O que a falta de uma letrinha não faz…
R. Silva foi um famoso radialista que por mais de 15 anos comandou um programa sertanejo na Radio Difusora de Pouso Alegre. Tinha milhares de fãs na cidade e região. Ele viera de uma cidadezinha do estado de Pernambuco, e por lá deixara também alguns fãs. Porém, os pernambucanos não queriam ouvir sua prosa melosa, suas músicas, suas mensagens de otimismo, de autoajuda e nem seus autógrafos! Os fãs pernambucanos queriam lhe dar uma pulseira…. de prata!!! O radialista era acusado de ter matado um desafeto lá no nordeste anos atrás.
No final de 2006, quinze anos depois do crime, finalmente os homens da lei localizaram R. Silva, belo e formoso e cercado de fãs em Pouso Alegre. Por questões de segurança, já que o radialista era irmão de um policial, ele foi levado imediatamente para o Hotel Recanto das Margaridas em Santa Rita do Sapucaí, onde aguardaria a transferência para Pernambuco. Do alto dos quase 150 quilos e um andar que lembrava um paquiderme, por causa da obesidade quase mórbida, R. Silva foi colocado no ‘seguro’, no final do corredor interno. E era autorizado a circular no corredor interno, para evitar uma eminente trombose.
Fugir?
Fora de cogitação. Não era um preso perigoso, e nem era importante para ser resgatado. Pular muro?
Não conseguiria pular sequer uma cadeira.
Sair correndo pela porta da frente? Uma tartaruga chegaria na esquina antes dele…
Era um hospede distinto, educado, amável… Toda quarta feira recebia visitas de distintas e ingênuas senhoras sobriamente vestidas, membros de um grupo de oração que, talvez, acreditavam piamente que ele era inocente.
Certa tarde, raspando duas horas recebi um telefonema. Era do orelhão defronte a cadeia. Carioca, o carcereiro, falou atabalhoado antes da ligação cair. Só consegui entender o principal: O R. Silva fugiu!!!
Em menos de dois minutos chegamos ao presidio ‘modelo’ do Sul de Minas, no bairro Recanto das Margaridas. Demonstrando preocupação e fingindo indignação, Carioca contou-nos o sucedido.
– “… Eu fui ao final do corredor, no X 10, levar cigarros para o Foinha e deixei o R. Silva caminhando no corredor. Quando voltei ele havia saído e fechado o portão por fora, me deixando trancado no corredor! Com a ajuda dos ‘cela livre’ conseguiu subir no telhado e pular o muro para pedir ajuda. A vizinha da frente disse que ele saiu andando normal e desceu… tinha um carro vermelho esperando ele na esquina…”
Bem, quanto o carcereiro recebeu para deixar o preso ‘caminhar no corredor’ no intervalo de almoço, hora em que todo policial inteligente está tirando a ‘siesta’, e trancá-lo sutilmente do lado de dentro; porque ele não estava com o celular no bolso ou na cinta como de praxe para comunicar a fuga a tempo de evitá-la, são outros quinhentos. Ou quem sabe… três mil !!!
Vou direto ao detalhe hilário desta historia, que só percebi muito tempo depois quando o Inquérito policial sobre a fuga já tramitava no fórum.
Como toda fuga de preso, a do preso acima de qualquer suspeita… era muita suspeita! E gerou sindicância, que virou I.P., que virou processo, que virou mais um chumaço de papel grampeado empoeirado numa prateleira da Secretaria Criminal do Fórum de Santa Rita do Sapucaí, por falta de provas! A sindicância do carcereiro Carioca, por causa do preso R. Silva, começou com a minha comunicação da fuga para o delegado Jose Walter, diretor do presidio, que dizia assim:
– “Senhor Delegado, atendendo o peido do carcereiro Marcos, comparecemos à cadeia publica… etc, etc.”
Muito tempo depois, ao juntar as copias das comunicações de serviço para arquivar, foi que percebemos o quanto eu e os colegas Benicio e Kleber fomos eficientes naquele início de tarde. Bastou o carcereiro “peidar” e em poucos minutos estávamos no Hotel Recanto das Margaridas para apoiá-lo…!
Essa crônica foi postada originalmente no dia 23-11-2011.
Hoje, ao redigir a notícia sobre os furtos de velhinhos ocorridos na cidade, como daquela vez em 2006, meu teclado ‘engoliu’ uma letrinha: a letra “t”, e o furto de velhinho virou ‘furo’ de velhinho!
Quem me chamou a atenção para o ‘furo’ foi a leitora Luciene, esposa do Tony Pádua, dileto amigo de décadas, radialista hoje na Rádio Difusora de Pouso Alegre.
Coincidentemente foi lá, na Rádio Difusora, que o Sr. R. Silva, ídolo de distintas senhoras rezadeiras, recebeu as pulseiras de prata da lei e seguiu no taxi do Magaiver para o Hotel Recanto das Margaridas, onde… levou o carcereiro Carioca na conversa.