… E uma hora depois prende o intrujão que trocou a res furtiva por duas corridas de moto!
Voce sabe o que é um intrujão? Não?
Sabe sim. Voce provavelmente até já fez negocio com um intrujão… Só que o conhece por outro nome! Tem muitos por aí alimentando o crime e dando prejuízos para as pessoas…
Conheci o primeiro intrujão na semana do carnaval de 1981 quando fazia estagio na delegacia de policia. Quando perguntei ao inspetor Radick onde estavam os detetives Adão e Luiz Mendes ele respondeu:
– Eles foram ali na Rua São João prender um ‘intrujão’…
Quinze minutos depois Adão e Luiz entraram trazendo um relojoeiro numa chave de braço. Antes de o colocarem no ‘corró’ da DP eu perguntei, curioso:
– Esse é o intrujão que vocês foram prender? Ele foi meu vizinho… Eu era capaz de jurar que ele se chamava Valdemar!
Adão e Luiz olharam pra mim, olharam um para o outro, deram uma risadinha sarcástica e se afastaram sem nada responder. Não entendi a zombaria e não me dei por satisfeito. Peguei papel e caneta e fui até o ‘corró’ tirar minhas dúvidas.
– Valdemar, qual é o seu nome completo? – Perguntei, na esperança de que ele respondesse “Valdemar Intrujão da Silva Pereira”. E ele era mesmo, o Valdemar… Mas sem o “intrujão”!
Foi o gigantesco inspetor Radick que, apesar dos mais de 120 quilos, mais de trinta só de barriga, jogava peladas no time da delegacia toda tarde de quarta-feira, que me deu uma curta e exemplificativa aula sobre ‘intrujão’…!
– Esse Valdemar compra tudo que é objeto roubado na sua relojoaria, por menos da metade do preço! – disse ele, sem paciência diante da ignorância do jovem aspirante a detetive.
Ao longo da carreira, fui aprendendo o quanto a ‘profissão’ de intrujão é importante… para o meliante! Aliás, fundamental! Sem o intrujão não existiria ladrão! O ladrão não leva a prova do crime pra casa… Ele leva para o intrujão! E o intrujão é tão importante para o crime, mas tão importante, que ele é quem faz o preço da ‘res furtiva’. Não adianta o meliante roubar um celular que na loja custa R$ 3 mil e achar que o intrujão vai ‘segurar’ por R$ 90 reais. O intrujão vai oferecer apenas R$ 50… e é pegar ou largar! Apesar de tamanha importância – no crime e na economia! – O intrujão recebe a mesma pena do larapio. Prisão simples de 1 a quatro anos.
A propósito, no tempo do Brasil Império, “res furtiva” era apenas aquela novilha mestiça que, quando no cio, arrombava a cerca de gargatá da fazenda para se misturar ao ‘gado’ da fazenda vizinha. Depois que os jovens filhos de barões de qualquer coisa que passavam alguns anos estudando direito em Paris voltaram empertigados para o Brasil, “res furtiva” entrou para o juridiquês e passou a ser usada para designar “Objeto de furto” ou, “produto de furto”!
Mas deixemos a mistura de latim com linguajar popular e vamos aos fatos:
No último sábado a policia prendeu, quase de uma tacada só, larapio e intrujão a dois quarteirões um do outro!
A vitima da vez é um adolescente de 15 anos, morador do Jardim Morumbi. Ele estava quieto no seu canto na Praça João Pinheiro, no final da noite, esperando o ônibus para voltar para casa, quando o assaltante se aproximou por tras dele, deu-lhe uma gravata e ameaçou:
– Perdeu Mané! Passa tudo que você tem!
Sentindo o ar sumir da garganta, J.P.C. ‘passou’ o que levava na algibeira: seu Moto G5 Plus, e viu o lombrosianos com uniforme de mano sumir na penumbra fria da noite na direção da Tijuca.
O assaltante dobrou a serra do cajuru em direção ao noroeste da cidade. Mas foi preso ao leste, na porta da danceteria Lapa, na Vicente Simões. Reconhecido pela vitima, Abel Carlos Costa Junior, 23, admitiu o roubo, mas já havia se desfeito da res furtiva…
– Eu ‘tava precisando de grana. Vendi o radinho para um motoboy na Rua Titradentes – confessou ele.
Minutos depois da prisão do assaltante de adolescente, os homens da lei mostraram as pulseiras de prata também para o intrujão. Carlos Henrique Avelar Paiva e Silva, 41, que faz ponto na Rua Tiradentes, ainda estava na posse do radinho Moto G5 Plus.
– Eu estava aqui no meu trabalho quando ele chegou e me ofereceu o celular em troca de duas corridas de moto no valor de R$20 reais cada uma – confessou ele, sem nenhum pudor.
O larapio, que mediante violência, subtraiu a res furtiva do adolescente, e o motoboy que intrujou a res furtiva a preço de casca de alho, sentaram ao piano e assinaram o 157 e o 180. Tendo o dim-dim para pagar a fiança, poderão continuar livres, leves e soltos…!