Jeff… O Homem do Chapéu Furado

PENÚLTIMO CAPITULO

      Havia meia hora que o sol deixara de pratear as planícies que circundavam Carson City. A noite baixara lentamente seu véu negro turvando a pradaria. A cidade estava silenciosa. Uma ou outra pessoa atravessava a rua de vez em quando, pensativa, como se estivesse pressentindo algo de ruim. Poucos sabiam que aquela rua larga e poeirenta estava para ser palco de cenas brutais, nauseantes. Ou talvez gloriosas, caso os homens da lei conseguissem derrotar os criminosos. Na delegacia Jeff, com o pés sobre a mesa, abastecia seus colts e um rifle.

– Você acha que eles virão rapaz? – Indagou Morrison preocupado.

– Certamente. Com seu nome de Guarda Rural texano e o sobrenome que eu coloquei no bilhete, o coronel dará atenção. Eles devem estar a poucos milhas daqui. Antes que eu me esqueça, quando mesmo será o dia ‘12’?

– Daqui a cinco dias. Por quê?

– Nesse dia eu tenho um compromisso…

– Pode-se saber que tipo de compromisso?

– Coisa sem importância, a não ser pra mim. Coisa pessoal…

– Você me parece tão próximo e as vezes me parece tão distante, tão enigmático. Eu me pergunto se você é um anjo enviado de Deus para acabar com o mal em Carson City, ou um diabo que veio mostrar que é o maior.

– Quanta asneira Morrison. Sou apenas um homem como tantos outros, que não concordam com certas coisas e tentam mudá-las. Vamos ao saloon tomar um trago para limpar a garganta e relaxar.

Jeff mal acabou de virar o copo na boca, Morrison, que havia sido detido na esquina e ainda estava na varanda do saloon, alertou:

– Estão chegando!

– Os ‘nossos’ ou ‘eles’?

– ‘Eles’…

Jeff chegou até a porta e os viu na entrada norte da cidade. Eram dezenas. Todos montados avançavam passo a passo pela rua principal.

– Quem for pela lei e ordem e desejar defender suas famílias, pegue suas armas e lutem – disse o xerife às pessoas que estavam no saloon.

Jeff sorrateiramente procurou um lugar estratégico que lhe servisse de abrigo e favorecesse a visão para a artilharia. Rapidamente se alojou no terraço do prédio que ficava quase em frente a Delegacia. Os Bandidos chefiados por Richard pararam em frente a Delegacia. Um deles gritou:

– Xerife… Temos um acerto de contas… Carson City está muito pequena pra nós!

Não obtendo resposta, Richard fez um aceno e no mesmo instante mais de vinte rifles cuspiram fogo na direção do escritório da justiça, estraçalhando a vidraça, arrancando lascas e abrindo buracos na parede de madeira. Nesse instante Jeff e Morrison, em posições diferentes, entraram em ação. Os primeiros tiros de Jeff fizeram três cadáveres.

– Cuidado! Eles estavam nos esperando! Espalhem-se… – gritou um dos líderes do bando.

Imediatamente os bandoleiros deixaram suas montarias para se abrigarem da chuva de balas despejadas pelos dois policiais e mais alguns cidadãos que atenderam ao apelo de Morrison. Jeff mandou mais alguns para o inferno e mudou de posto. Morrison já havia derrubado três. Dois capangas de Richard esgueiraram silenciosamente, um de cada lado do saloon, surgiram repentinamente na frente e pegaram dois dos defensores da lei desprevenidos. Alvejaram e foram imediatamente alvejados por Morrison. Em seguida um dos recrutados tentou atravessar a rua na direção da barbearia e foi atingido por Richard. Morrison e Jeff se juntaram.

– A coisa está preta rapaz. Acho que somos menos de meia dúzia contra mais de trinta…

– Um a menos – emendou o delegado vendo mais um recruta exalar um gemido após receber uma descarga mortífera de um dos bandidos.

– Pior do que eu pensava.

– Não desanime meu velho. Ele eles devem estar chegando… E eu tenho mais de trinta balas no cinturão. Dá para acertar uns quinze deles. Vamos nos separar novamente.

As munições dos dois logo se esvaíram. Eles voltaram a se juntar.

– Só tenho duas balas no colt rapaz.

– Eu só tenho uma. Quantos mandou para o inferno nos últimos dez minutos

– Três… E você?

– Acho que derrubei seis. Eles estão bem entrincheirados. Vamos recuar cautelosamente parra o sul para que não percebam que estamos sem munição.

Os bandidos também eram astuciosos, e logo petrceberam a manobra do inimigo para ganhar tempo.

– Eles não atiram mais. Certamente devem estar sem munição. Vamos encurralá-los na entrada da cidade. Vamos sair todos de uma vez na rua para amedrontá-los – orientou Sancho.

Logo, mais de vinte bandidos caminhavam pelo meio da rua principal, de armas em punho, a fim de massacrar os homens da lei.

– Sancho, tome a direção do pessoal e siga devagar enquanto vou molhar a garganta no saloon. Mas não os mate… Quero Jeff vivo! – falou Richard.

– Apareçam xerifes – gritou Sancho Perez à frente da turba assassina – a festa acabou. Sei que estão sem munição… Deem as caras para conversarmos.

– Por que não vai ver se estou tomando um trago no saloon – respondeu Jeff de longe, tentando ganhar tempo.

– É um homem de coragem rapaz. Não é qualquer um que consegue fazer piada numa hora como essa. Estão prestes a virar pasto de abutre. É mesmo uma pena que você não viva para contar essa façanha a ninguém.

Jeff deu uma olhada em volta de si no beco onde estava, refletiu por um instante e se encaminhou para o centro da rua com o revolver no coldre.

– Hei….você quer se suicidar? – interpelou Morrison, sem entender a atitude de seu auxiliar.

– Hei muchachos, o gringo é mesmo valente. Vejamos como ele dança.

No instante seguinte uma saraivada de balas rodeou as botas do jovem delegado. O luar turvou-se repentinamente e a temperatura elevou-se na mesma proporção. Um projétil arremessou longe o chapéu preto de Jeff.

– Que tal a pontaria de Sancho, gringo? – gritou sarcástico como sempre o mexicano dando uma gargalhada!

Nesse instante.

– Atacaaaaarrr…

Aturdido com o grito, Morrison virou-se e viu surgir na curva e entrar na cidade um pelotão da Cavalaria Americana com mais de quarenta soldados empunhando seus fuzis. Jeff, tal qual um tatu-bola, rolou para um beco procurando abrigo, enquanto os bandidos de Sancho Perez eram alvejados. Surpreendidos com o ataque fulminante dos soldados, sem saber de onde vinham, a maioria tombou no meio da rua. Richard acabara de sair do saloon quando o tiroteio teve início. Sem entender o que estava acontecendo, agiu por instinto e misturou-se às sombras. Aproveitando a confusão que reinou por alguns minutos, Sancho Perez infiltrou-se pelos becos sombrios da cidade e desapareceu. Seus subordinados, sem tempo para se abrigarem, tentaram rechaçar os tiros de fuzis do defensores da pátria, mas sucumbiram um a um antes de chegarem a um esconderijo. Em poucos minutos mais de vinte corpos sem vida estavam estendidos no meio da rua poeirenta de Carson City. Cessado o tiroteio, Morrison foi o primeiro a aparecer.

– Obrigado Tenente. Vocês chegaram na hora exata. Se demorassem mais alguns segundos esta cidade perderia um velho xerife e o melhor delegado do oeste.

Antes que o casaco azul pudesse exclamar algo, uma cena chamou sua atenção. Jeff saiu do beco tranquilamente carregando um pequeno pistoleiro pelas calças, o qual esperneava e praguejava sem parar. O delegado atirou o homenzinho aos outros bandidos desarmados, apanhou seu chapéu a alguns passos, olhou para mais um orifício na copa e exclamou:

– Realmente, o homem que inventou o … hei Peter Lane?! – falou reconhecendo o comandante do pelotão.

– Jeff Hobson?! … – exclamou o tenente.

– Como estão os ossos meu amigo? Há quanto tempo não o vejo.

– Vai indo, vai indo… Seria você o ‘melhor ajudante de xerife do oeste’?

– Há quem o diga … – desdenhou de si próprio o delegado, sacudindo a poeira da roupa.

– E o que foi feito do posto de Capitão dos Guardas Rurais do colorado? – indagou.

– Ora, vamos conversar no saloon.

O velho xerife Morrison que já estava atônito com os acontecimentos ficou ainda mais abobalhado com o rápido diálogo dos dois rapazes.

Foram os três para o saloon enquanto o sargento reorganizava o pelotão e tomava as medidas de praxe quanto aos poucos bandidos que sobreviveram.

– Sr. Lane, faça este bastardo me dizer quem é ele, antes que eu lhe entorte o nariz – disse Morrison, sentindo-se enganado pelo seu ajudante.

– Como… você não o conhece? – Estranhou o Tenente.

– Calma senhores … Eu explico:

Entre um gole e outro de cerveja, Jeff contou quem era e o que viera fazer em Carson City. Só não disse que era irmão de Doris.

– Bolas – disse o xerife. Acho que estou ficando velho. Jamais imaginaria tal coisa, apesar de que você as vezes me parecia meio estranho.

– Você não tem culpa meu velho… Ninguém aqui sabe que sou filho de Rock Hobson.

– O Stam sempre disse que vocês se assemelham nas atitudes…

– Mera coincidência. Nem ele conhece esse segredo.

– E agora, que pretende fazer? – Interrompeu o Tenente Lane. Os bandidos que assolavam a região partirão amanhã para o forte e de lá para a Penitenciaria. Você vai voltar para o Colorado?

– Não… Não por enquanto. Os assassinos de meu pai ainda estão vivos.

– Vingança não é digna de uma pessoa como você.

– Eu não vou caçar vingança. Os assassinos virão a mim.

– Como sabe?

– Já ouviu falar de Brad Macgree e George Sanders?

– “Os Bodes”? Os dois maiores caloteiros do Kansas?

– Eles mesmo. São os dois que comandam tudo que não presta aqui na região. Os mais traiçoeiros coiotes trabalham para eles. Se você os conhece bem, deve saber que eles nunca foram vencidos em nada. Daí o apelido de “Bodes”, cabeças duras e persistentes. Eles não conhecem a derrota. Portanto virão atrás de mim para me liquidar assim que você for embora com seus homens.

– Quer que eu fique para ajudá-lo?

– Não… agora são poucos. E isso é um caso pessoal. Eles liquidaram meu pai… e virão me matar. É justo que eu me defenda… sozinho!

 

*** A aventura de “Jeff, o homem do chapéu furado”, em Carson City, termina na segunda-feira, 14.

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