De acordo com a lei brasileira, existe duas situações em que o cidadão pode ser preso mesmo não tendo cometido crime. Trata-se das situações “de Depositário Infiel” e “Pensão Alimentícia”. No caso de pensão alimentícia a lei não deixou a famosa ‘brecha’. Não tem choro nem vela nem fita amarela. Deveu não pagou… Vai em cana!
São as prisões mais insossas que existe. Se existe algum glamour na profissão policial, as prisões por ‘depositário infiel’ e ‘pensão alimentícia’ são as menos românticas! Aliás, estas aguadas prisões cíveis são atribuições do Oficial de Justiça, não da policia. Ao Mandados são encaminhados para a delegacia de policia quando os oficiais não dão conta do recado. Não que sejam prisões perigosas é que às vezes os devedores, para protelar o pagamento do débito ou cumprimento da obrigação, desaparecem, se escondem mais do que Osama Bin Laden, por isso o abacaxi vai parar na mão da policia.
Recentemente um rico empresário de Pouso Alegre – que diga-se de passagem fez fortuna de forma meteórica e inexplicável – contraiu débitos alimentícios com a ex-cara metade. Para protelar o pagamento da pensão ele simplesmente soverteu do mapa. Como se tratava de um cidadão bastante conhecido, os oficiais se uniram na caça ao figurão. Mas não obtiveram sucesso… Ele abandonou os próprios negócios para esquivar-se da divida! Dizem que foi curtir uma praia em Ubatuba onde possui vários imóveis… Só deu as caras em terras manduanas quando conseguiu fazer um acordo vantajoso com a ex.
Depois deste caso teve um outro empresário, não tão bem sucedido mas de boa estirpe, que viu-se na mira dos oficiais de justiça. Os dedicados garotos se uniram para prender o inadimplente a qualquer hora do dia ou da noite. Armaram a arapuca até no interior da Faculdade de Direito onde o caloteiro estudava. Mesmo assim ele conseguiu burlar a lei e evitar a hospedagem gratuita no velho hotel da Silvestre Ferraz.
Em 27 anos de policia ‘convidei’ centenas de inadimplentes de pensão a me acompanhar à delegacia de Policia. Embora todo cidadão seja igual perante a lei, dei a cada um um tratamento diferente, de acordo com o trabalho que me deram. Por exemplo, se o sujeito me recebeu na porta de sua casa e aceitou meu convite ‘diboa’, deixei que ele ficasse no corró da delegacia e até mesmo no banco da Inspetoria esperando seu Advogado fazer a ‘correria’ e conseguisse o Alvará judicial suspendendo sua prisão. No entanto se ele se escondia debaixo da cama, no sótão ou no quintal do vizinho, ele ia direto para o xadrez do velho hotel. Tive alguns casos engraçados.
Em Silvianópolis havia um devedor de pensão mais liso que quiabo. Ele morava com a mãe e uma irmã solteirona. Toda vez que eu ia prendê-lo, por mais rápido que eu fosse ele conseguia vazar. Morava num sitio no bairro dos Vitorinos. A casinha amarela simples, a um metro do chão na beira da estrada, tinha um pequeno curral ao lado, um pomar nos fundos e o resto era pastagem de braquiária. No meio do pasto pelado um frondoso pé de Jatobá que carregava no inverno. A estrada que levava à sua casa há menos de um quilometro tinha uma pequena colina e depois uma depressão. Da colina podíamos ver seu vulto plácido na janela pitando seu ‘paieiro’. Mas quando sumíamos na depressão da estrada ele sumia da janela! Quando chegávamos a casa podíamos sentir o cheiro do cigarro de palha feito de fumo de rolo de Poço Fundo que ele estivera pitando… Mas nunca o encontrávamos! Revistávamos cada palmo da moradia; do piso ao teto, geladeira, fogão, guarda roupa, forro do sofá, quintal, cisterna, pomar e nada do caloteiro. Sem voltávamos com s mãos abanando!
Um dia tive uma ideia para resolver o mistério do sumiço do Marreco… Saltei da viatura alguns metros antes da colina e fiquei observando o sitio de longe, enquanto meu colega descia o tobogã e batia na porta da casa. O caloteiro saiu sorrateiro da janela correu para o quintal atravessou o pomar entrou no pasto aberto atrás do pomar e foi se empoleirar no frondoso jatobá a cem metros dali no descampado, de onde sempre ficava dando risada as nossas custas! Desta vez rimos por ultimo. Desci lentamente a estradinha poeirenta, passei pela casa e convidei o colega para colher jatobá! Chegando ao pé da centenária arvore comecei dar tiros nas frutas marrons que envergavam os galhos… No terceiro tiro o caloteiro gritou lá de cima;
– Pode parar de atirar… O ‘jatobazão’ aqui ainda não está maduro… – E desceu para os nossos braços. Marreco nunca mais deixar de pagar pensão alimentícia!
A prisão dos caloteiros de Monte Sião foi mais sutil e interessante… Mas esta já é outra história…