcão ao deixar o saloon.

Mais tarde.

– Já providenciou para que os cadáveres sejam enterrados, Jeff?

– Sim, Morrison, o agente funerário já se encarregou disso.

– O que você soube sobre o tiroteio?

– A rotina de sempre. Aventureiros e jogo de pôquer. O perdedor acusa o ganhador de trapaceiro, tenta sacar a pistola, o mais rápido leva a melhor. Tudo acaba com um túmulo sem flores no cemitério. Segundo Pat, que assistiu a tudo, o pistoleiro é muito provocador, mas todos que morreram sacaram primeiro… ou tentaram sacar!

– E quanto ao bezerrão? Sabe se deixou a cidade?

– Estava na varanda do hotel ainda há pouco tomando sol. Pelo jeito não tem pressa em deixar a cidade.

– Hum… mau agouro. Certamente teremos mais barulho. É melhor avisá-lo para evitar encrencas por aqui, Jeff.

O barulho começaria muito mais cedo do que previa Morrison. Quando Jeff saiu à rua para procurar o jogador de pôquer, percebeu que estava numa caixa de marimbondos. Ao menor descuido seu seria picado por balas vindas de todas as direções. Dando uma discreta olhada a sua volta, o delegado constatou que estava no centro de uma arapuca armada. Havia vários bandidos tocaiados nos prédios vizinhos, prontos para deixá-lo igual uma peneira.

– Parece que Morrison vai ficar sem ajudante… a menos que… – pensou Jeff.

Pensou e agiu. O jovem delegado não tinha tempo a perder. Tão rápido quanto um relâmpago sacou um dos colts e liquidou o bandido que estava no telhado da barbearia à sua frente no mesmo instante em que mergulhava no chão poeirento de Carson City, desviando dos projéteis que procuravam o alvo. Girando tal qual uma bola o rapaz rolou até a escada da barbearia, de um salto se pôs de pé e entrou na mesma seguido de uma saraivada de balas que se cravou na madeira seca do prédio.

– Olá Spencer. Desculpe a entrada sem agendar… – gracejou Jeff.

Mas não foi o barbeiro quem lhe respondeu.

– Ora, não há o que se desculpar. Na verdade, eu estava te esperando! Solte a arma para morrer como um paspalho que você é! – Berrou um dos pistoleiros que previamente se alojara na barbearia do esguio Ted Spencer.

Jeff estava a dois passos do facínora sentado na cadeira com o revolver apontado para ele. Precisava pensar rápido, muito rápido. E pensou. Fez um leve aceno acompanhado de um piscar de olhos em direção à janela lateral, como se acenasse para um possível salvador. O bandido caiu. Olhou para a janela, se distraindo por um segundo. Foi o suficiente para o captado, com um violento chute desarmar seu captor.

– Você é um idiota mesmo. Caiu no mais velho dos truques. Agora saia correndo lá fora – ordenou Jeff depois de tomar-lhe a arma.

– Espere. Eles pensarão que é você e me fuzilarão! – argumentou o bandido.

– E daí? Você apenas ficará mais pesado com o chumbo. Vamos! – Ordenou.

Antes que o pistoleiro pudesse se recompor Jeff o empurrou com o bico da bota para fora da barbearia de onde ele saiu cambaleando e gritando:

– Esperem, sou euuu … –

Não terminou a frase. Estatelou-se no tablado defronte a barbearia, já sem vida. Foi imediatamente crivado de balas, o que possibilitou a Jeff e ao xerife Morrison – que as estas alturas, atraído pelos disparos entrara no tiroteio -, localizá-los e alvejá-los. De imediato Jeff acertou dois e Morrison três. Em seguida Jeff mudou de posto, atravessou a rua correndo em ziguezague e foi se posicionar no armazém, de onde tinha melhor visão do inimigo. Os disparos cessaram momentaneamente. De vez em quando se ouvia alguns assovios dos bandidos tentando se localizar uns aos outros, todos furtivos. O pistoleiro bebedor de leite da noite anterior continuava sentado na varanda do hotel, com o chapéu cobrindo parcialmente o rosto, parecendo alheio a tudo à sua volta. Jeff achou um cavalo de um dos bandidos e teve uma ideia:

– Sinto muito cavalinho… Você não tem culpa se o seu dono é um coiote, mas vai ter que pagar o pato. Vamos, não fique triste. Se você morrer eu prometo liquidar cinco coiotes desses aí pra compensar seu sacrifício – falou o delegado batendo na anca do animal para afugentá-lo. O cavalo, sem entender nada, saiu em disparada à rua principal. Ao surgir do beco ao lado do armazém atraiu a atenção dos bandidos que o alvejaram pensando ser Jeff tentando fugir. Ao fazerem isso se expuseram ao fogo deste que, seguindo o planejado, sem se expor, liquidou um a um.

– Um, dois, … mais um telhado… Parece que Morrison também não gosta de coiotes pois a cada disparo seu ouço um ‘aiii’. O inocente cavalo deve estar morto do outro lado da rua e conforme meu prometido devo ainda liquidar mais dois desses assassinos. Agora restam poucos – concluiu o delegado.

Jeff se ocultou sorrateiro nos becos protegido pelas paredes e marquises e chegou até a varanda do saloon onde estava um dos bandidos tentando localizá-lo. Sorrateiramente se aproximou do barbudo e o derrubou com uma coronhada do colt na nuca. Com cautela se aproximou da extremidade da varanda e percebeu a aba do chapéu de outro bandido à espreita. Cautelosamente agarrou o barbudo ainda sem sentidos e o atirou na rua. O que estava à espreita ‘deu as caras’ e foi alvejado, conforme o esperado.

– Quatro! Falta um, cavalinho… – murmurou Jeff para si mesmo.

Jeff resolveu se juntar ao chefe. Recarregou seus colts e atravessou a rua correndo até chegar à Delegacia.

– Praticando tiro ao alvo, hein Morrison!

– De vez em quando é bom para tirar a ferrugem dos trabucos – respondeu o xerife. Quem são eles?

– Não sei. Ainda não tive tempo de ver suas caras… Hei, estão tentando fugir! – concluiu Jeff ao ouvir um tropel de cavalos – Dê-me um rifle. Como os quer? Vivos ou mortos?

– Precisamos de ao menos um deles vivo – respondeu Morrison.

Jeff rapidamente saltou para a rua de onde tinha melhor visão, fez pontaria mas… quando ia puxar o gatilho seu chapéu foi arrancado da cabeça por uma bala vinda da retaguarda! Ele se virou a tempo de ver o barbudo que ele havia jogado desacordado no beco do saloon ser alvejado pelo jogador da noite anterior. O ‘bezerrão’ soprou lentamente a fumaça do cano do colt, desceu-o ao coldre e tornou a cobrir o rosto com o chapéu.

– Até que não é um mau sujeito – disse Morrison se referindo ao pistoleiro que alvejara o barbudo traiçoeiro antes que ele atirasse outra vez nas costas do seu auxiliar.

– Hummm… os três conseguiram escapar.

– Deixe-os. Quem quer que sejam, a maior parte do bando está liquidada.

– Sim. Mas devo um coiote ao cavalo.

– Como é?…

– Ao forçar o cavalo a sair em disparada no meio do fogo cruzado eu prometi liquidar cinco bandidos caso ele fosse alvejado.

– Então você deve pagar. A vida de um cavalo vale muito mais do que cinco desses coiotes – respondeu o xerife com naturalidade.

– Concordo. E vou pagar com juros…

 

*** A aventura de Jeff, o homem do chapéu furado em Carson City, continua na próxima segunda-feira, 31.

Jeff… O Homem do Chapéu Furado

CAPÍTULO  VI

Àquela hora do dia havia poucas pessoas no saloon.

– Olá James… Me vê uma cerveja.

– Onde estavam aqueles homens xerife?

– A norte daqui, numa pedreira. Havia um esconderijo…

– Pedreira a norte? Deixe-me lembrar quem foi que falou sobre uma pedreira neste lugar. Ah, sim… foi Hobson, no dia em que foi morto pelas costas aqui no saloon.

Ao ouvir o comentário Jeff Rogers estremeceu. Procurando disfarçar o mal-estar, perguntou:

– Há quanto tempo você está na cidade?

– Há pouco mais de seis anos.

– Quem foi esse tal de Hobson que você falou? Quem era esse tal de “Caveira”?

– Mike “caveira” foi um bandido violento e sanguinário. Ele tinha esse nome por ser muito parecido com uma caveira. Dizem que ele veio do Texas aterrorizando todos que encontrava. Ele veio aqui em Carson, matou o filho do dono do estábulo e seu tio, em seguida assaltou o banco e matou três caixas e o auxiliar do xerife e fugiu. Rock Hobson era o xerife na cidade há pouco tempo e muito respeitado por todos. O xerife perseguiu Caveira e seu bando e antes que eles conseguissem sair da região, trouxe todos de volta.  Quatro vieram amarrados nos cavalos… mortos! Os outros, inclusive Mike Caveira, passaram uns dias no ‘hotel’ do xerife até serem levados para a penitenciaria. Durante o tempo em que Rock Hobson exerceu o cargo de xerife aqui, esta cidadezinha manteve-se ‘limpa’ dos bandidos.

– Como foi que o xerife Hobson morreu?

– Ultimamente uma onda de assaltos a diligências, assassinatos e terror assolava a região. Ele estava investigando sobre isso. Um dia ele saiu de manhã e só retornou ao cair da noite… Passou por aqui e ficou até mais tarde. Foi aí nesse ínterim que ele me disse…

– Disse o que? – quis saber Jeff, mal contendo a emoção.

– “James, acho que descobri todos os abutres da região num só ninho! Eles cometem os crimes e vão se esconder numa pedreira não muito longe daqui. Por isso sabem de tudo que interessa na região e surgem de repente e desaparecem após o crime. Amanhã voltarei ao esconderijo da pedreira com uma patrulha”. Essas foram suas palavras. – Narrou James.

Jeff continuou calado, esperando ouvir mais. James continuou:

– Nessa mesma noite alguns bêbados, ou fingindo de bêbados, começaram uma briga no saloon. Hobson tentou contê-los, mas não conseguiu evitar a balburdia. Em pouco tempo a briga se generalizou. O velho xerife, apesar de cansado, levava vantagem até que, partindo daquela janela, alguém descarregou um colt nas suas costas.

– Quem atirou?

– O assassino nunca foi encontrado. Mas qual é seu interesse em saber tudo isso? – interpelou o garçom.

– Por nada, nada… Mas meu… quero dizer, o xerife Hobson precisa ser justiçado – acudiu Jeff.

– Você dizia meu…?

– É…  – Embaraçou-se Jeff antes de corrigir. Seria meu superior se vivesse agora, não?

– Ah sim, claro.

– Agora me vê um whisky duplo.

– Está na mão – disse James segundos depois.

Mais tarde.

Jeff, numa cadeira de balanço, tirava um leve cochilo na varanda da delegacia quando foi despertado por uma suave voz feminina.

– Olá xerife.

– Oh, hein… Olá, boa tarde. Você deve ser a filha do banqueiro. É linda. O xerife Morrison merece uma surra por não tê-la me apresentado.

– Oh… Além de um terrível delegado você é muito galante com as palavras.

– Ora, quem não for galante diante de tal beleza, merece a forca!

– Continua galanteando! Você é mesmo terrível. Está uma bela tarde para um passeio. Pena que eu esteja sozinha e você não pode deixar seu posto – disse a jovem com sensualidade.

– Não seja por isso. Agora temos carcereiro – retrucou Jeff, subindo na charrete e tomando as rédeas das mãos da bela jovem. Aonde você quer ir? – perguntou.

– A leste daqui tem um pequeno bosque. Que tal?

– Ok. Por mim está ótimo. Você deve ter um namorado certamente. Ele não se importa que eu te faça companhia?

– Ele não precisa saber. E nós estamos brigados – respondeu Doris desabrochando um sorriso dengoso.

Pouco depois chegaram ao lugar mencionado pela jovem.

– É um lugar muito romântico – disse Jeff, prendendo as rédeas do cavalo em um arbusto.

– Há quem diga isso. Especialmente Richard, meu … ex-noivo. Ele costumava me trazer aqui de vez em quando.

Jeff, embora estivesse intrigado com o convite de Doris, pois sabia que ela era namorada de Richard, ao ouvir seu nome teve um sobressalto. O que ela estaria pretendendo? Mas já era tarde. De trás de um arbusto ouviu-se uma voz.

– Não se mova xerife!

Simultaneamente à voz ameaçadora, surgiram seis pistoleiros mascarados, de armas em punho.

– Parece que desta vez lhe cortaram as asas, não é mesmo xerife? Nada melhor do que uma linda mulher para atrair um trouxa a uma cilada, não acha?  Desarme-o! disse o que parecia ser o líder do grupo.

Jeff, que no íntimo já esperava por algo parecido, deixou que o encapuzado falasse, a fim de ganhar tempo. De repente, num movimento tão rápido quanto um piscar de olhos, fez de Doris seu escudo enquanto sacava seu colt:

– Muito bem rapazes. Afastem-se se não querem ver os miolos desta linda cabecinha explodir em pedacinhos!

– Ora xerife… não creio que você, um correto defensor da lei, faça mesmo isso. Seria assassinato à sangue frio.

– A ela poder ser. Mas vocês estão na minha frente de armas em punho… o que me diz?

– Continuo duvidando – desafiou o sarcástico pistoleiro.

Os dedos firmes do jovem agente da lei apertaram o gatilho. O projétil  atingiu o revolver na mão do desafiante fazendo-o urrar de dor. A segunda acertou-lhe o cinturão arrancando-o da cintura.

– Então hienas? Ainda duvidam?

– Você venceu desta vez forasteiro. Mas ainda me pagará… com juros.- Falou o pistoleiro.

– Já que é assim, para que o juro cresça um pouco mais, joguem suas armas no chão e desapareçam… A pé! – gritou Jeff.

Imediatamente, mordendo os lábios de raiva, os pistoleiros deixaram os cinturões caírem ao chão e se afastaram praguejando.

– Eu disse todos! – gritou Jeff, disparando seu colt na direção de uma pequena moita de arbusto da qual saiu um sétimo pistoleiro gritando e segurando a bolsa escrotal, inutilizada.

Jeff pôs-se a rir enquanto observava os frustrados bandidos desaparecerem numa curva da trilha, esquecendo-se de Doris. Quando se virou:

– Bravo Jeff, bravo! Muito inteligente… Você os fez de tolos, ridículos… como fez com o Richard. Mas comigo será diferente. Como você é um bravo, eu vou lhe dar a chance de fazer seu último pedido – disse a jovem filha do banqueiro, apontando uma pistola para o destemido delegado.

– Ora, último pedido é para quem está à beira da morte… – gracejou Jeff tranquilo.

– E o que você acha que vai lhe acontecer daqui alguns segundos?

– No máximo terei que dar algumas palmadas nesse seu belo traseiro… – disse Jeff aparentando ignorar a pequena pistola que a moça apontava para ele, e desafiou:

– Apesar de ter bastante veneno, você não seria capaz de alvejar nem a parede de um celeiro.

– Além de tudo, você é também bastante presunçoso, Jeff – disse Doris corada mais de medo do que de coragem.

Jeff estava atento aos mínimos movimentos da moça, um olho no dedo delicado dela e outro nos seus olhos, no crispar do seu belo rosto suado. Quando ela finalmente conseguiu apertar de todo o gatilho da arma, ele já não estava no mesmo lugar. Dera um passo à direita o suficiente para fugir do alvo de Doris. Em seguida avançou decidido em sua direção e tomou a pistola da sua mão.

– Reconheço que me enganei quanto à sua pontaria. Quase faz mais um buraco no meu chapéu.

– O que vai fazer comigo? Vai me fazer passar por um vexame na cidade, me pondo atrás das grades?

Ora garota, acalme-se. Não costumo levar mulheres bonitas à sério. Faça de conta que estivemos ensaiando uma peça teatral, ok. Suba. Tem gente demais nesse pic-nic! Vamos embora.

Chegando à cidade Jeff relatou ao chefe a emboscada na qual quase caíra.

– O que você acha disso tudo Morrison? Qual o motivo dessa armadilha armada por uma mulher, filha do maior banqueiro da região.

– Eu acho que ela fez isso para vingar o vexame sofrido pelo noivo…

– Mas onde ela encontrou tantos bandidos, ela, uma moça?

– Ora, na cidade e nos arredores há muitos bandidos que fariam qualquer coisa por um punhado de dólares.

– Pode ser. Mas não me convence. Acho que esse negócio de vingança, ridículo e tudo o mais é apenas um pretexto. Eles querem mesmo é me liquidar antes que eu coloque todos eles atrás das grades.

– Eles quem?

– Todos os bandoleiros que rondam Carson City. Acho que todos eles trabalham para o mesmo patrão: George e Brad.

– É possível. O que pretende fazer?

– No momento o que eu quero é molhar a garganta no saloon do James. Vamos?

 

*** A aventura de Jeff, o homem do chapéu furado em Carson City, continua na próxima quinta-feira, 20.

Jeff… O Homem do Chapéu Furado

CAPÍTULO  V

À noite os dois agentes da lei continuaram o jogo interrompido no saloon, em meio ao comentário dos presentes. Ao lado deles havia quatro homens que haviam abusado propositalmente do whisky… estavam prontos para arrumar encrencas.

– O delegado é um fanfarrão – dizia um deles.

– Sim… ele fez aquilo para aparecer.

– Hei xerife… Por que não faz a nós o que fez a Richard? Por que não tenta, hein?

As atenções se voltaram para eles.

– Sim, por que não tenta fazer? – dizia outro provocador. É porque você é um covarde! Gosta de duelar com almofadinhas, mas tem medo de homens! – disse um terceiro apoiando a mão direita no cabo do trabuco.

Sem tirar os olhos das cartas e sem, contudo, deixar de vigiar o ambiente à sua volta, Jeff comentou:

– Morrison, vamos ter encrenca…

– Sim rapaz, esteja atento – respondeu Morrison olhando por cima das cartas.

– E então… Por que não responde xerife? – gritou o que parecia mais embebido em álcool, enquanto empinava a mesa em que estavam os dois homens da lei.

Jeff, calado, recolheu as moedas que caíram com a mesa, dirigiu-se lentamente ao autor da cena, fez o sinal de uma cruz diante do seu rosto e de repente deu-lhe um potente soco achatando seu nariz. A inesperada atitude do delegado deu início a mais uma típica briga de saloon. Desta vez o ator principal era Jeff Rogers.

No saloon havia fanfarrões, bêbados, pistoleiros, aventureiros de todo tipo… Havia os que estavam contra Jeff, mas havia também os que estavam a favor dos homens da lei. Por isso todos entraram na briga. Até quem estava neutro na questão, para não apanhar sozinho, retribuía socos e pontapés.

Enquanto o Saloon era palco de uma selvageria brutal, três vultos silenciosos se aproximavam da delegacia. Ainda em silencio arrombaram a porta e dois deles entraram enquanto o terceiro cuidava dos cavalos.

– Quem está aí? Que diabos está acontecendo? – Indagou Smith de trás das grades da cela.

– Cale essa boca. Viemos libertá-lo.

– Oh… vocês…

– Afaste-se… – disse o bandido amarrando uma banana de dinamite na tranca da cela e acendendo o rastilho.

Em poucos segundos o cadeado da cela voou e se perdeu num canto qualquer do recinto. A explosão foi abafada pelo som dos socos, pontapés e gritos emitidos no saloon, conforme o planejado. No minuto seguinte quatro vultos esgueiraram por uma rua lateral, escura, empreenderam um galope e deixaram Carson City para trás.

No saloon a luta prosseguia animada. Um sujeito forte conseguiu agarrar Morrison de costas para uma coluna de madeira no meio do recinto. Morrison fingiu fraquejar, mas quando outro sujeito desferiu um potente cruzado em sua direção, ele se abaixou repentinamente, desviando do golpe. O punho do agressor foi chocar-se contra o poste, arrancando do sujeito um urro se dor. Com Jeff acontecia algo semelhante. Um sujeito o agarrou pelas costas e outro se aproximou de frente disposto a lhe maltratar o fígado, mas foi recebido por um violento “coice de mula” que atingiu seu peito jogando-o de costas sobre uma das poucas mesas que ainda estavam de pé. James, o proprietário do saloon e seu sobrinho Pat, os quais serviam os clientes, simpatizavam mais com os homens da lei e não perdiam oportunidade de agredir seus rivais. Os que se apoiavam no balcão recebiam garrafadas nos crânios.

– Hei James… Aí vai uma bola pra vocês brincarem – disse Jeff atirando um barbudo por cima do balcão. James socou o barbudo em direção a seu sobrinho, que o rebateu em seguida. Depois de alguns segundos Pat gritou sorrindo:

– Hei xerife, tome de volta sua bola… agora está mais macia!

A briga generalizada prosseguiu por mais alguns minutos. Aos poucos os derrotados foram se retirando, uns arrastando a perna, outros limpando o sangue dos lábios. Henry William, o sujeito que provocara a briga, com seus comparsas iam se retirando do saloon contorcendo o corpo, quando…

– Hei, você! Está esquecendo de algo… O estrago é por sua conta – alertou Jeff.

– Ora, gringo, vá para os diabos – respondeu Henry puxando a portinhola de vaivém a fim de deixar o palco da quebradeira.

Jeff então sacou do colt e disparou na direção da portinhola, arrancando-a da mão do brigão ao mesmo tempo que sugeria:

– Não quer mudar de ideia Henry?

O pistoleiro, cego de raiva, enfiou a mão no bolso do colete, tirou vários dólares embolados, atirou sobre a única mesa que ficara de pé e virou as costas para sair.

– Espere. Eu acabei de gastar uma bala… Passe-me um dólar.

Henry olhou em volta e viu que exceto seus companheiros, sérios, todos os demais estavam com ar de chacota. Pensou em reagir, mas percebeu que Jeff ainda tinha o colt na mão. Achou melhor atender o pedido do defensor da lei. Ao atirar a moeda sobre a única mesa em pé, ouviu a gargalhada geral, mas limitou-se a lançar a clássica ameaça:

– Tornaremos a nos encontrar xerife – disse com ódio na voz e no olhar.

Ao entrar na delegacia minutos depois, os homens da lei tiveram uma surpresa.

– Que diabos! Levaram nosso primeiro hospede e nós nem o havíamos interrogado!

– Bolas… armaram a confusão no saloon de propósito, com o objetivo de nos distrair para que pudessem libertá-lo!

– Bolas digo, eu! Meu primeiro hospede não gostou do ambiente e resolveu se mandar.

– Não tem importância. Aonde vamos amanhã, se meu palpite estiver certo, traremos hospedes suficiente para encher seu hotel.

Desta vez quem estava furioso era Brad Macgree.

– Como isso foi acontecer? Como você admitiu passar por um vexame desse meu filho? – censurava indignado.

– Não sei pai. Tudo ia bem. Não sei como eles descobriram nossos homens.

Brad andava de um lado para outro da sala, diante do filho envergonhado sentado na poltrona. Entre uma baforada nervosa e outra do charuto, enquanto recriminava Richard pelo fiasco, pensava nos últimos acontecimentos desde que o forasteiro chegara à cidade. Até que falou:

– Esse delegado parece saber e antecipar nossos passos! Acho que temos um traidor no nosso grupo…

George, que ouvia a bronca e também tentava entender a sequência de desencontros, concordou.

– É possível. Aquele dia, se Jeff saiu da estrada, ele sabia que nossa equipe estava lá esperando a passagem da carroça com dinheiro para assaltá-la… E se sabia, deve ter descoberto também a trilha que leva ao esconderijo…

– Sim… E se ele percebeu alguma coisa, irá investigar – emendou Richard.

– Certamente – anuiu Brad. Essa pode ser a melhor oportunidade que temos para liquidá-lo de uma vez por todas, desde que estejamos preparados. Vamos dar-lhe uma calorosa recepção.

– Você tem razão Brad. Richard, chame o Ted… Diga a ele que vá ao esconderijo e avise o pessoal para receber ‘bem’ o forasteiro intrometido.

No dia seguinte os dois homens da lei tomaram a direção da trilha descoberta por Jeff dias antes. Após algumas milhas de cavalgada a trote lento saíram da estrada principal.

– Está vendo Morrison? Aqui está claro os rastros dos cavalos.

– Hum…

Um pouco mais adiante seguindo os rastros:

– Aqui a trilha se divide, como eu lhe disse. Façamos o seguinte: você vai pela estrada, digo pela esquerda para confirmar se dá mesmo no rancho de Brad. Eu seguirei em frente, devagar para que você possa me alcançar, ok?

– Combinado, mas tome cuidado.

– Deixe comigo.

Cerca de meia hora depois Morrison avistou ao longe o teto do ‘Rancho Barra Y’ de George e Brad. Ao confirmar suas suspeitas, reteve a mansa montaria, voltou e seguiu no encalço do seu ajudante.

Jeff percorrera poucas milhas seguindo a pista deixada pelos cavalos pela pradaria quase plana, quando avistou uma pedreira atrás de uma pequena ondulação do terreno.

– Hum… será aqui que eles se escondem? Não admira que ninguém os descubra… Quem pensaria em procurá-los aqui? – pensou Jeff. Atento o delegado continuou lentamente na direção da pedreira. O ajuntamento de rochas esbranquiçadas tinha uma estreita falha num dos lados, a qual servia de porta de entrada natural e uma grande clareira no centro. O jovem sabia estar na ‘boca do lobo’. Mas continuou avançando, cautelosamente, atento ao menor movimento à sua volta. Apesar da cautela, mas não percebeu que já havia sido notado. Por trás de uma rocha mais alta separada do ajuntamento, à direita da entrada da clareira, um sentinela fez pontaria e puxou lentamente o gatilho do seu rifle! O estampido fez voar um ou dois pássaros solitários que tentavam garimpar algum inseto nas imediações. Junto ao estampido o cavaleiro caiu ao chão duro nas cercanias da pedreira e ficou imóvel. O atirador desceu da pedra, engatilhou novamente o rifle e seguiu desconfiado na sua direção. Ao ouvir os passos da bota do atirador nos pedregulhos bem próximo, o “morto” rolou no chão duro fazendo aparecer o reluzente colt em sua mão direita… e um segundo tiro cortou o silencio da manhã. Desta vez o tiro foi disparado pelo jovem homem da lei… e foi certeiro. No instante seguinte o pistoleiro dobrou-se sobre as pernas e caiu sobre o próprio rifle, fulminado com um tiro na testa. Jeff se levantou, espanou a poeira, amarrou seu frustrado assassino em seu cavalo e o espancou em direção à pequena clareira entre as pedras. Ato seguinte verificou suas armas e correu para trás de uma rocha. Escondidos entre as pedras Ted Slim gritou para seus homens:

– Lá vem ele. O maldito abelhudo conseguiu passar por Bud. Atirem! Vamos fazer dele uma peneira!

O silencio na pradaria foi cortado por uma saraivada de balas em direção ao cavaleiro que avançava colado à montaria. Em poucos segundos seu corpo virou um queijo suíço. O cavalo também foi atingido e tombou a poucos metros da entrada do esconderijo. Imediatamente os atiradores deixaram seus postos para examinar sua presa.

– Desta vez acabamos com a raça do forasteiro… – dizia um, brandindo o rifle para o alto.

– Sim, é pena que não o pegamos vivo, caso contrário iríamos mata-lo arrancando sua pele aos poucos – dizia outro, em meio às gargalhadas. O riso sarcástico e sombrio, no entanto, durou pouco. E se transformou em espanto e silencio ao constatarem quem era o ‘queijo suíço’!

– Diabos! É o bud…

– Maldição! O miserável conseguiu nos enganar mais uma vez! Procurem-no, matem-no – berrou Ted, enlouquecido.

– Não há necessidade de procurar muito. Eu estou aqui Slim… – disse Jeff surgindo de trás de um rochedo com o rifle engatilhado.

– É ele, o demônio, atirem!

Começou mais um violento tiroteio. Jeff tinha a vantagem… Seu rifle já estava engatilho e cuspiu fogo. Antes que pudessem se abrigar, alvejou mortalmente cinco deles. Quando parou para recarregar o trabuco, uma bala arrancou-lhe o chapéu da cabeça.

– Epa! Eles não estão brincando, não. Vai com o colt mesmo – falou o xerife consigo mesmo, enquanto desfazia do rifle descarregado e sacava o colt 45. E continuou atirando até descarregar os dois colts. Quando o municiava novamente…

– Fique quieto onde está, xerife! Não quero liquidá-lo apenas com seis balas – falou um maduro pistoleiro, com sarcasmo, apontando o trabuco para Jeff.

– Calma rapaz. Chumbo faz mal ao fígado. Se eu comer chumbo agora não farei digestão no almoço – fez troça Jeff, vencido.

– Ora, deixe de piadas e vamos andando… Vamos! Hei pessoal, desta vez eu o peguei.

– Oh, então finalmente perdeu as asas hein forasteiro? – gracejou Ted.

– A vida tem seus vai e vem… Desta vez estou voltando – filosofou o jovem.

– É pena que você não poderá ‘ir’ novamente a lugar nenhum pois, depois do que faremos com você, nem os abutres irão querê-lo.

Um minuto antes Morrison havia chegado à pedreira. Ao ver o que se passava, desmontou, pegou seu rifle e foi se esconder atrás de umas rochas de frente para Jeff.

– Acho melhor acabar logo o sermão e começar a pancadaria, pois o xerife Morrison pode chegar a qualquer momento e estragar a festa – falou Jeff.

– Ora, é melhor pensar em outro truque, pois este é velho. Não acreditamos que aquele velho paspalho arrisque a pele para salvá-lo.

Escondido a poucos metros atrás da rocha, Morrison havia colocado o rifle contra o sol, para avisar da sua presença. Jeff entendeu o sinal. Olhou para o chão e notou o revólver que algum dos baleados deixara cair. Fez um pequeno aceno que somente o velho xerife entendeu. No momento em que o primeiro bandido se aproximou para começar a pancadaria, uma bala de Morrison atingiu suas costas.

– Hei, que?!… – Gritou Ted tentando entender de onde viera o tiro.

Aproveitando-se da confusão planejada Jeff lançou-se ao chão, apanhou o colt e abriu fogo contra seus captores, sendo seguido por Morrison que surgiu de traz dos rochedos ordenando com energia:

– Levantem as mãos! Quero prendê-los vivos. Estão sob minha mira. Muito bem meu rapaz, vamos desarmá-los.

– Prazer em revê-lo xerife. Se você demorasse mais um pouquinho eu viraria saco de pancadas, meu amigo.

– É por isso que ninguém os descobria, pois quem imaginaria um ninho de coiotes neste lugar. Mas agora acho que lhes cortamos as garras – disse Morrison olhando para o esconderijo incrustado entre as rochas.

– Se for como eu penso, estes são apenas os ‘filhotes’! Os chefes da matilha ainda estão à solta – observou Jeff.

–  Bom, pelo menos agora terei muitos ‘hospedes’!

– Pena que os outros preferiram o inferno ao seu ‘hotel’. Só sobraram oito – disse Jeff sarcástico, olhando para os cadáveres espalhados pelo chão.

– … Seis, sete, oito, nove… – contava Morrison.

– Tem outro atrás das pedras e outro transformado em queijo suíço um pouco adiante – concluiu Jeff. Eram dezenove ao todo.

Uma hora depois os dois homens da lei entraram em Carson City. O primeiro a avistá-los foi o barbeiro que varria a frente do seu salão e deu o alarme.

– Hei, vejam… O xerife parece que fez uma boa caçada!

Logo quase todos os habitantes do lugar saíram na rua para ver o acontecido.

– Uau… a ultima vez que vi tantos “pássaros com as asas cortadas” foi quando o xerife Hobson prendeu a quadrilha do Mike “Caveira”. – Disse o agente funerário esfregando as mãos.

– Esse tal de Jeff lembra muito o velho xerife Hobson – comentou outro.

– Agora temos vários hospedes, Morrison. Mas devemos ser bem ‘hospitaleiros’, senão eles farão o mesmo que fez Smith – observou Jeff com ironia.

– Não se preocupe. Vamos tratá-los melhor. Pra começar vamos contratar um carcereiro.

– E eu vou refrescar a garganta no saloon e aproveitar para bater um papo com James.

A notícia do desmantelamento da quadrilha chegou rapidamente ao Rancho Barra Y. Ao tomar conhecimento dos fatos, George dispensou diálogo e berrou furioso:

– Não interessa como! Matem Jeff!

 

*** A aventura de Jeff, o homem do chapéu furado em Carson City, continua na próxima segunda-feira,17.