Jeff… O Homem do Chapéu Furado

CAPÍTULO  IV

 

Passava pouco de onze da noite quando Jeff e seu prisioneiro chegaram a Carson City. O saloon de James ainda estava bastante movimentado. Dois cavaleiros andando passo a passo àquela hora na rua principal da cidade, um deles com uma estrela no peito, chamaria a atenção. E foi o que aconteceu. Logo a porta do saloon estava cheia de curiosos. Alguns os seguiram fazendo perguntas e comentários:

– Quem é o prisioneiro?

– Acho que é o Smith, capataz do Brad Macgree…

– O que será que aconteceu?…

– Não sei… mas isso vai dar confusão!

– Vamos para a Delegacia.

Morrison cochilava tranquilamente em sua cadeira. Ao ser despertado pelo rumor que vinha da rua, empunhou um rifle e saiu à porta resmungando:

– Que alvoroço é esse? Não se pode cochilar em paz? … Hei, é você Jeff?

– Olá Morrison… trouxe-lhe um presente.

– Entre rapaz e me conte o que foi que aconteceu. Quem é este que você traz amarrado desta maneira?

– É um dos que tentaram nos assaltar, mas foram rechaçados. Eliminamos alguns deles e outros fugiram. Consegui pegar este vivo… Até agora ele não falou nada. Amanhã vamos arrancar sua língua. Mas deixe-me relatar os fatos com detalhes pela manhã… Agora eu preciso de um bom bife e um travesseiro. Estou no fundo do pito!

No rancho Barra Y o clima estava negro para Ted Slim e seus homens que restaram do frustrado assalto.

– Vocês não valem nada! São uns palermas! Imagine doze profissionais serem abatidos por cinco amadores! Não. Vocês não deviam ter voltado, são uns maricas, deem-me um rifle… vou fuzilá-los agora mesmo! – Vociferava George esbofeteando Ted.

– Calma George – interveio Brad. Matá-los não conserta o fiasco. Ted é um dos melhores homens que temos. Se foram derrotados, devem ter um motivo para isso. Vamos… – Foi interrompido por um dos seus homens que chegava de Carson City.

– Patrão, Smith foi preso…

– O que foi que?…

– Eu estava no saloon quando ele chegou escoltado pelo forasteiro-delegado e foi levado pra cadeia… – disse o pistoleiro esbaforido.

– Está vendo como eu tenho razão, Brad? Eles são uns moloides! Como foi acontecer isso Ted?

– Aquele xerife infernal deve ter alvejado seu cavalo a fim de pegá-lo vivo – justificou o pistoleiro.

– Sim… E agora ele nos denunciará.

– É preciso se controlar, George… Você nunca foi derrotado antes, por isso os culpa. Em vez de ficar esbravejando, ajude-me a formar um plano para libertar ou silenciar Smith antes que ele dê com a língua nos dentes e nos denuncie. Embora isso não nos afete, pois ninguém daria ouvidos a um bandido qualquer que falasse de nós, é melhor evitar falatório. Não queremos esse forasteiro tão ‘terrível’ na nossa sombra. Já basta o trabalho que ele vem nos dando.

– O que você sugere?

– Deixe-me pensar…

– Seria melhor se eliminássemos antes de tudo o xerife-forasteiro – sugeriu Ted.

– Concordo – apoiou Brad. Mas como o faremos? Vocês já tentaram uma vez e falharam.

– Que tal se Richard o provocasse para um duelo?

– Está louco? Meu filho maneja bem as armas, mas pelo que falam deste pistoleiro, Richard não teria nenhuma chance. Richard está noivo de Doris e tenho certeza que ela não gostaria de ficar viúva antes mesmo de se casar.

– Espere Brad. Talvez possamos pôr em prática esse plano… acrescentando-lhe alguns detalhes.

– Detalhes? Intrigou-se Brad.

– Sim. Se Richard o provocar em público, muitos curiosos estarão presente para presenciar o duelo. Alguns destes ‘curiosos’ dispararão contra Jeff segundos antes dele sacar suas armas…

– Parece razoável. Esses curiosos serão nossos homens, tocaiados … – concluiu Ted, que havia dado a ideia.

– Você está começando a usar os miolos que tem dentro desta cabeça dura, Slim. Torça para dar certo.

Na manhã seguinte na delegacia.

– … E então nós estávamos a umas quinze milhas de Spring Benson, fora de perigo, eu resolvi voltar, pois tinha que trazer o prisioneiro – relatou Jeff.

– Você agiu da melhor maneira. Mas como sabia que eles estavam de tocaia?

– Eu não sabia… eu deduzi.

– Deduziu?

– Sim … lembra que antes de ontem eu lhe falei que havia descoberto algo interessante? Pois bem…

Após relatar sua descoberta a Morrison, Jeff perguntou:

– O que tem a norte de Carson City? Algum rancho, rio, vale…

– Não sei não. Ainda não tive oportunidade de explorar as proximidades.

– Entendo. E a noroeste? Também não sabe?

– A noroeste… bem, a umas quatro milhas da estrada principal está localizado o rancho de George e Brad.

– Interessante… – falou Jeff olhando para longe. A trilha que eu segui se divide em duas a uma certa altura distante da estrada principal; uma segue direto, provavelmente para o esconderijo dos ladrões. A outra segue na direção do rancho deste tal Brad. Teria alguma ligação…

– Não sei, e espero que não. Eu os visitei uma vez e eles foram muito amáveis comigo. Além do mais não é bom tê-los como inimigos. Eles têm muitos homens a seu serviço, como já lhe disse.

– As aparências nunca dizem a verdade. E quanto ao número de homens deles, é indiferente. Se são ladrões meu colt lhe ensinará o caminho da lei – brincou Jeff.

– Temos que interrogar nosso prisioneiro. A partir daí faremos umas investigações. Agora vamos aproveitar enquanto a bóia está quente. Vamos almoçar.

– Ótima ideia Morrison.

Eram três da tarde. Jeff, Morrison e mais dois cidadãos de Carson City jogavam cartas numa mesa do saloon, enquanto tragavam uma preguiçosa cerveja. A um dado momento várias sombras interromperam os raios de sol que penetravam pela porta da frente do saloon.  Uma das sombras era uma figura alta, chapéu de couro, paletó escuro cobrindo parcialmente o par de pistolas que trazia na cintura. A ‘sombra’ lentamente avançou o saloon até o balcão e ganhou voz, dizendo:

– Boa tarde senhores. Um whisky pra mim e cerveja para os rapazes…

– Este é o jovem Richard Sanders, filho de George – confidenciou Morrison a Jeff.

– Hum…

Ao receber a bebida Richard dirigiu-se a mesa dos homens da lei.

– Olá xerife. Matando o tempo?

– Olá rapaz. Não o convido a sentar-se por falta de lugar…

– Não se incomode. Saber ficar em pé é uma virtude… minha. Então esse é novo auxiliar de xerife aqui, hein. Dizem que é terrível com os colts. Tem sorte hein, pistoleiro! Mal chegou à cidade e já arrumou um meio de enganar os trouxas – provocou gratuitamente Richard, que não precisava fazer força para parecer cínico e sarcástico, dirigindo-se Jeff.

– Duas ‘damas’ e uma trinca de ‘valetes’ – disse Jeff, ignorando totalmente o provocador.

– Está bem… Você ganhou novamente – falou o parceiro ao lado.

– Atrás de uma estrela de prata é mais fácil agir, não é mesmo forasteiro? – Continuou Richard insolente.

– Eu não disse que as aparências não condizem com a verdade, Morrison! – disse o auxiliar, tranquilo, juntando as cartas do baralho.

– Você parece que está com medo de abrir a boca e dizer besteiras pistoleiro?… – Prosseguiu o jovem, já se exaltando com a indiferença de Jeff, que desdenhava da sua presença.

– Você esqueceu de dizer-me algo Morrison – falou Jeff.

– O que rapaz?

– Que aqui na cidade maricas tagarelas costumam frequentar o saloon!

Silencio completo. Quem olhou para o jovem Richard percebeu que os músculos do seu rosto se contraíram. No momento em que Jeff esticou o braço para pegar uma carta sobre a mesa, Richard entornou lentamente o líquido cor de cobre do seu copo sobre a mão do delegado. E emendou:

– Carson City é proibida para pistoleiros vagabundos da sua laia. Por que você não dá o fora?

Jeff limpou calmamente a mão esquerda molhada na toalha verde da mesa de carteado, pegou com a direita a caneca de chopp, levou lentamente à boca, porém, ao invés de beber, atirou o liquido dourado no rosto do provocador retrucando:

– Por que você não veste uma saia e vai ajudar sua irmã fazer tricô?

Quem esperava uma reação intempestiva de Richard, se enganou. Fingindo uma calma que não possuía, ele lentamente retirou um lenço do bolso da camisa, enxugou o rosto molhado da cerveja e falou pausadamente:

– Espero-o daqui a meia hora na rua principal. Leve apenas os colts. Mas antes… passe pelo agente funerário e encomende seu caixão!

Ao se retirar do saloon o furioso rapaz, que afinal havia atingido seu objetivo, deu uma olhada a sua volta. Três homens lhe fizeram um pequeno sinal. O sutil gesto passou despercebido aos frequentadores, já prevendo um novo embate na rua. Mas não passou despercebido a Jeff, o qual não perdia um movimento no saloon. Apesar da incredulidade dos presentes, o provocado, no entanto, continuou jogando pôquer tranquilamente com Morrison e seus parceiros. Enquanto distribuía as cartas aos jogadores, ele falou:

– Xerife, quando o espetáculo começar, fique de olho na “platéia”! O duelo é uma cilada. Há aqui alguns assistentes que não se contentarão em apenas assistir… Eles vão querer participar também do espetáculo!

– Deixe-os pra mim. Mas evite matar Richard… ou teremos complicações das grossas!

Passados cerca de trinta minutos Jeff saiu à porta do Saloon bocejando e verificando as armas. Na hora determinada pelo valentão o dois estavam no meio da rua, a quarenta passos um do outro. Ao longo da rua, sob as marquises, uma pequena multidão perfilava, tensa, para assistir o duelo. Jeff, perscrutando tudo, especialmente as esquinas e telhados, parecia sereno. Lentamente pregaram os olhos um no outro. O desafiante tomou a iniciativa. Após alguns segundos de tensão, Richard levou a mão ao colt! Jeff, no entanto, foi mais rápido! Tirou a arma do coldre e antes de levantá-la e fazer fogo, ouviu o som de cinco disparos! Compreendeu imediatamente o que se passava mas manteve a concentração no alvo à sua frente. Pressionou o gatilho endereçando o primeiro projetil à mão do desafiante, desarmando-o. O segundo arrancou-lhe o chapéu; o terceiro arrebentou a fivela do seu cinturão, deixando cair sua calça… o próximo fez um buraco na lateral do colete de couro. O último projetil atingiu o centro de um medalhão de ouro que o filho do rancheiro trazia pendurado no peito…

Após neutralizar qualquer tipo de reação do desafiante, Jeff depositou o trabuco descarregado no coldre e sacou o outro, disparando os seis tiros entre os pés do rapaz fazendo-o dançar miúdo no meio da poeira. O espetáculo durou poucos segundos, e expôs o jovem Richard ao ridículo.

Os curiosos que presenciaram o rápido duelo não conseguiram conter o riso diante da cômica cena. Menos uma pessoa! Do alpendre da sua casa, no andar superior do banco do seu pai, Doris Heb olhava para o noivo com vergonha e desprezo… E para Jeff com ódio!

Apesar da notoriedade de espetáculos semelhantes nas pequenas cidades do velho oeste americano, os cidadãos de Carson City e os forasteiros que por ali passavam naquele dia, nunca tinham visto alguém com tamanha agilidade com os colts. Se um homem com aquela rapidez e coragem estava do lado da lei, isso inspirava segurança nas pessoas de bem.

A multidão esteve tão empolgada com o duelo que não percebeu de onde vieram os cinco primeiros tiros. Só agora notaram os três corpos, sem vida, despencados dos prédios vizinhos, estirados na poeira da rua e o xerife recarregando seu colt.

– É, rapaz… você tinha razão. Eles queriam ser atores, mas veja o resultado! Dois ainda conseguiram apertar o gatilho, mas as balas saíram sem direção – comentou Morrison se aproximando de Jeff.

– Hum… Você também é bom de pontaria! – salientou Jeff.

– Precisamos sobreviver, ora…

 

*** A aventura de Jeff, o homem do chapéu furado em Carson City, continua na próxima quinta-feira,13.

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