“O dizimista da Catedral” … Um golpe perfeito

Gatuno mão leve distribui santinhos, quer ser dizimista, se catequiza, se confessa e ….. furta o dim-dim da Catedral

O primeiro adjetivo pejorativo que o cidadão mortal comum profere ao tomar conhecimento de um fato delituoso, com relação ao meliante, é chama-lo de… “Vagabundo”. Quanta injustiça com o pobre meliante!!! O cidadão comum não tem idéia do que se passa nos bastidores da mente criminosa!! De quanto trabalho, de quanta encenação é necessário para enfim o artista colocar a mão leve na rês furtiva, na bufunfa alheia.

O cidadão Umsseteum Caralavada da Silva, moreno claro, estatura mediana, na casa dos cinqüenta anos, cismou de descolar uma graninha ‘quase sagrada’ da igreja e mesmo sem saber quanto iria ganhar, se pôs a trabalhar dias após dia, semana após semana até ver a cor do dim-dim. Passou a freqüentar a catedral metropolitana, participar das missas e numa delas, durante a Semana Santa, fez questão de agradecer uma graça alcançada pela sua neta, que se convalescera bem de um atropelamento, sem seqüelas. Preparado o terreno, na terça feira ele finalmente decidiu lançar a semente ao solo e imediatamente fazer a colheita. Por volta de dez da manha entrou com cara de beato na secretaria da Catedral, deixou com a recepcionista um maço de ‘santinho’ com imagem de Cristo e uma mensagem de agradecimento pela ‘graça’ e foi se confessar com o padre Catarino. Em seguida interpelou a secretaria A. L. de C. M., puxou prosa e insistiu para que ela se lembrasse dele, numa missa da Semana Santa, quando comovido fez o agradecimento. Ao lembrar-se do fato e da fisionomia do Umsseteum Caralavada que queria a todo custo retribuir a graça alcançada tornando-se dizimista da igreja, a secretária dedicou-lhe toda atenção possível e, enternecida chegou mesmo a catequiza-lo. Preenchida sua ficha de dizimista e orientado como proceder, Unsseteum finalmente foi embora, não sem antes desejar todas as benesses do mundo à secretária e recepcionista ali do lado. Voltou vinte minutos depois com um cheque de 120 reais na mão e uma ‘graça alcançada’. E dizia com os olhos brilhantes e nodosos mais ou menos assim;

– Olha, A.L., como Deus é bom. Mal acabei de manifestar meu desejo de ser dizimista, saí na rua, encontrei uma pessoa que me devia e ela me pagou. Quero doar a metade deste cheque para a igreja.

A secretária tentou explicar a ele que não é bem assim que funciona o dizimo, mas não houve como dissuadi-lo de sua bondade e o jeito foi aceitar a doação dos 60 reais. Recolheu o aludido cheque da praça de São Lourenço, abriu a gaveta, ainda que discretamente, pegou o troco e entregou ao beato Unsseteum que, feliz da vida de cristão, mais uma vez se despediu dando graças e glorias!

Minutos depois, ao voltar do cafezinho na copa da igreja, A. L. esbarrou novamente no Unsseteum ao pé da escada e o interpelou despreocupada:

– Ué, você resolveu esperar pela missa da 12:15h?

E o cara lavada, beata e placidamente respondeu que estava indo à secretaria a fim de distribuir mais santinhos. E foi. Passou pela mesa da recepcionista, que bem como outras pessoas ali já estavam familiarizados com sua presença, informou que iria pegar uns santinhos sobre a mesa de A. L., a dois metros da sala onde estava o Cônego Edson. Depois de tanta ladainha, Unssseteum Caralavada já desfilava belo e faceiro nos corredores administrativos da Catedral como se fosse um velho conhecido, como se fosse ‘alguém da casa’. Era hora de dar o bote fatal, de colher o fruto, de usar a mão leve para surrupiar o dinheiro da coleta dos verdadeiros fiéis. Sem que ninguém se importasse com sua beata presença, ele enfiou o braço longo e lânguido através das grades da parede da secretaria, estendeu-o até a gaveta e pegou o envelope com o santo dinheirinho do dizimo, que já estava contabilizado e separado para pagamentos rotineiros. Saiu com cara de santo levando 2.828,87 mais os 60 do troco do cheque de São Lourenço …. e dobrou candidamente a serra do cajuru.

 

Mas Umsseteum Caralavada da Silva nem sempre é tão pacifico. Enquanto preparava o terreno para a colheita do dizimo da Catedral, ele fez outra fita ali pertinho, no Bazar Paula, na esquina da Afonso Pena com Adalberto Ferraz. Lá Ele usou o ‘modus operandi’ de 171 para aplicar o 155, mas acabou usando o “plano B” e aplicando o 157. Ele chegou à loja numa hora estratégica, na hora do almoço. Bem trajado com roupa social, disse que queria comprar um vestido, uma blusa ou talvez uma bata para presentear a esposa em suas bodas de prata. Avançou o balcão, olhou uma peça, pegou outra e acabou escolhendo duas. Pediu a lojista que preparasse o embrulho e disse que ia ao banco pegar dinheiro. Foi e voltou minutos depois com um cartão. Jogou mais conversa fora, elogiou o zelo da lojista, falou da sua alegria pelos 25 anos de casados, observou onde ficava o caixa, onde ficava o banheiro e outros detalhes da loja, de repente saiu novamente e disse que ia comprar papel de presente. Foi mesmo. Voltou minutos depois com a folha colorida.

Após ter certeza de que não havia ninguém por perto da loja, entrou, pegou a jovem vendedora pelo pescoço, tentou tirar-lhe o ar tapando sua boca enquanto arrastava-a para o banheiro… Só que esqueceu de combinar estes detalhes com ela!!

Ao sentir suas mãos grossas, seus gestos rudes e seu bigode grosso raspando sua nuca, a jovem e impetuosa vendedora pensou logo no pior… seria estuprada!!!

Não, não seria.

Já quase sem ar, ela reuniu as forças, esperneou, escapou e conseguiu acertar uma sonora bicuda no sac…, digo, nas ‘coisas’ que ficam onde as pernas do homem se encontram…

Sem esperar tal reação, o pobre Unsseteum também sem ar, que queria apenas levar a lojista para o banheiro para poder sair da loja com o dim-dim sem ser notado e evitar o tradicional berreiro de ‘pega-ladrão’, teve que acionar o “plano B”. Recuperando o fôlego, abriu rapidamente a gaveta, pegou o que havia, cerca de 750 reais e desceu correndo a Adalberto Ferraz até virar a esquina do calçadão.

O larapio que usa a mais antiga das armas… a lábia, para conquistar a confiança de suas vitimas, está com os dias de liberdade contados. A batata está assando pra ele… e está bem quente.

Na verdade, esfriou. Desde então ele nunca mais foi visto em Pouso Alegre. Ou caiu na malhas da lei tentando aplicar o mesmo golpe em outra praça, ou foi excomungado…

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