Peixinho… e eu!

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Antes de se mudar da antiga casa da Rua Dom Nery, o medico Celso Lucas encheu sua casa de caixas de papelão para embalar seus pertences e foi passar o final de semana em um sitio. Quando chegou à casa pela manhã na segunda feira, percebeu que parte de sua mudança – televisão, aparelho de som, radio relógio, jóias e pequenos objetos de transporte manual – haviam ‘mudado’ antes da hora… Sem ele!
O médico que até então tinha horror à delegacia de Policia – entrava ali apenas até o setor de registro de veículos e dava graças a Deus quando saia – viu-se obrigado a procurar a Inspetoria de Detetives para comunicar o furto e pedir providencias. Afinal, televisão colorida há trinta anos custava bem mais do que hoje. Contava-se no dedo as casas de Pouso Alegre que tinham mais de uma. Aparelho de som 3×1 era coisa rara. Com salário de policial não se comprava. Jóias eram usadas somente em festas e olhe lá… Seu prejuízo passava de dez mil reais em valores atuais.
Éramos poucos policiais trabalhando. O furto do medico era apenas mais um entre dezenas que aconteciam todos os meses. Seria difícil designar uma equipe para cuidar só daquele caso. O registro do furto, no entanto, veio acompanhado de um pedido pessoal do vereador Firmo da Mota Paes – cunhado de Celso Lucas – um dos advogados mais atuantes na área criminal, amigo pessoal do nosso saudoso Inspetor Ângelo. Por isso entrou na lista de prioridades.
Da leva de detetives da ‘turma de 80’, que marcaria o inicio daquela década com brilhantes atuações, desvendando os principais crimes da cidade e região, eu era o menos experiente… Mas ‘na falta de tu, vai tu mesmo’. Ângelo me apresentou o medico barbudo – ele continua com a mesma barba de sempre! Só mudou a cor – e me passou o caso.
Como toda investigação criminal começa pelo mordomo, comecei investigando a empregada de Celso… Soube então que ela tinha uma irmã, daquelas que gostam de enxada de cabo longo… para ficar longe do trabalho! Ela por sua vez, namorava um sujeitinho baixote, forte, troncudo que morava pelas bandas da Tijuca, o qual às vezes passava com a namorada para visitar a cunhada. Trocando figurinhas com o próprio Ângelo, concluímos que o baixinho forte, cara de mau e coração duplamente mau, era “Peixinho”, dono de uma extensa ‘capivara’ na delegacia, por brigas, furtos e uso de drogas.
Filho do meio entre dez irmãs, cresci nas ruas de Pouso Alegre, trabalhando desde os dez anos para ajudar em casa. Fui office-boy, entregador, flanelinha, vendedor ambulante. – Você leitor que tem cerca de cinqüenta anos e boa memória, lembra-se dos carrinhos de pipoca, amendoim com chocolate, pipoca colorida, Raspadinha? Lembra-se daquele moleque franzino que passava na sua rua ou estacionava o carrinho com quatro garrafas de melado colorido e uma pedra de gelo na esquina da Praça Sen. Jose Bento, perto da Casa Morato? Era eu!!! Vendendo Raspadinha. Foi nessas minhas andanças pelos quatro cantos de Pouso Alegre que conheci o “Peixinho”.
Quase três anos mais velho que eu, o garoto que somente em 82 eu viria saber que se chamava J.B.P. me causava verdadeiro pavor. Hoje quem usa drogas é apenas ‘nóia’. Naquele tempo era “maconheiro”. E maconheiro era “bandido”, “marginal”. Todo maconheiro daquela época era conhecido à distancia… Deixava um rastro de medo por onde passava!
O primeiro maconheiro que conheci foi o “Chibit”, morador do bairro da Saúde. Andava sempre com Zé Pretinho, Jesus Muquirana, seu tio Lazinho e outros que se emendaram, menos ele. Chibit também era um baixote troncudo, debochado cara de pau e de mau. Forte e bom de briga, embora tivesse família ali mesmo no bairro, ele parecia não ter eira e nem beira e vez por outra extorquia os flanelinhas defronte a Faculdade de Direito. Naquela época o curso de Direito era “vago”! A maioria dos estudantes era das cidades e Estados vizinhos. Aulas apenas nos finais de semana. Somente ao ver sua ficha policial anos mais tarde, eu saberia que “Chibit” era corruptela de “Alcebíades”. Ele morreu totalmente inofensivo nos anos 90, nos braços de Severina do Popote, depois de anos vendo o sol nascer quadrado.
Peixinho foi o segundo “maconheiro” que conheci. Também encrenqueiro e amedrontador. Morava nas ‘escarpas’ da famosa Davi Campista, perto da “Zona”, o que aumentava ainda mais o meu temor, pois zona boemia naquele tempo era antro de pecado, corrupção e violência. Toda vez que nos encontrávamos, Peixinho pegava o que queria no meu carrinho, comia na minha presença, lentamente, talvez zombando do meu medo e ia embora sem pagar…! E eu dando graças a Deus por ele não levar minhas moedas e esquentar minha orelha! Agora ali estava eu investigando um crime possivelmente cometido pelo meu velho algoz, terror da minha infância. Jovem policial sonhando prender todos os facínoras da cidade e consertar o mundo eu estava prestes a me defrontar com meu maior inimigo. Como seria?
Através do “mordomo” que indiretamente abriu a porta para o cunhado gatuno entrar, soubemos que o suspeito passava a maior parte do tempo na companhia da namorada em uma pensão da qual era sócio, na área central de Campinas-SP. Tínhamos o fio da meada, precisávamos agora desembaraçá-lo. Telefonar para a congênere de Campinas e pedir para os colegas prende-lo e encaminhá-lo para nós? Sem chance! Mandar uma carta para ele intimando-o a devolver a rés furtiva!!! Insano, hilário e inútil. Esperar que ele voltasse a Pouso Alegre para dar-lhe o pulão, também não adiantaria, pois ele certamente esperaria muito tempo a poeira baixar. Apesar de ser apenas uma suspeita, contundente e provável, a única maneira de confirmá-la seria interrogando o suspeito. Por isso fomos procurá-lo na cidade de Orestes Quércia.
Saímos de manhazinha. Antes das dez chegamos a Campinas. Eu, o detetive Mairinques e a vitima Celso Lucas, no fusca azul escuro dele. Com as informações fornecidas pela cunhada de Peixinho…

Para continuar lendo a historia de Peixinho, meu algoz de infância, acesse www.meninosquevicrescer.com.br

 

Mauritania Furtado… O anjo de Borda da Mata

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Passava poucos minutos da uma da tarde ensolarada quando os dois amigos se encontraram na Praça Dom Otavio, defronte o Palácio do Bispo em Pouso Alegre.
– Está tendo festa na Borda… Vamos vender pipoca lá…? – Instigou o mais velho.
– Vamos! Mas como a gente vai? – indagou o mais novo.
– Vamos a pé, ué… Empurrando o carrinho!
E saíram os dois garotos de calça curta estrada afora empurrando o carrinho de pipocas coloridas e amendoim com chocolate! Às sete da noite da noite entraram na cidade de Borda da Mata! Era dia de festa da padroeira N.S.do Carmo. As ruas estavam empinhocadas de gente. Atendendo os pedidos de alguns garotinhos curiosos os dois pequenos aventureiros viraram a primeira esquina saindo da rua principal. Pararam casualmente diante da terceira casa da rua. Ainda atendendo a criançada que nunca tinha visto pipocas coloridas e o delicioso amendoim envolto em chocolate, o mais novo pediu um copo d’agua a uma bela e simpática senhora ali defronte. Antes de adentrar a casa ela fez algumas perguntas. Voltou dois minutos depois trazendo o copo d’agua. E trouxe também algo muito melhor, que não havia sido pedido… Dois pratos alombados de arroz branco com feijão de caldo grosso e bife de alcatra…! Sentados ali na calçada na frente da casa, os dois garotos comeram a refeição mais saborosa de suas vidas!
A bela senhora morena de meia idade não tinha asas, mas foi o anjo daqueles dois garotos que haviam acabado de caminhar 27 quilômetros empurrando um carrinho de pipocas. Seu nome era Mauritania. Mauritania Furtado!
O garoto mais velho, 14 anos, chamava-se Rui de Paula. O mais novo, 12 anos, vendedor de pipocas, chamava-se Airton Ferreira de Matos. Dez anos depois ganharia o apelido de “Airton Chips”! Era 16 de julho de 1971…
Na manhã desta quarta, 17, voltei à Borda da Mata… – desta vez de carro! – Fui visitar meu “Anjo da Borda…” e levar-lhe um exemplar autografado do livro “MENINOS QUE VI CRESCER”! Aos 87 anos a viúva Mauritania conserva a mesma simpatia e bondade de 1971. Não me deixou sair de lá sem tomar ao menos um guaraná gelado! Concordou até em posar para fotografia comigo! Coisa rara, pois é avessa a fotos. – Também, não é todo dia que se pode posar ao lado de um garoto a quem serviu carinhosamente um prato de arroz com feijão e bife há 43 anos!
Vida longa Mauritania, meu “Anjo da Borda”, vida longa com saúde e alegria!

O desfecho deste fato acontecido há 43 anos está no livro www.meninosquevicrescer.com.br. A historia completa está na pagina 239 com o titulo: “O mistério do Coisa Ruim da Borda”.

• O livro pode ser encontrado na “ARTEC PAPELARIA, na Praça N.S.do Carmo em Borda da Mata.

 

Peixinho… E eu!

Peixinho atravessou o Mandu a nado... Algemado!

Peixinho atravessou o Mandu a nado… Algemado!

Em meados de 82, o médico Celso Lucas se preparou para mudar-se da Rua Dom Nery – onde funciona hoje uma lanchonete – por isso, como todo ‘mudante’, encheu sua casa de caixas de papelão para embalar seus pertences. Antes da mudança, foi passar o fim de semana em um sitio. Quando chegou à casa pela manhã na segunda feira, percebeu que parte de sua mudança – televisão, aparelho de som, radio relógio, jóias e pequenos objetos de transporte manual – haviam ‘mudado’ antes da hora… Sem ele! O médico que até então tinha horror à delegacia de Policia – entrava ali apenas até o setor de registro de veículos e dava graças a Deus quando saia – viu-se obrigado a procurar a Inspetoria de Detetives para comunicar o furto e pedir providencias. Afinal, televisão colorida há trinta anos custava bem mais do que hoje. Contava-se no dedo as casas de Pouso Alegre que tinham mais de uma. Aparelho de som 3×1 era coisa rara. Com salário de policial não se comprava. Jóias eram usadas somente em festas e olhe lá… Seu prejuízo passava de dez mil reais em valores atuais.
Éramos poucos policiais trabalhando. O furto do medico era apenas mais um entre dezenas que aconteciam todos os meses. Seria difícil designar uma equipe para cuidar só daquele caso. O registro do furto, no entanto, veio acompanhado de um pedido pessoal do vereador Firmo da Mota Paes – cunhado de Celso Lucas – um dos advogados mais atuantes na área criminal, amigo pessoal do nosso saudoso Inspetor Ângelo. Por isso entrou na lista de prioridades.
Da leva de detetives da ‘turma de 80’, que marcaria o inicio daquela década com brilhantes atuações, desvendando os principais crimes da cidade e região, eu era o menos experiente… Mas ‘na falta de tu, vai tu mesmo’. Ângelo me apresentou o medico barbudo – ele continua com a mesma barba de sempre! Só mudou a cor – e me passou o caso.
Como toda investigação criminal começa pelo mordomo, comecei investigando a empregada de Celso… Soube então que ela tinha uma irmã, daquelas que gostam de enxada de cabo longo… para ficar longe do trabalho! Ela por sua vez, namorava um sujeitinho baixote, forte, troncudo que morava pelas bandas da Tijuca, o qual às vezes passava com a namorada para visitar a cunhada. Trocando figurinhas com o próprio Ângelo, concluímos que o baixinho forte, cara de mau e coração duplamente mau, era “Peixinho”, dono de uma extensa ‘capivara’ na delegacia, por brigas, furtos e uso de drogas.
Filho do meio entre dez irmãs, cresci nas ruas de Pouso Alegre, trabalhando desde os dez anos para ajudar em casa. Fui office-boy, entregador, flanelinha, vendedor ambulante. – Você leitor que tem cerca de cinqüenta anos e boa memória, lembra-se dos carrinhos de pipoca, amendoim com chocolate, pipoca colorida, Raspadinha? Lembra-se daquele moleque franzino que passava na sua rua ou estacionava o carrinho com quatro garrafas de melado colorido e uma pedra de gelo na esquina da Praça Sen. Jose Bento, perto da Casa Morato? Era eu!!! Vendendo Raspadinha. Foi nessas minhas andanças pelos quatro cantos de Pouso Alegre que conheci o “Peixinho”.
Quase três anos mais velho que eu, o garoto que somente em 82 eu viria saber que se chamava J.B.P. me causava verdadeiro pavor. Hoje quem usa drogas é apenas ‘nóia’. Naquele tempo era “maconheiro”. E maconheiro era “bandido”, “marginal”. Todo maconheiro daquela época era conhecido à distancia… Deixava um rastro de medo por onde passava!
O primeiro maconheiro que conheci foi o “Chibit”, morador do bairro da Saúde. Andava sempre com Zé Pretinho, Jesus Muquirana, seu tio Lazinho e outros que se emendaram, menos ele. Chibit também era um baixote troncudo, debochado cara de pau e de mau. Forte e bom de briga, embora tivesse família ali mesmo no bairro, ele parecia não ter eira e nem beira e vez por outra extorquia os flanelinhas defronte a Faculdade de Direito. Naquela época o curso de Direito era “vago”! A maioria dos estudantes era das cidades e Estados vizinhos. Aulas apenas nos finais de semana. Somente ao ver sua ficha policial anos mais tarde, eu saberia que “Chibit” era corruptela de “Alcebíades”. Ele morreu totalmente inofensivo nos anos 90, nos braços de Severina do Popote, depois de anos vendo o sol nascer quadrado.
Peixinho foi o segundo “maconheiro” que conheci. Também encrenqueiro e amedrontador. Morava nas ‘escarpas’ da famosa Davi Campista, perto da “Zona”, o que aumentava ainda mais o meu temor, pois zona boemia naquele tempo era antro de pecado, corrupção e violência. Toda vez que nos encontrávamos, Peixinho pegava o que queria no meu carrinho, comia na minha presença, lentamente, talvez zombando do meu medo e ia embora sem pagar…! E eu dando graças a Deus por ele não levar minhas moedas e esquentar minha orelha! Agora ali estava eu investigando um crime possivelmente cometido pelo meu velho algoz, terror da minha infância. Jovem policial sonhando prender todos os facínoras da cidade e consertar o mundo eu estava prestes a me defrontar com meu maior inimigo. Como seria?
Através do “mordomo” que indiretamente abriu a porta para o cunhado gatuno entrar, soubemos que o suspeito passava a maior parte do tempo na companhia da namorada em uma pensão da qual era sócio, na área central de Campinas-SP. Tínhamos o fio da meada, precisávamos agora desembaraçá-lo. Telefonar para a congênere de Campinas e pedir para os colegas prende-lo e encaminhá-lo para nós? Sem chance! Mandar uma carta para ele intimando-o a devolver a rés furtiva!!! Insano, hilário e inútil. Esperar que ele voltasse a Pouso Alegre para dar-lhe o pulão, também não adiantaria, pois ele certamente esperaria muito tempo a poeira baixar. Apesar de ser apenas uma suspeita, contundente e provável, a única maneira de confirmá-la seria interrogando o suspeito. Por isso fomos procurá-lo na cidade de Orestes Quércia.
Saímos de manhazinha. Antes das dez chegamos a Campinas. Eu, o detetive Mairinques e a vitima Celso Lucas, no fusca azul escuro dele. Com as informações fornecidas pela cunhada de Peixinho…

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Renanzinho… O psicopata da cabeleireira

salão da ester

Nove e quarenta de uma quinta feira abafada de agosto, véspera de aniversario do padroeiro da cidade. O jovem alto, forte, cabelos curtinhos subiu a Dr. Lisboa lentamente, sem destino, olhando para todo lado sem olhar para ninguém. Não tinha nenhum compromisso definido. Quando cruzou o semáforo da Rua Marechal de Teodoro e pisou no passeio defronte o prédio do 17º Departamento de Policia Militar, institivamente olhou para a avenida e seus olhos pararam na rua em frente a Vieira de Carvalho… Mais precisamente num sobradinho onde funcionava um salão de beleza. Uma lembrança o atraiu. Encostou-se ao poste em frente o quartel e ficou ali por alguns instantes, olhando para a plaquinha do sobradinho da estreita rua. Suas lembranças o levaram há alguns anos atrás. Havia cometido um furto na galeria em frente e acabara sendo preso pela PM algumas horas mais tarde. Não tinha mais a res furtiva e a policia não tinha prova da sua culpa… A menos que alguém o apontasse como autor do furto. E não é que alguém apontou! A policia parara a viatura ali perto e chamara algumas pessoas para ver se alguém o reconhecia…

– Foi ele mesmo que eu vi saindo da loja… – Disse a bonita senhora de meia idade.
Graças a esta afirmação a policia ‘tirou-lhe o serviço’. Ele assinou mais um Afai, o trigésimo oitavo da carreira, talvez, desde os dez anos de idade! E mais uma vez foi se hospedar na ‘cela de menores’, no pátio do velho Hotel da Silvestre Ferraz. Mais 45 dias dividindo aquele espaço de 3×3 – incluindo o banheiro – com outros 5 ou seis delinquentes. Ele nunca mais voltara naquela rua desde então, mas soubera que a ‘coroa’ que dissera “foi ele mesmo” era uma cabeleireira que tinha um salão ali em frente a Galeria Portal. No começo tivera muita raiva dela e pensara em vingança, mas sua vida já era amarga demais para cultivar mais um sentimento negativo. Acabou esquecendo a cabeleireira cujo nome nem sabia. Agora ali na esquina, olhando para a placa pendurada no velho sobradinho tomara conhecimento do seu nome.

“Ester: Cabeleireira”!

Renanzinho ouve atentamente o Homem da Capa Preta ler a sua pena...!

Renanzinho ouve atentamente o Homem da Capa Preta ler a sua pena…!

De repente o ‘perreio’ que passara naquele cubículo na ‘esquina’ do pátio interno do presidio, olhando através das grades da janelinha para a cela das mulheres e das grades da porta remendada de solda para as celas do presos menos afortunados ou em triagem, veio à tona. Ficou alguns minutos ali encostado no poste pensando na vida, sentindo uma certa angustia. Apesar de, depois daquela bronca ter assinado outras, já ter atingido a maioridade penal e estar a mais de ano morando no novo Hotel do Juquinha, aquela fita na galeria foi marcante. Na verdade não se lembrava mais o que havia furtado, mas se lembrava nitidamente porque fora preso;
-“foi ele mesmo” – dissera a cabelereira.
Ele só tinha 19 anos, mas já estava na ‘caminhada’ há quase dez! Morando uma hora com o pai, outra hora com a mãe, outra com uma tia, outra na rua, outra por conta do Conselho Tutelar internado em clinicas…! Apanhou do pai, da mãe, ouviu as chorumelas da tia, apanhou dos moleques da rua, tomou puxões de orelha dos conselheiros, do juiz da infância, do promotor da infância! Passou diversas temporadas de 45 dias atrás das grades, apanhou de traficantes… Dormiu debaixo da ponte, foi amarrado em casa com correntes para não ir pra rua…!
– É, a cabeleireira não tem nada a ver com minha vida tão dura… Mas também não tinha que se intrometer! – pensou ele incógnito encostado no poste ali há poucos metros da porta do quartel, olhando para a placa do salão de beleza: “Ester Cabeleireira”…
Já ia se ‘despedir’ do poste e seguir seu caminho sem rumo tentando esquecer os pensamentos ruins, quando uma mocinha saiu do salão com uma bolsa à tiracolo. Esperou mais uns minutos quando então viu a bonita senhora que o identificara aparecer na janela do sobradinho…

Para continuar lendo “Renanzinho… O psicopata da cabeleireira”, acesse: www.meninosquevicrescer.com.br

Gerente do Hotel do Juquinha recebe escritor que conta historia dos ‘seus meninos’…

Willian Abrete e Airton Chips: Uma foto no minimo intrigante! O 'gerente' recebendo olvro que conta a historia de dezenas de 'meninos que ele hospeda em seu 'hotel'

Willian Abrete Pinto, diretor do Hotel do Juquinha e Airton Chips: Uma foto no minimo intrigante! O ‘gerente’ recebendo o livro que conta a historia de dezenas de ‘meninos’ que ele hospeda em seu ‘hotel’…!

Foi uma visita informal para autografar a obra, digamos, no seu nascedouro, já que dezenas dos personagens do livro estiveram ou estão hospedados no famoso presidio inaugurado em 2009. Na ocasião o diretor Wiiliam Abrete Pinto falou das ultimas conquistas do presidio e das dificuldades que ainda enfrenta para administrar com dignidade e segurança o ‘hotel’ que abriga atualmente mais de 700 presos nos três regimes prisionais.
Depois da inauguração do “Salão Família”, onde familiares dos presos agora podem esperar a hora da visita com certo conforto, além de ter agua fria e poder fazer suas necessidades bem como trocar fraldas de suas crianças com certa dignidade – antes tinham que fazer necessidades no mato – da criação da banda de musica, da horta comunitária agora vem as salas de aula em local próprio, para que os ‘recuperandos’ que queiram aprender algo mais do que a arte de cuidar do alheio e driblar a policia, possam sair de lá ao menos com um diploma na mão.
O galpão para abrigar mais funcionários terceirizados da Tigre acaba de ser coberto ao lado da fabrica de blocos que está indo de vento em popa. Os presos do regime sem-aberto estão produzindo bloquetes que serão usados no calçamento das ruas de Congonhal e outras cidades parceiras do Hotel do Juquinha. Foi através desta parceria que o presidio conseguiu cobertura para a frota de veículos na entrada do pátio.

Produtos que entraram no presidio -e que poderiam estar recheados d drogas ou celulares - por descuido ou convencia de agentes...!

Produtos que entraram no presidio – e que poderiam estar recheados de drogas ou celulares – por descuido ou conivencia de agentes…!

Apesar das conquistas no campo da dignidade e ressocialização dos presos através do trabalho, uma pedra ainda teima em continuar no sapato do diretor… Trata-se da falta de cobertura do pátio do banho de sol. Através do terreno vizinho ao presidio ainda é possível arremessar kits droga, celular e se vacilar até armas por cima do muro. Os objetos caem no pátio interno e são pescados pelos presos através das ‘terezas’ feitas de tiras de pano ou qualquer coisa que sirva de corda! Bolas de futebol recheadas de drogas ou celulares também costumam voar por sobre o telhado e cair no pátio.
– Desde que assumimos a direção do presidio há quase dois anos, vimos tentando cobrir o pátio com tela. Em setembro do ano passado o Juiz da Execução Penal direcionou verbas oriundas de prestações pecuniárias referentes a condenações e transações penais para o Conselho da Comunidade para Execução da Pena, determinando à sua diretoria que providenciasse as referidas telas… Até hoje, um ano depois, as telas e também as câmeras de vídeo para monitoramento do presidio ainda não chegaram… – diz desalentado o diretor.

A tão sondada tela de proteção que ha um ano saiu do Conselkho da Comundade para Execução da Pena e anda não chegou ao Hotel do Juquinha, poderia evitar que estes kits caíssem no patio...

A tão sondada tela de proteção que há um ano saiu do Conselho da Comunidade para Execução da Pena e ainda não chegou ao Hotel do Juquinha, poderia evitar que estes kits caíssem no patio…

Enquanto o pátio não recebe a tão sonhada cobertura de tela os OVNIs continuam a sobrevoar e aterrissar no pátio do Hotel do Juquinha! Alguns são abduzidos pelos presos e acabam se enfurnando nas celas! E não é só isso. Apesar de todo esforço, ainda há trem fora dos trilhos no presidio – admite o diretor. Segundo ele a aérea não é a única via de acesso de objetos que transgridem as normas da unidade prisional. A vista grossa, a negligencia ou até mesmo o jeitinho brasileiro vez por outra permitem que objetos proibidos adentrem o hotel sem autorização. Foi assim que na semana passada produtos alimentícios – que poderiam estar recheados de drogas ou celulares – foram parar no alojamento dos presos albergados.

Com donativos de empresarios, aqui serãp construidas salas de aula para o oresos.

Com donativos de empresários, aqui serão construídas salas de aula para os presos.

De qualquer maneira, seja pela competência, seja pela seriedade do trabalho, seja pela transparência da administração do empolgado gerente Wiliam Abrete e seus assessores e colaboradores, o Hotel do Juquinha vem recuperando a credibilidade arranhada em administrações passadas. Desde que assumiu no final de 2012, Wiliam aproximou-se da sociedade, fez parceria com empresários de Pouso Alegre e região e vem escrevendo um capitulo mais produtivo e transparente na historia do ‘hotel’ mais famoso do Sul de Minas. Um dos primeiros passos que fez diferença em sua gestão à frente da unidade foi a abertura à imprensa. No mínimo é de se supor que não tenha nada a esconder!

Segurança: essa belezinha - me refiro à submetralhadora SMT 850 veio acompanhado de outras quatro para se somar aos fuzis 556...

Segurança: essa belezinha – me refiro à submetralhadora SMT 850 – veio acompanhada de outras quatro para se somar aos fuzis 556…

À menos de dois da aposentadoria, o ainda jovem diretor mantem a empolgação. Auxiliado por pessoas da sua confiança, segue tentando melhorar a vida dos seus hospedes, tentando resgatar-lhes a dignidade ao dar-lhes tratamento digno e ocupação saudável, preparando-os para a reinserção social quando pagarem seus débitos.

Disciplina é fundamental:   Presos que avançaram o 'sinal vermelho' e agora se movimentam fora das cela, tem que andar na faixa amarela com as mãos para trás...

Disciplina é fundamental: Presos que avançaram o ‘sinal vermelho’ e agora se movimentam fora das cela, tem que andar na faixa amarela com as mãos para trás…

Monteiro e os quase 40 ladrões do Bagdá

Só faltam alguns detalhes...

Só faltam alguns detalhes…

A maior fonte de informação sobre crimes e criminosos daquela época era a Zona Boemia. Cafetões, cafetinas, prostitutas de todo tipo, ‘viadinhos’ assumidos e outros enrustidos disfarçados de serviçais se misturavam à eclética clientela.

Jovens em grupos; comerciantes discretos; sozinhos ou em duplas, alguns deles barulhentos fazendo questão de exibir status de machões!

Homens simples da roça que ficavam uma eternidade olhando à distancia, esperando a coragem chegar para convidar a donzela para o ‘afair’!

Pequenos grupos de arruaceiros mamados que estavam ali muito mais interessados em se atracar com marmanjos do que com as mulheres de vida fácil!

Recrutas do exercito que, pela primeira vez, agora maiores de idade, se aventuravam a por os pés na mal afamada rua sem medo da policia, tentando perder a virgindade!

Tinha também os cidadãos bem sucedidos profissionalmente e frustrados no lar em busca da alegria perdida… Advogados em surrados ternos, fingindo defender alguma causa – uns levavam até uma valise para reforçar a ideia de que estavam trabalhando! – desfilavam discretamente por ali em defesa da própria ‘causa’…!

‘Garanhões’ no dorso dos seus cavalos, muito mais preocupados em montar e fustigar o alazão arreado do que ‘chegar o reio’ e domar uma potranca na cama!

A “Zona” que já nascera batizada de “Capim Gordura” era local ideal para queimar a erva marvada, aspirar a fumacinha do capeta sem ser incomodado. Em meio a todo este burburinho de emoções e comportamentos, desfilavam sorrateiros meliantes de toda especialidade!

Na velha e sombria Davi Campista o perfume de Severina do Popote se misturava com o da cafetina Margarida Leite, da Casa da Paineira – assassinada pelo cafetão turco Faissal – com a Betty da Casa Rosa, com a Cristina Melão – por causa do par de seios que assemelhava à fruta rasteira nordestina – com a Bibi Sete Fôlegos – era capaz de fazer dezessete ou mais programas numa só noite, a cinco reais cada um – com o cheiro azedo de suor, desodorante Avanço e agua de colônia barata dos amantes que ali aportavam em busca de amor… Ainda que falso, pago e efêmero!

O miúdo Vitinho, mais rebolante que uma cobra d’agua mal matada, era apenas o camareiro das mariposas lá no fim da rua. Mais tarde no Capim Gordura teria sua própria boate e quando a Aids acabou com a prostituição ‘formal’, já no crepúsculo decadente da ‘Zona’, venderia maconha num hotel da Silviano Brandão!

Após uma demanda que durou anos, defendida principalmente pelos causídicos das piranhas, Jorge Beltrão e Firmo da Mota Paes, finalmente a “Zona” da Davi Campista, no centro da cidade mudou-se para o famoso Capim Gordura. Ali, os pulguentos e fedidos prostíbulos e bordeis antes chamados de ‘casa da fulana’ ganharam o pomposo nome de “Boate”! Elas relutaram tanto para deixar o velho logradouro, receosas de perder a clientela, mas logo viram que a mudança fora um grande negocio. No local mais discreto, longe do centro, o comercio do amor ganhou clientela em quantidade e qualidade. Na velha Davi Campista qualquer grupinho de moleque, depois de abraçar umas loiras geladas, para ali seguiam em busca de uma morena quente! E chegavam a pé, a cavalo, em charretes, fusquinhas e brasílias e até em lotações de kombi. Compravam muito mais cachaça e confusão do que ‘amor’!

A distancia de cinco quilômetros do centro selecionou a clientela das ‘mademoiselles’ do Capim Gordura! Apesar da poeira, a rua larga bem iluminada e suas travessas, as casas grandes e novas afastadas da rua, tocando musicas de Joaquim & Manuel, Pedro Bento & Ze da Estrada, Leo Canhoto & Robertinho, Odair Jose, Marcio Greick ou Wanderley Cardoso em meio a fumaça e luzes coloridas, davam um tom mágico ao lugar. Parecia outro mundo.

O cheiro da cuba-libre, whisky Drurys, Campari, Menta e a tradicional Cangibrina, misturava-se ao perfume das donzelas. Algumas recém-saídas da puberdade pareciam ninfetas de revista. Olhar para elas misturava os sentimentos; vontade de agarra-las e… Pena do seu futuro!

Outras já traziam no rosto carregado de maquiagem, nas cinturas já sem contornos e nos seios caídos as marcas do tempo… E do uso!

Algumas já passadas de cinquenta primaveras usavam o sorriso largo e falso e os mais de ‘trinta anos de janela’ e lençóis encardidos para se dedicar à cafetinagem.

Esse ambiente de vícios e pecados era também um antro de banditismo. Todo bom bandido tinha uma mulher na Zona… Todo bom policial tinha uma ‘amiga informante’ na Zona!

Os meliantes daquela época eram mais espertos e corajosos; agiam sozinhos, mas…

Não sei se Freud já dissera isso;

– Todo bandido tem necessidade psicológica de contar a alguém suas bravatas… Todo bandido precisa de uma confidente!

E achavam que as prostitutas que como eles viviam à margem da sociedade, tinham algo a esconder. Tinham bons ouvidos e motivos para guardar segredos.

Santa ingenuidade!

Só bandido mesmo para achar que alguma mulher consegue guardar segredos…!

Bom para os detetives que conseguissem criar laços de amizades na zona! Ali poderiam beber qualquer tipo de informação do submundo do crime na fonte! O preço desta amizade?

Bem, ia desde pequenos favores tais como afastar arruaceiros da boate; fazer vista grossa a algum achaque de balão apagado; cobrar alguma divida ‘esquecida’ por um ou outro cliente…; e, até alguns momentos de cama!

No nosso grupo da época teve colega que quase passou dos “momentos” e por um triz não mudou sua historia pessoal…!

Mas isso já é outra historia… Voltemos para a delegacia de policia da Silvestre Ferraz para buscar as pulseiras de prata, pois policia na Zona sem um 38 no coldre e um par de algemas na cinta – com o perdão do trocadilho – está pelado!

Além do mais, Monteiro, o “Ladrão do Bagdá”, está indo para Poços de Caldas com seu Caravan Marron fazer uma fita…

Quer ler o resto desta historia?

Voce vai ter que esperar mais três ou quatro semanas! Os “Meninos” estão a caminho trazendo esta e outras 49 historias contadas com o seu sotaque e muito bom humor!

Aguarde…

 

Os Meninos estão chegando…

Não faça como Judas! Não vá me trair... Por pouco mais de 30 moedas voce leva os Meninos pra casa...!

Não faça como Judas… Não vá me trair! Por pouco mais de 30 moedas voce leva os Meninos pra casa…!

 

Eles estão a cento e sessenta quilômetros de Pouso Alegre e devem chegar dentro de quatro ou cinco semanas. Trazem na bagagem historias que vão marcar a vida do leitor! Que farão o leitor, chefe de família, repensar o relacionamento com os filhos.

O primeiro encontro será com Piolho, um jovem empresário que tinha tudo para ser feliz… Até conhecer a Pedra Beje Fedorenta! Depois vem Pedrinho & Gegê, Chapeleiro: o ultimo chefão do Velho Hotel da Silvestre Ferraz, Peixinho & Eu, Monteiro e quase 40 ladroes do Bagdá e tantas outras…

Além das historias de garotos perdidos na curva do crime, ambientadas nas cidades de Pouso Alegre, Santa Rita do Sapucaí, Silvianópolis, Congonhal, Cambui, Camanducaia e Monte Sião, os meninos desvendam o mistério do “Coisa Ruim da Borda”, o mistério do “Corpo Seco” e a origem do Ribeirão das Mortes… Historias reais acontecidas há mais de meio século, minuciosamente investigadas pelo autor. Contam com detalhes os últimos dias de “Fernando da Gata” e levarão o leitor à medieval Verona dos Montechios & Capulletos com a historia verdadeira de “Jesus & Jacira” que terminou tragicamente depois da Missa do Galo no Beco do Crime!

Comece juntar agora suas moedas! Se você guardar uma destas por dia, quando os Meninos chegarem você poderá adquirir seu exemplar autografado e ainda sobrará uns trocados para a pipoca…!

Eles ainda estão a caminho, no entanto, o mais importante recado já chegou:

“Abrace seu filho… Não deixe que as drogas o abracem…!” 

O batateiro do bigode falho

Coreto

Eles passaram horas abraçando a loira gelada e jogando bilhar no barzinho atrás da igreja enquanto o cozinheiro do rancho fazia compras de mantimentos no supermercado do Jairo há poucos metros dali. Alguns eram amigos da lida na lavoura de batata. Outros eram apenas colegas de trabalho na mesma atividade. Por isso mesmo, embalados pelo suco de gerereba dois deles, Brandão e Andrade – eles eram de Bom Repouso e lá meia dúzia de pessoas tem o sobrenome Pereira ou qualquer outro! O restante dos moradores do município ou é Brandão ou é Andrade! – se desentenderam e trocaram farpas & espinhos. No momento do embarque na carroceria do caminhão para voltar ao rancho na lavoura acabaram trocando também alguns pontapés. Não continuaram porque o caminhão já estava de saída e a chuva forte de verão de chegada! Se acomodaram como puderam na carroceria suja de terra, se protegeram com lonas e seguiram para o rancho já debaixo de chuva. Eram oito peões acostumados com a vida rustica e dura da lavoura de batatas. Passavam a semana inteira nos ranhos nos municípios vizinhos. No final de semana moravam na cidade de Bom Repouso!

Aquele final de semana de outubro, por causa da colheita que precisava alcançar preço no mercado, não puderam voltar para casa. Só foram até a cidade porque o cozinheiro precisava comprar mantimentos. Na volta para o acampamento no bairro Catiguá, já debaixo da chuva fria os dois batateiros, Brandão e Andrade, resolveram reacender a discussão e a troca de farpas & espinhos. O caminhão empoeirado fazendo barro, entrou por uma estradinha vicinal margeando o Rio Santa Barbara passou por um mata-burro e em poucos minutos chegou ao acampamento. Todos desceram do caminhão e correram para a proteção do rancho de sapé… Menos um, menos o Andrade! Mas onde estaria ele?

Será que embalado pelo sacolejar do caminhão sob efeito do suco de gerereba teria dormido?

Será que preferira continuar na carroceria do caminhão sob a lona para evitar novos atritos com Brandão?

O motorista foi checar… Andrade não estava lá! Mas onde estaria? O que acontecera?

Será que ele saltara do caminhão em movimento? Teria caído?

Ou quem sabe, empurrado…!?

 

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O estupro de Ester

... Essa velha delegacia tem historia...!!!

… Essa velha delegacia tem historia…!!!

Quando descemos da viatura no final da manhã, o inspetor Ângelo esperava por nós na porta da DP. Na verdade esperava pela primeira equipe que retornasse da rua! E foi logo dizendo;

– Temos um estupro em flagrante. Aquela moça – virou ligeiramente a cabeça para indica-la sentada no banco de madeira da recepção ao lado de uma senhora de meia idade… – foi violentada por um negão na Fernão Dias, perto da Serrinha de Bela Vista. Parece que ele trabalha numa olaria ali por perto. A equipe de Crimes contra a vida está empenhada em outra diligencia. Vão até lá e vê se acha o sujeito… O Pomarola vai com vocês. Pegue mais alguma informação com ela…

A delegacia estava vazia naquele momento. Sentada no final do banco duro de madeira, a jovem negra de vinte e poucos anos, miúda, chorosa, permanecia agarrada no braço da senhora de fisionomia serena e bondosa… Conversamos, ou pelo menos tentamos,  ali mesmo no banco encardido e liso da recepção. Afinal, o tempo urgia!  Tínhamos que chegar o quanto antes ao local do crime!

– Como era o sujeito… – Perguntei para começar.

Ao ouvir minha pergunta, a jovem, extremamente tímida se agarrou ainda mais no braço da senhora de ar bondoso e desandou a chorar baixinho, como que tentando se esconder debaixo do seu braço. Foi a senhora de olhar sereno quem respondeu;

 

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Neco Paturi, o caloteiro de Monte Sião

Monte Sião

Em minha curta passagem pela capital das malhas – foram apenas três meses antes da ‘primeira’ aposentadoria – colecionei fatos inesquecíveis! Morando de segunda a sexta no alojamento da DP e comendo de restaurante ao lado da igreja comecei ganhar peso e então passei a fazer caminhadas. Ia todos os dias até o bairro dos Francos em Aguas de Lindoia pela estrada vicinal e voltava pela rodovia passando pelo C.T. do Oscar. Como era horário de verão, depois da caminhada pegava a velha Honda ‘Duty’ branca e subia nas montanhas em volta da cidade para curtir o por do sol. O Morro Pelado, com magnifica vista para outras seis cidades ao redor, estava se tornando meu quintal de casa. Em menos de três meses os sete ou oito assaltos a malharias nos fins de semana caíram a zero. Era raro o dia que não mostrava as pulseiras de prata para alguém… Só prisões insignificantes; ladroes pés-de-couve, “dimenor” e devedor de pensão alimentícia.

Mas, como os boatos andam mais do que “égua do chapadão”, logo surgiu a lenda de que havia uma “equipe de fora” trabalhando na cidade em horas mortas, combatendo a criminalidade. Isso assustou os meliantes das cidades vizinhas, especialmente do Estado de São Paulo, que preferiram esperar a poeira baixar! A temível ‘equipe de fora’ era eu e o bate-pau Nilson, funcionário emprestado da Secretaria de Saúde, que conhecia cada ruela da cidade e cada pé de Ipê que margeia as infindáveis e muito bem cascalhadas estradas do município, mas que era incapaz de fechar uma pulseira de prata nos punhos de alguém. Tem até um fato pitoresco que ilustra isso… Semanas antes da minha chegada foram ele e o delegado Watson prender um suspeito. Dito Cabrito resistiu à prisão e entrou em luta corporal com o delegado! Rolaram na poeira e caíram ambos em um barranco na periferia da cidade, mas o delegado mesmo com o pé-quebrado conseguiu segurar Cabrito pelo chifre. Seu filho, com 17 anos na época, fechou as pulseiras de prata nos punhos do prisioneiro. Enquanto tudo isso acontecia, Nilson, o ‘policial ad-hoc’, meu futuro parceiro, permaneceu com o traseiro colado no banco da viatura assistindo passivamente à luta do bandido com o delegado! Watson passou o mês seguinte sem poder prender ninguém… Usando muletas e um grosso gesso no pé…! Às vezes eu levava comigo o professor Clovis, que, a exemplo de Nilson, desviado de função, trabalhava na DP como Vistoriador de Veiculo. Ele também não era muito dado a prisões, mas falava grosso e se impunha! Clovis, culto, bom gosto para musica, respeitado, mostrou-me todos os bons alambiques da redondeza; desde o “Galo Branco” em Socorro, “Engenho do Barreiro” em Lindoia à famosa “Moreninha”, na divisa com Jacutinga! Não que abraçássemos com tanto ardor a sedutora Severina do Popote, mas ‘uma garrafa de boa cachaça abre facilmente qualquer porta em Belo Horizonte’…!

Foi na Capital das Malhas que no final de uma ensolarada manhã eu ouvi uma das frases mais significativas – e mentirosas – da carreira; depois de meia dúzia de prosa com o delegado Watson Vieira Pinho – e ouvir o que não esperava… – o delegado regional que havia me mandado pra lá a toque de caixa sem sequer olhar na minha cara, chamou-me ao gabinete e disse solenemente:

– Vou te levar de volta para Pouso Alegre… “Preciso de você para dar um pouco de dignidade à Policia Civil na cadeia de lá”.

Eu naturalmente agradeci – o falso elogio – e repeti mais ou menos o que dissera em seu gabinete no dia 06 de outubro, após o sepultamento do Inspetor Angelo…

– Sou funcionário do Estado de Minas, chefe… Daqui até Itacarambi está bom p’ra mim! Porém, vou trabalhar mais trinta e cinco dias, sair de férias em janeiro e me aposentar…!

Aposentei, voltei ao trabalho e exato um ano e meio depois, o mesmo delegado regional, depois de me mandar novamente “à toque de caixa” para Santa Rita, teria dito em reunião com a tiragem…,

– Fulano é um safado! Ele estava denegrindo a imagem da policia na cadeia!

Se mereço ou não os epítetos, tanto o elogioso quanto o injurioso, perguntem ao delegado Chefe de Departamento Jose Walter da Mota Matos, responsável pela sindicância! – Que eu fiz questão que fosse instaurada.

Mas essa já é outra historia! O alvo desta breve crônica é o ‘quarteto’ Neco Paturi, inadimplente de pensão alimentícia, seu pai Roberto e o facão Tramontina, o netinho ‘x9’ chorão e meu fiel ajudante Nilson Pé-de-couve…

Ao abrir a porta da delegacia na manha do dia 26 de novembro de 2004, há 35 dias da sonhada aposentadoria, deparei com um rapaz que dizia saber do paradeiro do depositário infiel, com o qual tinha uma pendenga de carro pago com cheque sem fundos. Era preciso levar o depositário às barras da justiça para desembaraçar o imbróglio! Tomamos café e fomos a um sitio no município de Jacutinga. Eu, o interessado na prisão e meu parceiro Nilson “Bate Pau”, policial “ad-hoc” – desculpe o termo cacófono – cagão que só ele! Quando descíamos a MG 459 ele começou choramingar;

– Ô Chips, é melhor a gente pedir apoio ao pessoal de Ouro Fino… O velho é perigoso!

Como seguro morreu de velho, talvez ele tivesse razão! Mas enfrentar toda a burocracia às oito e meia da manhã para mobilizar uma equipe de policiais de outra Comarca para prender um depositário infiel!? Achei meio esdrúxulo. Além do mais, nem tínhamos certeza da precisão da informação. Sem contar que o tempo poderia conspirar contra nós! Quando chegamos ao portão da chácara meu ‘intrépido’ companheiro sugeriu:

– Ele me conhece… Se ele me ver vai querer fugir. É melhor eu ficar aqui na entrada… Se correr para cá ‘eu pego ele’!

Entrei no jardim da bela chácara, ouvi ruídos de esmeril e não demorei avistar meu procurado. Ele estava numa casinha de ferramentas amolando um imenso facão tendo ao seu lado um garotinho de 4 ou 5 anos. Quando levantou os olhos do esmeril, eu e o credor estávamos há dois metros dele. Sabendo do que se tratava, Roberto continuou prolixamente amolando o facão ao som estridente do esmeril que soltava faíscas para todo lado. Quando se deu por satisfeito, desligou o motorzinho e saiu lentamente da casinha com o facão ainda quente em minha direção, testando o corte da lamina…! – Sutil ameaça! – Levantei levemente a barra da calça deixando ver o cabo do trezoitão e falei;

– Facão Tramontina pega fio fácil, né? –

Sem ouvir qualquer resposta ou pergunta, acrescentei:

– Sr. Roberto, estou precisando do senhor lá na delegacia de Monte Sião… – E pedi a ele que colocasse o facão – agora com o corte azulado – sobre uma bancada de madeira, ao mesmo tempo em que estendia-lhe o par de pulseiras de prata. Por uma razão que só vim compreender depois, ele não questionou. Parecia ter pressa de ser preso! Quando eu coloquei-lhe as algemas o garotinho que estava a seu lado desandou a chorar e perguntou;

– Você vai prender meu pai também…?

O “pai” a quem o garotinho se referia, deduzi de imediato, devia ser Neco Paturi, muito mais urgente prender do que o avô Roberto! Neco Paturi era um tremendo caloteiro de Pensão Alimentícia. Se pensão fosse luz! ele dormia no escuro há mais de ano! O jovem de 26 anos vivia fugindo da PM como o vampiro foge da réstia de alho! Para escapar das pulseiras de prata e continuar sem prover a prole, ele não respeitava fronteiras!  Certa vez pulou do terceiro andar do apartamento da mãe atrás do cemitério, numa laje, dali saltou para um quintal e conseguiu dobrar a serra do cajuru – contavam os boateiros de plantão!

Em nenhum momento estivéramos pensando na possibilidade de encontrar por lá o ‘caloteiro de pensão’. No entanto, ao ouvir a pergunta do menino; “prender meu pai também”, a ficha imediatamente caiu. Deixei o velhote de uns sessenta anos, já peado, aos cuidados do credor e pedi ao garotinho que me levasse para a cozinha da casa a pretexto de beber um copo d’água. Ele me acompanhou relutante. Um tanto por sair de perto do avô, outro tanto arrependido da pergunta que fizera! Apesar da tenra idade, já era ‘cobrinha criada’ e percebeu que cometera um vacilo! Apelei para a psicologia…

– Em qual quarto seu pai está…? – Perguntei com fingido desinteresse.

Aos quatro anos, filho de peixe, peixinho é… O garotinho já estava escolado. Continuou rezingando e não disse nem uma palavra que me levasse a seu pai. Mas a pergunta que escapou lá fora na porta da oficina fora suficiente. Vasculhei quase todos os cômodos da casa… Sem sucesso! Quando chequei no ultimo quarto que ficava à oeste, portanto ainda com as sombras da manhã, percebi que debaixo da cama estava mais escuro do que o normal. Mas não identifiquei o fujão. Para evitar sustos e incidentes, afinal Neco Paturi, embora não fosse criminoso, era procurado pela justiça! Ele poderia tentar levantar voo! Ou pior… Poderia usar algum instrumento – talvez um revolver enferrujado calibre 32! – contra mim para evitar a prisão… Cerquei-me de cautela! Durante todo esse tempo meu ‘eficiente’ parceiro continuava na estrada, protegido atrás de uma moita de cipreste! Ele não se dignara a descer à chácara nem para saber se eu ainda estava vivo! Telefonei pra ele! Quando ele chegou, determinei que se posicionasse do lado de fora da janela e acrescentei em tom alto e claro;

– Quando eu levantar o colchão da cama, atire no primeiro ‘objeto’ que se mover!

Eu estava preparado para ver a cara do sujeito surgir debaixo da cama. Mesmo assim o suspense me traiu… Quase disparei o trabuco de susto quando vi aquele baita homem magrelo estirado de costas no canto do quarto! Matamos dois coelhos com uma só cajadada naquela manhã. Prendemos pai e filho. De quebra levamos junto o neto pirralho chorão delator. Tentei pagar pra ele um sorvete em agradecimento por ter entregado de bandeja a cabeça do pai… Mas ele, desde que percebera o vacilo, ficou emburrado e não abriu mais a boca… Exceto para choramingar!

O liso Neco Paturi, que até então eu não conhecia, passou mais de uma semana no X-1, esperando seu advogado selar um acordo com a ex para quitar os débitos alimentícios. Ele era comerciante informal de carros e motos… Precisou desfazer de alguns para pagar a pensão devida há mais de ano!

A bela Monte Sião, cujos ciprestes do jardim central, carinhosamente bem podados e cuidados, imitam capivaras, elefantes, ursos, ‘paturis’  e outros bichos, marcou época…!