‘Um puta’ bandido e ‘um porra’ policial

Ao voltar de três meses de ‘ferias premio’, por castigo – pois na concepção da chefia eu não deveria tirar férias! – fui mandado pra rua… Para trabalhar. O que aliás foi o mesmo que jogar o sapo na agua… Eu estava morrendo de saudade da rua! Na ocasião eu ainda conservava meu HO 38, mais enferrujado do que niquelado, que o inspetor Angelo havia me depositado informalmente em 1981. Algemas no entanto! nem pensar! Se tivesse que prender alguém eu que me virasse com o cinto, cordas, embiras ou qualquer coisa que servisse para imobilizar as mãos do meliante!

Numa bela manhã de outono, subia eu a Prefeito Olavo Gomes de Oliveira, quando na curva do japonês o tirocínio deu o alerta… Defronte o Posto Pantanal descia um sujeito de bicicleta! Ao avistar o golzinho preto & branco 6252 na curva, o sujeito que vinha na banguela puxou a aba do chapelão de palha na cara tentando cobrir o rosto. Meu parceiro Rogerinho, com poucos meses de policia e seu sotaque paulistano nem se deu conta do ‘detalhe’. Mas eu, policia ‘véio’, notei o gesto discreto do chapeludo e mantive os olhos grudados nele. Quando passou por nós ele deu uma discreta olhadinha…! para conferir se estavam procurando por ele ou talvez apenas para ver se eram policiais conhecidos! Diminui a marcha e continuei com os olhos grudados no chapeludo, pelo retrovisor…! Defronte o Vinicius Meyer ele deu uma discreta olhada para trás…! Estava devendo !!! Antes que ele virasse a próxima esquina para entrar no Costa Rios, eu invadi a pista contraria, passei pela borda do posto do Armando e desci de volta em direção ao aterrado! O moço – que eu não sabia quem era – tinha culpa no cartório! Teve inicio uma curta, mas alucinante perseguição. O chapeludo entrou na primeira esquina! Eu entrei na segunda…! Mesmo assim, apesar de estar pedalando, ele tinha vasta dianteira e saiu na minha frente na esquina da primeira rua do Costa Rios paralela à Avenida Ver. Antônio Costa Rios…! Emparelhei com ele.

O que aconteceu nos minutos seguintes eu nunca soube definir se foi cômico ou trágico! Quando virei a viatura cantando pneu e iniciei a perseguição, naturalmente comentei com o novato Rogerinho que se tratava de um suspeito em potencial…! A sacolinha que ele levava presa ao guidão da bicicleta na mão esquerda poderia ser um tijolo de maconha, uma res furtiva qualquer! Ou então o chapeludo era fugitivo! Por isso, tão logo iniciamos a perseguição, Rogerinho empunhou o trezoitão… Quando emparelhei, ele optou pela minha esquerda… Aí é que estava o perigo! Enquanto eu tentava ‘fechar’ o biker fujão, Rogerinho gritava histericamente com seu sotaque paulistano:

– Para mano! Porra meu, não tá vendo que é cana, caralho… Para senão eu vou atirar, meu! Porra mano!

Em outra circunstância eu daria gargalhada do palavreado do parceiro, mas naquele momento não dava… Enquanto dava ordens para o bandido como se estivesse numa ruela centenária da Mooca, Rogerinho sacudia sem parar o trabuco para o fujão! O problema é que entre ele e o fujão estava eu ao volante! Mais precisamente minha cabeça! Enquanto ouvia:

– Porra meu, tá maluco mano! Eu vou atirar caralho… – Eu podia ouvir o roçar do cano do 38 niquelado ora na minha orelha, ora nos meus cabelos!!! O clímax da perseguição aconteceu na penúltima esquina do bairro antes de virar para entrar no Aterrado pela porta dos fundos! Quando ele vacilou para entrar à esquerda eu encostei o para-choque do gol na traseira da bicicleta e o joguei ao chão! Neste momento Rogerinho quase se apoiou no meu ombro com o revolver encostado no meu peito, para alvejar o fujão! Se ele puxasse o gatinho, pelo menos meu bigode ficaria chamuscado…!

Disposto a não se deixar prender o suspeito levantou do chão e correu na direção contraria! Aliás ele mal tocou no chão quente do asfalto! Tive tempo apenas de retirar a chave da ignição e saí fungando no seu cangote! Apesar de cansado, pois pedalara freneticamente os últimos duzentos ou trezentos metros, o suspeito era bem mais alto do que eu e, portanto suas pernas lhe davam vantagem na corrida. Alguns metros atrás de mim vinha meu intrépido parceiro desfiando a mesma ladainha com sotaque paulistano…;

– Porra, meu, não respeita policia não, caralho? Vou atirar, maluco… Vai parar ou não?

Parou! Não de medo das ameaças do policial ‘mano’, mas parou! Parou quando eu coloquei uma das mãos suadas na sua…

 

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