Justiça cassa mandato de vereadores de Borda da Mata

                  Eles são acusados de usar combustiveis em nome da prefeitura para fazer campanha eleitoral na eleição passada.     

       Três vereadores de Borda da Mata, a ‘Capital do Pijama”, tiveram os mandatos cassados pela Justiça. Quatro suplentes também não poderão assumir os cargos deles na Câmara Municipal. Perderam os cargos os vereadores Vivalde Raimundo da Silva (PT), Benedito Delfino de Mira (PMDB) e Luiz Carlos Pinheiro (PMDB).

       Segundo as investigações do Ministério Público, eles são acusados de usar combustível pago pela prefeitura para fazer campanha eleitoral em 2008. As denúncias também envolvem o ex-prefeito do município, Benedito Cobra Filho. A investigação foi comandada pela promotora de justiça, Maria Regina Capelle, que estava à frente do caso desde 2008.

        Segundo as investigações, por intermédio do então prefeito de Borda da Mata, sete candidatos ao cargo de vereador abasteciam os carros usados nas campanhas eleitorais em um posto de combustíveis, com o dinheiro da prefeitura. Nas notas fiscais emitidas pelo posto e apreendidas, uma sigla foi a peça chave para a abertura do processo. As letras “P” e “M”, que significariam “Prefeitura Municipal”. Segundo o MP, pelo menos R$ 30 mil foram desviados.

       O Ministério Público deve agora entrar com uma ação penal pedindo a prisão de todos os envolvidos, inclusive o ex-prefeito. Benedito “Cobrinha” Filho afirma que não há provas de que o abastecimento de carros de candidatos e eleitores era feito via prefeitura.

        A cassaçao do mandato dos tres vereadores aconteceu graças à denuncia de cidadãos que não aceitam mais o desvio ou mal uso do dinheiro publico. O caso da ‘terra do pijama’ é apenas uma ‘casquinha’ do iceberg de corrupção que assola o país, iceberg este que se derretido e usado em investimentos na educação, saude, segurança… faria do Brasil um país bem mais justo e melhor para se viver. 

        Exemplos de combate à corrupçao e desvio de dinheiro publico como o de Borda da Mata precisam acontecer mais em todos os rincões do nosso Brasil varonil. Faça sua parte… “Proteste contra a  CORRUPÇAO”.

Secretaria de Defesa Social manda soltar meliantes por falta de delegados para autua-los

      Se perguntarmos ao cidadão mortal comum, aquele que paga impostos para ter segurança, saúde, educação, etc…, qual o principal motivo do crescente aumento da criminalidade, 9 em cada 10 responderão; a impunidade. E a impunidade tem varias faces. O meliante fica impune devido a benevolência e frouxidão das leis, por inoperância e ineficácia do trabalho de prevenção da policia, por falta de policiais para prendê-lo, por falta de presídios onde hospedá-lo, sem falar, é claro dos motivos muito especiais inerentes aos ‘mortais incomuns’ que colocamos em Brasília.   

      Muito bem, como se não bastasse esta renca de motivos para os mortais comuns rirem da nossa cara, o governo de Minas criou mais um. Agora todo ‘cidadão infrator’ que for pego em flagrante cometendo crime cuja pena não ultrapasse 4 anos de detenção, poderá ser colocado em liberdade pelo policial que o prendeu. Basta intimá-lo para comparecer na delegacia de policia no primeiro dia útil para sentar-se ao piano.

       Porque chegamos a este ponto de afrouxar ainda mais a lei? Por falta de delegados nas delegacias de Comarcas para ratificar a prisão do meliante no período noturno e finais de semana. Vamos trocar em miúdos; Há mais de trinta anos a policia civil vem se debatendo contra a desvalorização da categoria e distorções salariais. Lutando basicamente para ganhar um salário equivalente ao do promotor de justiça. Nada mais justo, pois ambos, embora em poderes diferentes, são fiscais da lei. A tarefa do delegado é muito mais árdua, pois enfrenta o touro bufando, à unha, nas delegacias, nas ruas, nos velhos Aterrados da vida, sem saber de onde virá o tiro. O zeloso promotor de justiça espera sentadinho em seu gabinete, o meliante com cara de santo, cheirando a sabão de coco, com sua melhor roupa, de braços dados com a cara-metade para mostrar que é pai de família, chamando-o de excelência. … E recebe o triplo do seu salário no fim do mês. Os requisitos para ingressar na carreira? São praticamente os mesmos, mas as provas para delegados são tão ou mais difíceis. Não obstante esta discrepância salarial e de valores, os delegados continuaram trabalhando nos últimos trinta anos…. cerca de 60, 90, 120 e alguns até 168 horas por semana, ou seja, de segunda a domingo, sem ganhar um centavo a mais por isso. Encheu. Não dá mais. A classe dos manjuras, escudada na Constituição Federal, decidiu andar na lei. Desde abril ultimo os delegados de Minas estão trabalhando 40 horas por semana. Como o Estado possui quase 900 municípios e menos de 800 delegados de policia – quase metade está na capital – foi criado o Plantão Regionalizado. Desde então o charmoso e chato Plantão de Policia, com delegado, escrivão, detetive e alguns bate-paus, virou artigo de luxo… só nas 58 delegacias regionais do interior. Quais as conseqüências praticas disso? Simples. Se um gatuno sorrateiro passar a mão leve numa motoca lá na pequenina Munhoz, ele terá que subir e descer a serra, passando por Bueno Brandão, Inconfidentes e Borda da Mata para sentar-se ao piano do delegado de plantão em Pouso Alegre.Viagenzinha atoa, de pouco mais de 80 quilômetros. Se João Ratão for pego com o trezoitão na cinta, rondando um posto de gasolina na calada da noite na fronteiriça Itacarambi, nas barbas do velho Chico, com um pé na Bahia, aí a coisa se complica um pouco mais. Serão cerca de 280 quilômetros até a regional de Montes Claros para assinar o 14 da 10.826. Detalhe. Muitas destas cidades possuem apenas uma viatura policial e meia dúzia de PMs… Enquanto eles viajam para ratificar a prisão do meliante, a cidade fica sem viatura e sem policia, “por conta do Abreu”…. se ninguém cuidar, nem eu.

      O Estado tem duas opções… Contratar mais delegados de policia, ou… Mandar soltar o ‘cidadão infrator’ pego com a boca na botija. O que fez? Mandou soltar!!! Semana passada a Secretaria de Estado de Defesa Social publicou resolução mandando soltar todo meliante pego em flagrante, cujo crime prevê pena inferior a quatro anos. Além de jogar a possibilidade de punição do infrator no lixo, a medida põe em choque as policias civil e militar. Somente o delegado de policia, que é técnico em direito tem o poder para analisar a gravidade do crime e arbitrar ou não fiança e liberar o infrator. Pela Resolução da Secretaria, o cabo PM ou até o soldado mais antigo poderá soltar o meliante. Se a conjuntura não fosse trágica e obnubilada seria hilária. Imagine a cena; A PM surpreende o famigerado Filipinho na penumbra da pracinha do Jefinho, esperando o momento certo para dar o bote e assaltar – mais uma vez – o posto Zezão do meu amigo Nando. O sargento diz pra ele: “Filipinho, a delegacia da cidade está fechada, sem delegado de plantão e nós estamos sem gasolina para levar você para Pouso Alegre. Você vai assinar o B.O. e na segunda feira vai se apresentar à Delegada Stela Reis para ser indiciado em I.P.. É melhor você levar cigarro, cuecas e creme dental, pois você tem mais de uma dúzia de processos rolando na justiça. Pode ser que o juiz decrete sua preventiva e você suba para o Hotel Recanto das Margaridas…”. Alguém ai acha que o Filipinho, o Careca, o Gaguinho, o Pé-de-Pano e tantos outros notorios meliantes comparecerão na delegacia para ‘se’ processar? 

E o cidadão que paga impostos e clama por segurança….

Amelinha… aquilo sim era aborrescente de verdade

Era quase uma hora de uma madrugada fria de maio quando ela entrou pela porta que estava apenas cerrada. Gordinha, rechonchuda, longos cabelos loiros falsos, com as raízes pretas mostrando que há varias semanas nao tomava banho de tinta. Vestia uma calça jeans semi-nova, porém bastante surrada, resultado de muitos dias ininterruptos de uso e uma camiseta amarela menos usada, mas tão surrada quanto e chinelos havaianas. Trazia na mão direita uma faquinha de pão e na ponta da língua uma boa doze de fel … ou talvez pimenta.. ou simplesmente “paia”. Entrou como um furacão no saguão e ao ver que a única luz acesa era a do reservado da recepção onde eu estava, veio até mim perguntando sem parar; “Cadê a Fatinha…. hoje eu mato aquela desgraçada….Ela me bateu, hoje eu mato aquela desgraçada. Cadê ela, cadê ela?” Fatinha, a experiente detetive dos seus enfados, havia sido transferida para Pouso Alegre meses atrás e certamente, àquela hora, estava no melhor dos sonos, nos braços de Morfeu. Sonolento estava eu, que havia levantado há meia hora para receber um “menor infrator” conduzido pela PM, por ter sido abordado em via publica contrariando determinação judicial. Enquanto aguardava a chegada de um representante do Conselho Tutelar, fechei a porta e aproveitei para passar-lhe mais um dos inúteis sermões. Sem mover um músculo, além das pupilas para acompanhar os movimentos da desvairada, fiquei alguns segundos processando a cena, bolindo ‘tico & teco’ no cérebro, esperando minha deixa para intervir. O garotão negro, alto, sem desencostar do frio balcão de mármore, virou o corpo de lado e deu meio passo para trás, para a parede. Se eu não esperava tanto ódio e agitação naquele inicio de madrugada, a garota da faca não esperava tanta frieza de minha parte e nem tanta rapidez e coragem do garoto ao lado no balcão. Ao ver a garota brandindo a faca no ar, querendo a todo custo matar minha ex-colega há vinte e nove quilômetros dali, o garotão esguio esticou o braço e agarrou a munheca dela, imobilizando a faca e sua mão. Não precisei de nenhum movimento brusco para tomar-lhe a reluzente faquinha de pão de cabo de madeira. Desarmada, a garotinha continuou soltando impropérios e ameaças contra a detetive ausente e como não dizia coisa com coisa, convidei-a a se retirar. Tornei a cerrar a porta da delegacia e voltei a ‘businar’ na orelha do jovem esguio – meu corajoso auxiliar, muito mais corajoso do que um detetive “ad-hoc” com o qual trabalhei em Monte Sião. Um dia o corretíssimo delegado Watson de Pinho rolou na poeira com um meliante, caíram de um barranco de três metros de altura quebrando o pé direito e o tal ‘detetive’ não se dignou sequer a entregar-lhe o par de pulseiras de prata para prender o meliante vencido – de 17 anos. Antes de concluir o sermão, ouvi barulhos de vidros se estilhaçando do lado de fora. Ao abrir a porta deparei com a garota ‘braba’ com um pedaço de tijolo na mão quebrando a sirene e luminoso do velho golzinho 93, uma das duas viaturas pertencentes à delegacia. Desta vez tive que fazer força. Foi necessário puxa-la pelos cabelos para afastá-la da viatura e expulsá-la dali. Ela foi embora deixando para trás mais um inimigo tão odiado quanto a policial Fatinha. Mas voltou. Voltou cerca de uma hora depois. Desta vez, ao invés de faca de pão, trazia nas mãos um par de pulseiras de prata. Havia sido presa pela policia militar, quebrando as janelas do prédio do Ministério Publico à uma hora da madrugada. Seria louca? Estaria drogada? Estaria possuída pelo Chiquinho da Borda? Ou seria apenas mais uma adolescente deitando e rolando nos braços do protetor e desregulamentado ECA, querendo chamar a atenção??? Uma mera rebelde sem causa achando bonito fazer feiúra? O tempo diria…

Foi assim que conheci A.T.M.S., que chamarei apenas de  AMELINHA, aos 16 anos de fúria incontrolável.

Na manha seguinte, ao comentar com os colegas as alterações do Plantão Policial, os colegas me deram a ficha completa da ‘aborrescente’ aborrecida. Um dos colegas comentou; “… Então você foi batizado!!!”. Outro acrescentou sarcástico: “Não precisa ficar com saudades… você ainda vai vê-la muito por aqui. Ela é figurinha fácil…”. Amelinha, 16 anos, órfã de pai – vivo!!! Dizem asmas línguas – morava com a mãe, mas vivia mais na rua do que em casa. Apesar do seu jeito espalhafatoso, do seu palavreado chulo e gratuito, ela quase passava despercebida na rua; seria só mais uma adolescente mal educada. Mas nos órgãos públicos, na Delegacia de Policia, no Conselho Tutelar, no Fórum, no Ministério Publico, no hospital, ah!!!, Aí Amelinha soltava os capetas, rodava a baiana e dava show. Afrontar autoridades e seus agentes era para ela mais que uma obrigação… Ser o centro da atenção das autoridades era uma missão que ela realizava com raro prazer. A lista de seus artigos, no entanto era pobre. Apenas alguns 129 e outros 28. Ela gostava mesmo era do 140, 147 e 163. Danificar bens públicos, xingar e ameaçar agentes públicos era seu passatempo favorito. Seu estrelato no meio policial parece ter acontecido cerca de dois anos antes, por volta dos catorze anos, com a chegada da puberdade, quando ela foi infectada com o ‘vírus da adolescência’. Aí começaram as transgressões, as agressões, os xingamentos em casa, na escola e ela foi apresentada ao Conselho Tutelar. Ninguém torna-se cliente do Conselho Tutelar para fazer pic-nic. Amelinha tornou-se pernona non grata com espantosa rapidez. Aliás, pessoa indesejável e mal vista seria bondade. Antes do quinze anos Amelinha era a pessoa mais temida, era o terror dos conselheiros tutelares. Não pra menos. Não havia uma conselheira ou conselheiro que não tivesse tomado tabefes e bicudas regados a impropérios impublicáveis da pequena rechonchuda. Veículos e moveis do Conselho ela não quebrava todas as vezes não… só quando tinha vontade. Uma das kombis ela não se contentou em apenas chutar, ateou fogo. E se o leitor pensa que ela era valente somente com quem não tinha poder de policia, enganou-se. Policiais civis e militares também tinham que agüentar seu destempero físico e verbal e não raro as escassas e mal conservadas viaturas alocadas pelo Estado sofriam também avarias, com socos, bicudas e pedradas. As autoridades de Santa Rita preferiam mil vezes domar o Chiquinho da Borda. O sempre sisudo e inatingível homem da capa preta muitas vezes teve seus ouvidos feridos com suas ofensas indevidas. No prédio do promotor de justiça, o qual zelava pela integridade da pequena e indefesa cidadã, Amelinha, muitas vezes irrompia sozinha ou com sua mãe correndo atrás tentando segura-la, empurrando mesas, chutando papeis, passando por cima de atendentes e estagiarias apavoradas e invadia o gabinete do guardião do ECA, soltando fogo, cobras e lagartos pelas ventas contra policiais, enfermeiros ou conselheiros que ousaram contrariar seus desejos e direitos de adolescente.

Quando queria falar com o bom moço, nem cerca de arame eletrificado a segurava e claro, não precisava de agenda. Por isso naquela madrugada gelada de rebarba de festa de Santa Rita, depois de ser expulsa pelos cabelos da delegacia, ela invadiu o prédio do promotor e quebrou suas janelas para reclamar com ele… mesmo sabendo que àquela hora seu protetor deveria estar debaixo de sete palmos de cobertor.

Aquela costumeira – e saudosa – reunião de café da manha na cozinha da Delegacia de Policia, saboreando pão e leite da Vaca Mecânica da prefeitura de Santa Rita com café puro da Fazenda Nosso Paraizzo, foi mais prolongada que a habitual. Ali meu padrinho Jose Benicio contou-nos, entre outras façanhas, o baile que Amelinha dera no companheiro Kleber Brunhara. Ele fora designado meses antes para escoltar Amelinha e entrega-la num hospital psiquiátrico da Avenida Carandaí, na capital mineira. Todo polido – como convém a um policial – o jovem detetive estendeu o oficio de apresentação da adolescente à recepcionista do ‘nosomanicomio’ e quando virou-se para apresentá-la ela não estava mais lá. A garotinha rebelde ficara menos de vinte segundos fora do seu raio de visão e foram suficientes para ela sumir de vez de sua vista e dobrar a serra do cajuru – ou seria do curral? Ou de Itaguara? – na capital mineira. Um dos colegas concluiu a narrativa do Benicio dizendo; “Amelinha chegou à Santa Rita primeiro que o Kleber”. Exagero talvez, mas o que dissera o outro colega sobre ‘saudade’ estava coberto de razão. Quinze dias depois Amelinha veio fazer-me outra visita. Chegou na virada da noite, conduzida pela PM e antes mesmo de redigido o B.O. de quebradeira e perturbação do sossego, a kombi azul do Conselho Tutelar chegou com duas conselheiras para conduzir a menina-problema para o aconchego do seu lar. Esperei pacientemente os policiais redigirem…

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A verdadeira historia do “Beco do Crime”

Nos dias atuais, se fossemos dar nome a cada rua onde ocorreu um crime violento, de repercussão social, certamente sobrariam poucas ruas na cidade para homenagear feitos e figuras relevantes da nossa terra. A média de homicídio em Pouso Alegre estacionou já há algum tempo perto dos 15 ao ano. Mas já tivemos anos mais violentos. O século XXI na verdade começou assustador. Em 2001, entre latrocínios, suicídios e homicídios, começando com roubo de taxista, passando por acertos de contas entre bandidos no velho Aterrado e desacerto por causa de drogas e liderança no velho hotel da Silvestre Ferraz, 29 pessoas voltaram mais cedo para os braços do Criador … Ou pelos menos para o limbo cavernoso do Umbral.

Um crime, no entanto deu nome, ou pelos menos apelido a uma pequena via e a tornou referencia para quem busca se localizar no centro da cidade. “O Beco do Crime”. No velho Aterrado, onde acontece atualmente metade dos homicídios da cidade, certamente ninguém se lembra da esquina da cerca de taquara e da poça de lama onde os irmãos Reanir de Lima mataram o policial Marcos Alves da Silva em novembro de 1983, usando a própria arma do policial que os perseguia. Poucos também se lembrarão do boteco na porta do qual, no mesmo bairro, três jovens meliantes – Flavio Cagão, André Cabinho e Elton Mateus se mataram por motivos passionais e vingança há seis anos e tiveram seus corpos vilipendiados pelos parentes de Elton. O assassinato traiçoeiro e brutal do detetive Marcos Paixão há sete anos, chocou a cidade e comoveu a classe policial, porém, pouca gente sabe onde o funesto crime aconteceu. No dia 13 de novembro de 2003, ao meio dia, três guampudos de 16, 17 e 18 anos assaltaram a Lotérica da Garcia Coutinho e vazaram calma e sorrateiramente à pé pela Bom Jesus. Paixão voltava para casa pela Adolfo Olinto, alheio ao crime, quando viu pelo retrovisor do seu carro, um guampudo ajeitando um revolver na cintura. Ele rapidamente encostou o carro ao meio fio e ao tentar fazer a abordagem foi alvejado na nuca, sem dó e sem piedade, por outro meliante que já estava do outro lado da rua. Antes do final do dia os três latrocidas estavam atrás das grades. No dia seguinte sepultamos o colega, um dos mais intrépidos e atuantes detetives que Pouso Alegre já conheceu. E o fato aconteceu ali, na esquina do beco do crime, que recebera tal batismo meio século antes, num momento completamente diferente da nossa historia. Numa época em que matar era proibido por lei e por princípios. Numa época em que tirar a vida de alguém ainda não era um ato corriqueiro e banal.

Da torre da Catedral Metropolitana ou da janela do Colégio Santa Doroteia, os únicos prédios da época com mais de dois andares, podia-se avistar todos os limites da cidade. Depois do sobrado amarelo com a figura do belíssimo cavalo alazão na parede do alpendre do Sr. Argentino de Paula, na esquina da Com. Jose Garcia com Alfredo Custodio de Paula, o que sobrava era apenas uma arremedo de cidade. Logo ao lado estava o Estádio da Lema desde 1928, em seguida o hospital Samuel Libanio desde 1921, a vila São Vicente de Paula com suas humildes casinhas amarelas e a sorveteria do Gerôncio em frente o cemitério municipal na desmilinguida Taipas. A partir dali apenas estradinhas vermelhas seguiam para o Fátima, o Faisqueira, para a fazenda do Policarpo Campos e para o Cascalho. Desde as costas do ‘sobrado amarelo’ até o Esplanada e da esquina do Pinto Cobra até a Perimetral, tudo era fazenda de gado leiteiro.

Além da fabrica de macarrão do Orlando Chiarini em frente o Estádio da Lema, uma fabrica de manteiga e outra de banha suína somavam suas parcas riquezas à agropecuária, principal atividade econômica do município. Senador Jose Bento já pusera Pouso Alegre no mapa do Estado e do Brasil, mas o progresso econômico somente chegaria duas décadas depois com Simão Pedro Toledo.

Olhando da direita da novíssima e majestosa Catedral inaugurada três anos antes, era perceptível que o 8º Regimento de Artilharia Montada, instalado lá longe, perto do Jardim Yara em 1918, fizera a cidade caminhar mais naquela direção, passando pelo Colégio São Jose que já era um respeitável cinquentão. A “Vendinha” era uma pequena vila com pouco mais de 1.500 moradores – hoje virou bairro São João e tem quase 30 mil habitantes – o jardim Noronha era bairro novo e a Rua David Campista, famosa “Zona Boemia”, há um quarteirão do Santuário, já era um antro de boemia e perdição.

O bairro São Geraldo ainda não recebera este batismo. Era chamado pelo apelido que o originou: “Aterrado” e podia ser visto num relance só, pois tinha apenas a disforme Avenida Vereador Antonio Costa Rios, ora larga, ora estreita. As centenas de ruas e vielas que o tornaria o mais violento bairro distribuidor de drogas da região, abrigava ainda capituvas, pastagens, sangra-dáguas e mata típica de vargem ribeirinha. Depois da curva do Japonês eram só fazendas de gado.

A principal diversão dos jovens de todas as idades consistia em passear no Parque Municipal, na Praça João Pinheiro, onde se instalara há dois anos o Conservatório Estadual de Musica. Os homens menos refinados e mais arrojados se divertiam nadando nos poços do Lava-cavalos atrás do Vasquinho e no límpido e piscoso Rio Mandu, que corria bem mais perto do centro, onde se estende hoje a Avenida Perimetral. Na época das enchentes ficava ainda mais divertido pular de cima da ponte… – alguns anos mais tarde eu também pularia ali. Mas tinha também o Clube literário tal qual é hoje, o Cine Gloria do outro lado da praça e na Dr.Lisboa o imponente Teatro Municipal que serviu de delegacia de Policia. O mercado municipal com outra roupagem e muito mais modesto, mas não menos dinâmico e importante para a economia do município, já estava ali atrás da igreja, cercado de charretes, bagageiras e carros de bois. A principal fonte de energia das cozinhas das donas de casa; a lenha, era distribuída na cidade pelo Zé Fidelis no Jardim Yara e João Brunhara, na Santos Dumont, no quarteirão de cima do Beco do Crime.

Apesar de pequenina, Pouso Alegre já produzira muitos homens públicos que levaram seu nome além das fronteiras do município e do Estado. Mas tinha pouco mais de meia dúzia de médicos; Dr. Alaor Cobra, Dr. Gabriel, Dr. Lisboa, Dr. Omar Barbosa Lima, Dr. Vitor Romeiro, Dr. Jesus Pires… e meia dúzia de advogados, entre eles um que ganharia projeção justamente por defender o assassino do Beco do Crime; Rômulo Coelho. Alexandre Araújo ainda trabalharia mais vinte e poucos anos no DNER antes de se aposentar, mas já começava colecionar fatos, fotos e objetos que iriam contar nossa historia no riquíssimo Museu Tuany Toledo que ele próprio fundaria mais tarde.  Juscelino Kubitschek de Oliveira e os ‘candangos’ já se preparavam para rasgar o cerrado do planalto para construir Brasília, mas quem mandava no país ainda era o Sr. Nereu Ramos. O cinquentão Palácio da Liberdade era ocupado por Clovis Salgado da Gama e cá nas terras banhadas pelo piscoso e manso Mandu quem dava as cartas era o bondoso medico Custodio Ribeiro de Miranda. Embora nascido em Congonhal, nosso mais ilustre cidadão na época era o jovem Milton Reis, que aos 26 anos representava Pouso Alegre na Assembléia Legislativa do Estado.

Crimes? Ah, já existiam. Tirando os mais moderninhos, os da internet e os de ‘colarinho branco’ – Brasília ainda estava no papel – quase todos os demais imaginados pelo homo sapiens já grassavam nas terras manduanas. A diferença de hoje ficava na estatística. Passava-se meses, anos e até décadas entre um crime e outro. O velho Hotel da Silvestre Ferraz já existia e era quase cinquentão. Conhecia de tudo, menos superlotação. Nem precisava de muro externo. Seus hospedes podiam passar o dia todo tomando sol, pendurados nas janelas, conversando com as pessoas que passavam na rua. È claro que os transeuntes não se aproximavam muito, pois todo preso naquela época era bandido perigoso, marginal, pária social, perverso e assustador. – O que mudou? – Quem se aproximasse e mantivesse contato com eles poderia se confundido com comparsa de seus hediondos crimes e seria discriminado pela sociedade. Chegar até a janela da cadeia para entregar um maço de Parquer ou Continental sem filtro ou mesmo um cigarrinho de palha recheado com carapiá e uma caixa de fósforos Ipiranga, era um ato de bravura que o transeunte fazia por medo… medo de não atender o pedido do preso e ser ‘marcado’ por ele. O bom mesmo era evitar passar pela Monsenhor Mendonça.

Era época em que os casais namoravam na sala – os mais íntimos iam para a cozinha tomar café quente e cheiroso com broa – sempre na presença dos pais da mocinha virgem, cada um numa ponta do sofá ou da mesa. Se o namoro fosse proibido, o mocinho esperava na esquina da rua de baixo ou na encruzilhada da estrada. Se a mocinha tivesse irmão e fossem amigos tudo era mais fácil. Mas se não se bicassem, o rapaz tinha que primeiro ‘domar’ o futuro cunhado para depois chegar ao pai da moça. Se o homem passasse dos vinte sem casar é porque tinha alguma doença… esterilidade talvez e já deixava de ser um bom partido. A menina se passasse dos 17, ou ia para o convento ou ficava para titia. A pequena frota de automóveis do município tinha apenas quatro carros de ‘praça’ e o único “motor” que rodava na cidade, nos fins de semana, era a Harley Davidson do Sr. Valdemar Moura. Pouso alegre era uma respeitável senhora de 107 anos com cerca de 30 mil alegres e pacatos filhos biológicos ou adotivos que atendia pelo charmoso e honroso epíteto de “Princesa do Sul”. Eu? Era ainda um mero sonho do jovem casal Eva/Daniel Ferreira de Matos. Era o ano da graça de N.S.Jesus Cristo de 1955.

A melhor vista panorâmica da cidade ficava justamente num local – que ironia!!! – onde os moradores já não podiam mais abrir os olhos; o antigo cemitério municipal no Alto das Cruzes. Sentado no seu portão podia-se contemplar o verdadeiro mar em que se transformava o bairro do Aterrado de dezembro a março, na época das chuvas. Atravessando a rua Carijós, da janela da casa do meu tio Joaquim Paula, podia-se ver o trem de ferro surgir lento e manhoso no bairro Belo Horizonte, sobre o rio Sapucaí e segui-lo com os olhos até que ele parasse, vinte minutos depois, fungando que nem cavalo velho e soltando canudos de fumaça branca pelas ventas da Maria Fumaça na estação da Avenida Brasil.

Foi ali mesmo, no Alto das Cruzes, no ‘triangulo geográfico’ formado pelas ruas São Pedro e Tupinambás – a Tupinambás sobe pela direita, passa por trás do Palácio da Carijós, antigo cemitério, depois Cemig e desce do outro lado até a João Vaz de Lima – que nasceu o mais famoso ‘triangulo amoroso’ de que se tem noticia em Pouso Alegre. Ou pelo menos o mais trágico. Na base do vértice morava a jovem donzela Jacira, pouco mais que uma menina, apenas 13 anos de pureza, beleza e sonhos. Na subida da Tupinambás o intrépido jovem Jesus Damasceno.

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