Pedro Pedreiro foi mais uma vítima do chicote do misterioso “Zorro da Zona Boemia”!
“Início da madrugada de uma quarta feira quase morta. A única rua da cidade que ainda mostrava sinais de vida era a Davi Campista. O outono ainda era um adolescente, mas o frio do inverno naquela época não esperava a estação oficial para bater na porta… e na pele!
Pedro Pedreiro desembarcou de um caminhão de entregas perto do Hotel Cometa e seguiu na direção do infante bairro Jardim América, que não tinha ainda quarenta casas. Ao passar pelo muquifo, quero dizer, boteco do João Natal, no início da Silviano Brandão percebeu, pela tênue luz que escapava pela metade da porta de aço arriada, que o boteco estava aberto. Espiou por baixo da porta e pode ver um sujeito dormindo debruçado sobre uma mesa, certamente embalado por Severina do Popote, e um casal se esfregando no balcão, cada um com um copo e um cigarro na mão enquanto o baixinho e narigudo João Natal cochilava na outra ponta do balcão com um radinho chiando ao pé do ouvido!
Pedro Pedreiro entrou e pediu uma cangibrina, para espantar o frio! Tomou três! E rumou para casa! Agora mais animado!
Qualquer cidadão no seu lugar seguiria pela Silviano Brandão até a Campos do Amaral e aí sim teria que cortar a “Zona”. Pelo menos era um trecho curto. Passar pela Davi Campista em horas mortas não era uma atitude muito sensata. A extensa rua no centro da cidade abrigava a velha “Zona Boemia”, antro de perdição! A confusão morava ali. Só de atravessar aquela rua o sujeito chegaria em casa cheirando a perfume de pomba-gira… e seria confusão na certa!
No entanto, depois de três doses da ‘marvada’ no eterno decadente boteco do João Natal, todos os empecilhos saíram do caminho de Pedro Pedreiro. Além do mais, embora fosse casado, e bem casado, com a baianinha Colombina, rechonchuda e de seios fartos, ele tinha inclinação para aventuras e o hábito de tomar umas biritas por ali, apreciando as belas coxas das morenas de vida fácil.
Atiçado pela estonteante Severina do Popote, Pedro Pedreiro resolveu cortar caminho pelo ‘paraíso do baixo meretrício’. Virou a esquina da rua do Rosário e poucos passos depois entrou na rua famosa Davi Campista, rua do amor barato conquistado no balcão… amor de perdição. Se estivesse sóbrio certamente seguiria em frente, apenas passaria pela rua e viraria sem problemas na Campos do Amaral, mas… resolveu tomar mais uma dose da cangibrina na boate da Margarida Leite! Mesmo sabendo que ali uma dose de ‘rabo-de-galo’ custaria quase meio dia de trabalho de servente!
A vitrola tocava uma música muito sugestiva para o local: “Ebrio de Amor”, seguida de “Dama de Vermelho”! A ‘dama’ Margarida Leite, já no crepúsculo de mulher da vida, era agora mulher de comercio… Era a mais rica cafetina da Davi Campista de então. Como ela fora uma das prostitutas mais cobiçadas do lugar, sua casa era agora a mais movimentada. Outrora seu corpo curvilíneo e cheio era a atração… Agora a atração era sua casa! Quem entrasse na sua boate tinha que ficar um pouco mais… E Pedro Pedreiro foi ficando! Pedro Pedreiro – que na verdade era servente – ficou por ali em meio às luzes vermelhas, aspirando a mistura de Água de Colônia com Dama da Noite, Martini, Cuba Libre e ‘suco de gerereba’, ouvindo Pedro Bento & Zé da Estrada, Celinho e Ramon no acordeom! Quando percebeu que o movimento já raleava olhou para o relógio Seiko de pulso – que trazia no bolso por causa da pulseira quebrada – e viu que passava de três da manhã! Preocupado saiu apressado e rumou para casa pensando com seus botões…
– Hoje a Colombina me tira o couro!..
Sim. Pedro Pedreiro ficou sem o couro…
Mas não foi a esposa – a mulatinha de 29 anos, dez a menos do que ele, bem feita de corpo, talvez muito mais bem feita do que dezenas da mariposas das boates soturnas da Davi Campista – quem tirou! Quando Pedro virou a esquina da Francisco Sales o couro comeu! Do nada surgiu um cavaleiro montando um cavalo preto e desceu-lhe a guasca! Enquanto ele tentava se defender do chicote de couro saltando que nem pipoca na panela para lá e para cá sem entender se era um assalto ou alguma vingança pessoal, indagava:
– Pelamordedeus cabra, o que é isso? O que que eu te fiz?
O cavaleiro, cujo rosto ele não podia ver por causa da penumbra da madrugada e da chuva fina de molhar bobo que insistia em cair, e principalmente pelos movimentos do cavalo que parecia tão assustado quanto ele, dizia apenas:
– Isso é hora de estar na rua!? Você não tem família, não tem mulher em casa, não?”
***Pedro Pedreiro foi mais uma vítima do chicote do misterioso “Zorro da Zona Boemia” de Pouso Alegre!