Seis de setembro: o ultimo dia de trabalho do policial

“…por uma fração de segundo ficamos ali cara-a-cara, quase sentindo o bafo amanhecido um do outro! Mais perto ainda da sua cara estava o cano frio do trezoitão niquelado… E apertei o gatilho!!!”

Cheguei com o motor do Palio já desligado, parei na frente da casa simples da Rua do Queima, fechei a porta sem bater, dei uma rápida espiadela pela greta do portão, subi no muro e saltei pra dentro do quintal. Tudo tinha que ser muito rápido. Além do trinta e oito especial niquelado, cabo de madeira que eu levava com o dedo no gatilho eu contava com a mais poderosa das armas: a surpresa. Era necessário surpreender o bandido ainda nos braços de Morfeu! Sem dar tempo de reação! Mesmo que ele dormisse com o trabuco debaixo do travesseiro! Quando bati os pés com as pernas flexionadas para amortecer a queda no chão, Mestiço deu um salto e um grito de susto. Para evitar que o segundo salto fosse sobre mim, só havia uma coisa que podia fazer… Apertar o gatilho do trezoitão! Com a flexão das pernas e o corpo ao nível dele, por uma fração de segundo ficamos ali cara-a-cara, quase sentindo o bafo amanhecido um do outro! Mais perto ainda da sua cara estava o cano frio do trezoitão niquelado… E apertei o gatilho!!!

O ultimo de trabalho de todo cidadão é esperado com ansiedade. Se ele for policial, multiplique por dois, por cinco por dez a expectativa, de acordo com seu dinamismo. Eu estava no auge. Promovido – ainda que informalmente – a Inspetor, havíamos derrubado a estatística de crimes na cidade quase ao nível do chão. Quase todos os meliantes conhecidos estavam hospedados no Hotel Recanto das Margaridas. As pessoas que viam o Palio e a velha Parati da PC rodando a qualquer hora do dia e muitas vezes antes do sol mostrar os bigodes, ou um carro estranho com três elementos exibindo os canos grossos e frios das “12”, comentavam:
– Tem uma equipe de fora trancando todos os bandidos na cidade!
A “equipe de fora” era apenas eu, o veterano Benicio, o jovem Kleber e eventualmente, nas madrugadas, o vistoriador Roni e o recepcionista Little John, que usávamos para cercar os muquifos cada um numa esquina ou num ponto estratégico empunhando uma 12… Sem balas naturalmente. – Eu não seria doido de colocar dois cartuchos na espingardona e deixa-la na mão de policiais ‘ad-hoc’, ainda que soubessem manusear melhor do que eu! Mas não eram policiais de verdade! – Mas os meliantes não sabiam que o trabuco estava desarmado. Bastava colocar a cabeça sobre o muro e ver a cara de mau do Joãozinho segurando a 12 que eles baixavam o topete! Foi assim que em pouco mais de um ano a ‘equipe de fora’ – formada por dois detetives veteranos prestes a se aposentar, um detetive cheirando à Acadepol e dois ‘bate-paus’, forçou a bandidada de Santa do Sapucaí a tirar férias no Hotel Recanto das Margaridas em 2007. A pressão nos bandidos era tanta que alguns desistiram de roubar. Teve um que, sentindo-se acuado, devolveu espontaneamente a res furtiva.

– As roçadeiras que vocês estão procurando estão numa casa de colono abandonada na entrada da fazenda do Waguinho, pela estrada que vai para o Bom Retiro… Nós as devolvemos lá esta madrugada. Agora vê se me deixa em paz! – falou o meliante com voz de quem comeu jiló! e desligou o celular…

 

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